Eleições 2020

''O PSB não será alvo de ataques no Recife'', diz Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT

De acordo com a dirigente partidária, a campanha da deputada federal Marília Arraes à prefeitura não será "de desconstrução" do partido do prefeito Geraldo Julio

Renata Monteiro
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Renata Monteiro
Publicado em 31/08/2020 às 11:56 | Atualizado em 09/09/2020 às 15:05
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Gleisi Hoffmann, deputada federal e presidente nacional do PT - FOTO: Foto: DIVULGAÇÃO

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Eleições 2020 - .

Ainda tentando dissipar as divergências que envolveram o PT de Pernambuco nos últimos meses devido à pré-candidatura da deputada federal Marília Arraes à Prefeitura do Recife - grande parte da legenda no Estado era contra a saída da Frente Popular na capital -, a presidente nacional do partido, Gleisi Hoffmann, defende a unidade da sigla em torno da campanha recifense e a entrega dos cargos que o grupo ainda possui na gestão Geraldo Julio (PSB). Diferentemente do que tem declarado o senador Humberto Costa (PT), a petista diz que a candidatura de Marília fará, sim, oposição ao PSB, sem, contudo, apelar para uma “política destrutiva”. Durante a entrevista, Gleisi também reafirmou seu desejo de ver o ex-presidente Lula candidato à presidência em 2022 e disse que a recuperação da popularidade do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em redutos historicamente lulistas não tem preocupado o partido até o momento.

JORNAL DO COMMERCIO - Depois que a pré-candidatura da deputada federal Marília Arraes foi confirmada, o presidente do PSB, Carlos Siqueira, que já afirmou que a eleição no Recife é uma das prioridades socialistas neste ano, fez críticas duras ao PT, levando a senhora até a respondê-lo com firmeza no Twitter. Depois desse episódio, como fica a relação entre os partidos, para além da capital pernambucana?

GLEISI HOFFMANN - Nós estávamos conversando com os partidos e as perspectivas de aliança com o PSB não eram muito grandes, no geral. Nas regiões Sul, Sudeste, é mais difícil uma aproximação nossa, nós somos mais distanciados. Por exemplo, nós queríamos conversar no Rio de Janeiro, mas o PSB já tinha se posicionado junto com o PDT e com a Rede em um outro bloco. Em São Paulo, o PSB também tem candidatura. No Rio Grande do Sul, Paraná, o posicionamento também não é com o nosso campo. Talvez a gente consiga ainda uma aliança em Florianópolis, capital de Santa Catarina, com o conjunto de partidos, isso nós estamos discutindo lá. A proximidade maior seria com o PSB do Nordeste e do Norte, mas não tinha nada fechado, nada encaminhado ainda. Hoje não sei se é possível ainda fazer uma aliança com o PSB em Salvador e tem também uma discussão da candidatura do ex-governador Ricardo Coutinho na Paraíba, em João Pessoa. Mas já temos candidatos do PT lá. É claro que o Recife é uma das prioridades do PSB e a gente entende e respeita isso, mas nós também tínhamos como prioridade, por necessidade do partido e definição política, ter candidaturas nas capitais. E Marília é uma dessas candidatas que têm boa pontuação, é uma liderança jovem, nova, com disposição, já não foi nossa candidata a governadora, então nós avaliamos que esse era o momento de Marília ser a nossa candidata a prefeita. E nós faremos isso respeitando o PSB, não vamos fazer uma campanha contra o PSB, queremos uma campanha propositiva, de afirmação de posição, de defesa do nosso legado, apontando para o futuro com os projetos que nós temos.

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JC - A senhora diz que a campanha no Recife não será contra o PSB, mas Marília diz o contrário, que sua candidatura é de oposição. Como será isso na prática? Como o partido se comportará?

GLEISI - Eu acho que a gente tem que separar a relação partidária da campanha em si, aí no Recife. Obviamente que é uma candidatura de oposição, porque se fosse de situação sairia na mesma chapa. O que eu quis dizer é que o PSB não será alvo de ataques, de desconstrução, não faremos uma política destrutiva. Vamos discutir os rumos da cidade, vamos colocar os projetos na mesa, fazer críticas àquilo que se acha que tem que se fazer. É uma candidatura que tem posicionamento, não tenha dúvida disso, tem que ter, senão não haveria razão para que ela fosse candidata. Ela é candidata porque tem divergências e vê que a cidade poderia ser conduzida de outra forma. Mas não será uma campanha de ofensiva política como a gente faz contra o campo da direita e contra o próprio (Jair) Bolsonaro. Essa campanha é de oposição, no sentido de não estar junto na mesma chapa, em questão de visões e projetos da cidade, mas não vai ser de ataques ao PSB. Até porque nós temos, nacionalmente, uma aliança com o PSB e com os partidos de oposição no enfrentamento ao governo Bolsonaro. Isso não quer dizer que a gente não possa fazer uma disputa eleitoral. Isso é legítimo para os dois partidos.

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JC - Em Pernambuco, nem o diretório municipal nem o estadual do PT desejavam a candidatura de Marília. Até hoje, inclusive, o partido possui cargos no governo do Estado e na prefeitura. Essa situação preocupa a Executiva? Qual a orientação nacional? Os cargos serão mantidos?

GLEISI - A gente está buscando a unidade partidária ainda. A partir do momento que Marília foi definida como candidata, ela é a candidata do PT. Então nós estamos fazendo um chamado a todos os nossos dirigentes, militantes, filiados para estarmos juntos na candidatura. Essa questão de ocupar cargos eu acho ruim. Como nós podemos ocupar cargos na prefeitura tendo uma candidatura que vai disputar a eleição contra o candidato do atual prefeito? Tendo críticas e propostas diferentes? Se o PT ficar eu acho muito ruim. Eu acho que o PT deveria sair da Prefeitura do Recife. Os filiados e dirigentes do partido deveriam deixar a prefeitura e se dedicar à campanha de Marília, uma campanha que tem grandes chances de ir para o segundo turno. No segundo turno nós vamos conversar. Se o PSB não for, pedir apoio, e se eles forem e nós não formos, também tentar ajustar, mas agora nós temos uma candidatura e eu acho que seria bom o pessoal do PT estar todo unido em torno dela.

JC - Mas essa será uma orientação partidária ou o diretório municipal é que decidirá?

GLEISI - Em relação à prefeitura, nós não conversamos ainda em termos de orientação partidária, mas a primeira ação foi de buscar a unidade. De fazer reuniões, conversar, de ajustar as posições do PT com a candidatura da Marília. Acho que as coisas estão indo bem, estão começando a tomar um contorno, tenho acompanhado um pouco mais de longe, mas sobre essa questão dos cargos da prefeitura, eu acho importante o partido ter uma orientação. Não discutimos isso ainda, mas essa é a minha opinião, de que deveria haver o afastamento do PT para que o partido possa fazer a sua campanha.

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JC - Em entrevista ao JC, o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, deu praticamente como certo que eles indicariam o vice na chapa de Marília. O caminho de fato é esse ou existem outras possibilidades?

GLEISI - Eu até gostaria de saudar o PSOL pelo apoio no Recife, o que é muito importante, e porque nós temos feito alianças com eles em outros lugares, como em Belém, no Pará, e temos conversado também sobre outras capitais. A definição da vice passa por uma discussão aí (no Recife), de Marília, da coordenação da campanha e do próprio partido. Esse assunto ainda não foi discutido nem trazido à direção nacional. Mas tem tempo ainda, que é o tempo das convenções, temos até 16 de setembro para definir isso e eu acredito que as pessoas daí, as lideranças, estão fazendo as conversações, tanto com o PSOL como com outros partidos. Mas eu acho que eles seriam, do ponto de vista de composição, muito bem-vindos para compor a vice, estar junto.

JC - Essa situação com o PSB pode atrapalhar a pré-candidatura de Odacy Amorim em Petrolina? Havia notícias de que os partidos estavam estudando uma aliança na cidade.

GLEISI - Eu espero que as questões do Recife não interfiram em mais nenhuma outra questão. Eu acho que cada cidade, cada região tem a sua dinâmica política e a gente precisa considerar isso. Com relação a Petrolina, eu não conversei com a direção estadual, então não posso te dar uma informação sobre como estão as coisas. Sei que a gente pediu uma pesquisa para ter uma noção de como está o quadro eleitoral.

JC - Desde o fim da campanha eleitoral de 2018 o Brasil discute possíveis cenários para 2022. No meio desse caminho, partidos de esquerda têm tentado se organizar e muito deles vêm criticando a postura do PT nesse processo. Na última semana o ex-presidente Lula levantou a possibilidade, ainda que remota, de que o PT não lance candidatura própria nas próximas eleições presidenciais. Qual a visão da senhora com relação a tudo isso?

GLEISI - É que 2022 está muito longe, né? Temos que passar antes por 2020. Não tem como falar de 2022 sem a gente passar por esse processo eleitoral e também por toda articulação que está sendo feita, que está ganhando cada dia mais força e corpo, entre os partidos da oposição a Bolsonaro. Nós, dos partidos de oposição, temos nos reunido constantemente, feito ações conjuntas, atuado conjuntamente na Câmara dos Deputados, no Congresso Nacional, em atos contra o Bolsonaro, todos esses partidos assinaram pedidos de impeachment. Então nós temos uma unidade política, o que é muito importante. Agora é óbvio que se você quiser uma unidade eleitoral, ela tem que ser construída. A eleição de 2020 vai ser importante, não só pela questão dos resultados dos partidos, mas também pelo acúmulo de força desse campo da oposição e a continuidade das ações nacionais de combate ao governo Bolsonaro. Não dá pra falar agora em termos de nome, de posição. Quando você está dentro de uma articulação como essa, não pode chegar impondo nada, tem que ouvir, discutir. Então todas as possibilidades existem, mas há que se considerar também o peso do PT. A votação que o PT tem, as preferências de liderança que o PT tem, isso é importante ser colocado.

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JC - Mas a senhora ainda espera que Lula seja candidato?

GLEISI - Eu gostaria muito. Acho que eu e a maioria do PT gostaríamos que Lula fosse o nosso candidato, mas isso é uma decisão que pertence a ele. O que nós estamos fazendo agora é lutar para que a anulação da sentença do juiz Sergio Moro aconteça no STF (Supremo Tribunal Federal). Isso acontecendo, e os direitos políticos de Lula sendo restabelecidos, ele vai ter a decisão. Mas se dependesse de mim e de grande parte do PT, ele seria o nosso candidato sim, seria o reencontro de Lula com o povo, com as urnas. Ele merece e o povo também.

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JC - Pesquisas divulgadas nas últimas semanas mostram que o presidente Jair Bolsonaro tem recuperado sua popularidade, sobretudo no Nordeste e entre eleitores com renda mais baixa. A senhora crê que o desempenho do presidente de alguma forma prejudica o PT e o lulismo, já que a melhora dos números ocorreu justamente em uma região e entre uma fatia da população nas quais o partido é mais forte?

GLEISI - Não acredito. Eu acho que esse crescimento do Bolsonaro é decorrente principalmente da renda emergencial, que teve um impacto muito grande na vida das pessoas e que foi uma proposta defendida pela oposição. Bolsonaro não queria dar isso. Aliás, Bolsonaro, historicamente, sempre criticou o Bolsa Família, dizia que era um programa de vagabundos, que era gente querendo sobreviver às custas do Estado, então não é da compleição dele fazer um programa de complemento de renda ou de renda básica. Mas o fato é que isso teve um impacto grande numa situação de crise. A pesquisa é um retrato do momento, ela revela muito isso. Agora, isso é sustentável? Não sei, porque a política econômica do governo, do Paulo Guedes, é uma política restritiva, eles estão anunciando restrições para o orçamento. Eles iam lançar o programa de renda que eles disseram que prepararam. Acabaram cancelando porque não tem acordo dentro da base do governo. Então eles têm muita dificuldade de manter um projeto, um programa como esse e obviamente isso também vai ter impacto. Uma outra coisa é o seguinte, o pessoal diz que Bolsonaro está bem com 35% de aprovação. É verdade que ele cresceu, estava pior no auge da pandemia, mas todos os presidentes de outros países cresceram no período pelo enfrentamento que fizeram, só Bolsonaro e Trump caíram. E 35% não é um patamar para um presidente que está há um ano e meio no mandato se vangloriar. Era para ele estar melhor posicionado, então isso não nos assusta.

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