Coronavírus

MPF e MPCO cobram transparência em contratos de Pernambuco com Organizações Sociais de Saúde

De acordo com o Portal da Transparência, atualmente o Estado possui vínculo com duas OSS para combate à covid-19: o Imip e o Hospital Tricentenário

Renata Monteiro
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Renata Monteiro
Publicado em 23/04/2020 às 18:40 | Atualizado em 24/04/2020 às 10:25
BOBBY FABISAK/ACERVO JC IMAGEM
No início da pandemia de covid-19, em março de 2020, foi feita uma mobilização para a abertura do hospital, que entrou em operação em menos de 60 dias - FOTO: BOBBY FABISAK/ACERVO JC IMAGEM

Atualizada às 10h09 de 24 de abril

Os gastos de recursos públicos por Organizações Sociais de Saúde (OSS) no combate ao novo coronavírus estão sob a mira do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público de Contas de Pernambuco (MPCO). Os órgãos, que alegam não ter acesso a detalhes desses contratos, recomendaram ao governador Paulo Câmara (PSB), ao secretário estadual de Saúde, André Longo, e às próprias OSS que disponibilizem, no Portal da Transparência, as informações sobre o destino dado aos montantes milionários distribuídos para que essas entidades auxiliem o Executivo estadual no enfrentamento à pandemia.

No mês de março, quando sancionou a Lei Complementar 425/2020, que estabeleceu medidas para o combate à covid-19 em Pernambuco, o governador suspendeu a obrigação que as OSS possuem de, por exemplo, prestar contas mensalmente dos seus gastos e receitas. Segundo o texto da norma, a decisão foi tomada porque essas “formalidades” seriam incompatíveis com a situação de emergência na qual o Estado está inserido no momento.

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Os órgãos de controle, por sua vez, entendem que a lei “viola os princípios constitucionais de publicidade e da moralidade administrativa, bem como a Lei de Acesso à Informação”. Na visão da procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes, uma das autoras da recomendação, sem acesso ao detalhamento dos gastos das OSS, não é possível saber se os recursos públicos estão sendo bem aplicados pelas entidades.

A procuradora lembrou, ainda, que o governo federal chegou a tentar um movimento semelhante ao de Pernambuco, mas acabou frustrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu, no dia 26 de março, trecho de uma medida provisória que alterava regras da Lei de Acesso à Informação. “Quando se flexibiliza a transparência, se inviabiliza a fiscalização, e isso é muito sério. A lei complementar do Estado é anterior à decisão liminar do STF, que decidiu pela inconstitucionalidade dessas restrições. A partir desse posicionamento do Supremo, o MPF instou os órgãos do Estado - a Secretaria Estadual de Saúde e o próprio governador -, além dos órgãos do terceiro setor, a observarem o posicionamento do STF para manter intacta a transparência”, observou Silvia Regina.

A recomendação encaminhada a Paulo Câmara e André Longo é da última semana e a das OSS foi direcionada às entidades nesta quinta-feira (23). Em ambos os casos, existe um prazo de 10 dias úteis para que os citados se manifestem e digam se pretendem, ou não, seguir as recomendações. Caso optem por manter o posicionamento atual, tanto o Estado quanto as organizações podem responder administrativamente e judicialmente.

Secretaria de Saúde

Por meio de nota, a Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco (SES-PE) informou que, desde o mês de março, estão disponíveis todas as informações sobre o enfrentamento ao coronavírus no estado. E ressalta que na área "Fiscalização e Controle", há links de páginas "com dados sobre a evolução da Covid-19 (Pernambuco, Brasil e mundo), atualizações epidemiológicas e orientações sobre as contratações e compras emergenciais relacionadas à pandemia", diz trecho da nota.

Quanto aos documentos relacionados à editais, procedimentos de aquisições e contratações, a pasta afirma que estão disponíveis no Portal de Contratações e Compras Emergenciais Relacionadas ao Novo Coronavírus Covid-19. 

Na nota, a secretaria diz considerar as recomendações do MPF e do MPCO como oportunas. "Compartilhamos a mesma visão a respeito da transparência das ações governamentais, sobretudo no que diz respeito ao detalhamento pormenorizado e a disponibilização na íntegra dos processos administrativos realizados para as compras e contratações emergenciais", diz outro trecho da nota. 

Ainda de acordo com a nota, a Secretaria da Controladoria-Geral do Estado (SCGE) já identificou quais pontos dessas demandas o Governo de Pernambuco já corresponde e os que ainda precisam ser providenciados. "A partir desse levantamento, está sendo elaborado um plano de ação contendo direcionamentos para os órgãos e entidades aperfeiçoarem ainda mais a divulgação de informações", diz a pasta. 

A SES-PE lembrou que Pernambuco é considerado o estado mais transparente quando se trata da divulgação de informações à população sobre o coronavírus, de acordo com a Open Knowledge Internacional (OKBR), organização não governamental (ONG) que atua na área de transparência e dados públicos. Esta é a 4º semana consecutiva em que o estado lidera o ranking. 

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Transparência

De fato, não é possível encontrar, no Portal da Transparência do Estado, informações detalhadas sobre os recursos repassados pelo governo de Pernambuco às OSS para o combate ao coronavírus. Ao acessar o site, os únicos dados disponíveis são os contratos firmados com as entidades, mas não se sabe como essas organizações estão, de fato, usando o dinheiro público.

Um desses contratos é com o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), responsável pela gestão do antigo Hospital Alfa, que fica em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife. De acordo com o documento, o governo pagará à entidade, inicialmente, seis parcelas mensais de R$ 9.3 milhões, o que totaliza R$ 56 milhões. Além desse valor, está previsto no acordo o pagamento de outras duas parcelas de R$ 10.5 milhões, para que o órgão possa realizar os investimentos necessários no imóvel.

O segundo contrato do Estado é com o Hospital Tricentenário, que administra a Maternidades Brites de Albuquerque, em Olinda. Para essa unidade, o governo se comprometeu a repassar seis parcelas mensais de R$ 6.5 milhões, ou R$ 21.3 milhões por semestre, além de uma parcela extra de R$ 5.6 milhões para despesas de investimento. Os dados estão disponíveis no Portal da Transparência.

“Nossa preocupação em não termos acesso a esses dados se dá porque, para rastrear a aplicação dos recursos, é preciso que os órgãos que os manejam deixem claro o uso que estão fazendo deles. Nós sabemos que existe um contrato com o Imip, mas não sabemos como a entidade está gastando. Precisamos ter condições de trabalhar”, disparou Germana Laureano, procuradora-geral do MPCO.

Os números informados pela SES-PE divergem dos disponíveis no Portal da Transparência. De acordo com a pasta, já foram repassados R$ 38,4 milhões para as OSs para investimentos e custeio do Hospital Alfa e da Maternidade Brites de Albuquerque.

Através de nota, a diretoria do Imip limitou-se a informar que “acata as recomendações e vai cumpri-las após receber oficialmente o documento dos procuradores”. O Hospital do Tricentenário, por sua vez, disse que "já começou a disponibilizar as informações no portal da transparência do seu site institucional" e que esses dados também serão repassados para o governo do Estado.

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