Treze de abril de 2018. O auditório Ribeira, no Centro de Convenções, em Olinda, ficou lotado de políticos, autoridades, especialistas locais e nacionais. Evento prestigiado. Estavam lá o governador Paulo Câmara (PSB) e todos os prefeitos da Região Metropolitana do Recife (RMR). Dava-se, na ocasião, com pompa e circunstância, posse aos membros do Conselho de Desenvolvimento Metropolitano (CDM), formado pelo Estado e pelos prefeitos de cada cidade da região. Seria a instância política responsável pela governança metropolitana. Lugar de decisão. Isso, no papel. Porque, na prática, virou um conselho natimorto. Em mais de dois anos de existência, sequer teve o estatuto aprovado. O espaço interfederativo de poder já nasceu com um pecado original: o desigual peso entre seus entes decisórios. O Estado e a capital, juntos, tinham mais de 50% dos votos. Com pesos bem menores, todos os outros 14 municípios (contando com Goiana, que havia acabado de entrar na RMR, mas hoje está fora). Não tinha como dar certo.
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Perdeu-se tempo e oportunidades. Agora, com a elaboração do primeiro Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado da Região Metropolitana do Recife (PDUI-RMR), a questão central é desatar o mesmo nó de antes: o da decisão política. "É um plano completo. Importantíssimo pelo tamanho do estudo que foi feito e pelo volume de análises, diagnósticos e proposições bastante avançadas. Onde ele está fragilizado? Dentro da governança. Como instrumento de planejamento, não vai ter serventia se não for adotado pelo conselho gestor. Sem encarar essa questão de frente, o PDUI fica manco. Será mais um documento bem feito e ineficaz. A chave do sucesso é a responsabilidade política compartilhada", avalia o arquiteto e urbanista Paulo Roberto Barros e Silva.
Ele diz que a negociação passa por uma compreensão não só dos municípios, mas principalmente de o Estado de reconhecer que é mais um dos entes atuando com as 14 cidades. "O governador é o elo capaz de aglutinar em torno dessa mesa redonda a governança. Ele é peça-chave do processo. O papel político cabe ao líder maior, que é o governador. Agora, o papel decisório é dos 15 atores. Na hora do voto, tem que ser igual para todos", analisa Paulo Roberto.
O professor do Mestrado de Desenvolvimento Urbano da Universidade Federal de Pernambuco, o arquiteto e urbanista Tomás Lapa, lembra que a negociação política é fundamental, porque na Constituição só estão definidas as figuras federativas do município, do Estado e da União. "Os problemas são metropolitanos, mas não existe uma instância político-administrativa para dar conta dessa gestão. Por outro lado, há uma incoerência. Os municípios têm a atribuição de sanear os problemas em seu território, mas não recebem recursos suficientes para isso. Então, é na instância político-administrativa que se opera a governança. É preciso atuar por convencimento, por adesão. O conselho gestor é justamente esse espaço de intermediação", defende Tomás Lapa.
PARIDADE
O JC conversou com prefeitos da RMR que foram categóricos em afirmar que, se não houver uma reformulação do atual modelo do Conselho Metropolitano, de nada vai adiantar ressuscitá-lo. A principal crítica é justamente na forma de gestão e votação, com pesos desiguais para Estado e municípios. "É uma concepção injusta e antidemocrática. Leva a disputas desnecessárias e que contrariam o interesse público. A diferença de pesos é tão absurda que nem faz sentido sentar para conversar. É preciso esgotar todos os recursos, mas na base das ideias. Já se errou demais. Está na hora de acertar", disse um dos gestores, em reserva. Para ele, só há um caminho aceitável: o da paridade do voto para Estado e municípios.
A grita não só de políticos, urbanistas e representantes da sociedade civil parece que surtirá efeito. A agência Condepe/Fidem, responsável pela elaboração do PDUI, está debruçada em estudos para adequar o modelo atual a uma nova governança. A proposta ainda está em discussão, mas foca principalmente na alteração do formato dos pesos de votação atribuídos a cada membro do conselho. O CDM foi instituído através de Lei Complementar nº 382/2018, que criou o Sistema Gestor Metropolitano, em atendimento ao Estatuto da Metrópole, de 2015.
Lá atrás, em abril de 2018, no evento do Centro de Convenções, em sua fala na abertura do encontro, o governador Paulo Câmara destacou a importância do novo colegiado que então se formava, com a incumbência de aproximar os municípios e buscar soluções para diversas áreas estratégicas. "O desafio do CDM (Conselho de Desenvolvimento Metropolitano) é discutir o futuro e planejar, de maneira conjunta, soluções que possam atingir todos os municípios, com prazos, metas e caminhos que olhem as próximas décadas e não apenas os próximos anos", afirmou. O tempo passou, e nada aconteceu. O morador da Região Metropolitana do Recife ainda espera esse olhar para as próximas décadas virar realidade.
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