'Se Maia não deu andamento ao impeachment, é porque não deve ter nada que justifique', diz Arthur Lira, em entrevista ao JC
Candidato do Planalto à presidência da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) diz que bloco de Rodrigo Maia (DEM) e Baleia Rossi (MDB) também pertence à base do governo Jair Bolsonaro (sem partido) e fala da sua relação com o PSB em entrevista por escrito à repórter Mirella Araújo e ao colunista Igor Maciel
Candidato do Planalto à presidência da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) diz que bloco de Rodrigo Maia (DEM) e Baleia Rossi (MDB) também pertence à base do governo Jair Bolsonaro (sem partido) e fala da sua relação com o PSB em entrevista por escrito à repórter Mirella Araújo e ao colunista Igor Maciel.
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Confira a entrevista
JORNAL DO COMMERCIO - O que o senhor acha de ser apontado como o candidato de Bolsonaro? Isso é bom ou ruim para a candidatura?
ARTHUR LIRA - Quem vota numa eleição para o presidente da Câmara são os deputados. É uma atividade interna dos parlamentares. O presidente da República pode ter suas preferências. Essa foi uma aposta de narrativa do grupo concorrente, que também pertence à base do governo, assim como fui em anos anteriores. A diferença é que não escondo isso. Eu sou a favor do país funcionar e não ficar paralisado, independente de quem está no Executivo. Essa sempre foi minha trajetória. Fui escolhido pelo meu partido e por um conjunto de partidos e deputados que querem uma Câmara mais democrática e voltada para a pauta que atenda a população. O que precisamos é colocar os projetos para andar e reverter a paralisação do Congresso.
JC - Em que episódios, específicos, o senhor teria agido de forma diferente de Rodrigo Maia, por exemplo, durante a pandemia?
LIRA - A Câmara teve uma excelente gestão, mas o modelo ou se desgastou ao longo do tempo ou não está sendo eficaz. Nesse ano de pandemia, houve uma concentração de poder grande na presidência da Câmara. As lideranças não conseguiram atuar por falta de uma sinalização do presidente da Casa. Nós queremos trazer mudanças. Vamos respeitar a proporcionalidade e discutir, com produtividade, diversos temas que estão parados no Brasil. Queremos que os relatores tenham liberdade de discussão e afirmação com relação à pauta que será discutida. O Colégio de Líderes, que é onde se discute a pauta e representa os deputados, é que vai decidir, com antecedência de uma semana, as pautas que virão. O que não vem acontecendo. Queremos transparência e eficiência.
JC - O discurso de Maia é de que a Câmara, caso o senhor seja eleito, deixa de ser um ponto de resistência e passa a ser uma Casa auxiliar ao Executivo. Como o senhor pode garantir independência aos seus pares?
LIRA - O poder Legislativo não servirá de puxadinho para qualquer outro Poder. Todos tem falado em uma Câmara independente. O grupo de Maia aposta na paralização de temas e até seguimentos representados pelos diversos parlamentares, o que pode inviabilizar projetos importantes para o país. O meu projeto de independência da Câmara é pautado por uma gestão mais participativa de todos os deputados, trabalhando para o crescimento do país. Qualquer um que sente naquela cadeira tem a obrigação de trabalhar pela altivez e independência daquele Poder, harmônico com os outros. É interessante que você sempre construa pontes também, que não se isole para dizer que é independente, dificultando o andamento das coisas que interessam ao Brasil. Eu tenho diálogo com todos os partidos da Casa. Trago isso ao longo de uma trajetória de quase uma década na Câmara. E esse diálogo está aberto.
JC - O seu método de conversar diretamente com os deputados e menos com os partidos tem sido comparado com o de Eduardo Cunha, na época em que se elegeu para a presidência. Se a eleição é secreta, qual a importância dos partidos no processo?
LIRA - Sou líder do meu partido na Câmara e exerço essa atividade há cerca de dez anos. Em minha campanha, sou claro em dizer que as lideranças partidárias, em reunião todas as quintas-feiras, traçarão as diretrizes da pauta que vai a votação em plenário. Ainda, estou comprometido com a proporcionalidade dos partidos. Estou comprometido com os partidos e suas lideranças. Ao ouvir os deputados individualmente, estou ampliando o debate de temas importantes para o país. Precisamos dar voz aos deputados e deputadas, que são os representantes da população e de suas necessidades.
JC - A oposição fechou apoio com o candidato que será apoiado por Rodrigo Maia. Esse movimento atrapalha a sua candidatura?
LIRA - Não pode ser dito que há algo fechado. Os apoios ainda estão sendo avaliados e condicionados. Eu tenho uma relação muito longa com os partidos da esquerda. A minha atividade parlamentar sempre foi a favor de projetos importantes para o país, independente da bandeira. Os partidos de centro, como o meu, serviram ao Brasil como pontes entre projetos e pessoas. Comigo, a oposição sabe que vai contar com uma atuação transparente e clara de tentativas de acordo ao máximo. E quando o assunto estiver maduro para ir ao Plenário, ele irá. O normal é que tenhamos previsibilidade de ações e palavras, que os acordos feitos têm que ser entregues. É isso que dá credibilidade a um presidente que pretenda comandar a casa com harmonia e serenidade.
JC - O PSB integra o bloco de oposição. Mas, mesmo com a recomendação do diretório nacional do partido em não apoiar nenhum candidato ligado ao governo federal, socialistas como o prefeito eleito do Recife, João Campos, declararam apoio ao senhor. Acredita que terá a maioria dos votos do PSB?
LIRA - Tenho compromisso de trabalho e amizade com o prefeito eleito João Campos. Defendemos as necessidades da população e vou trabalhar muito para que sua gestão tenha êxito. Eu vejo com muita preocupação essa união que foi feita pelas cúpulas partidárias sem ouvir os seus deputados. O exemplo do PSB é muito claro, pois o líder nem sequer reuniu a bancada para a tomada de decisão. Os parlamentares de diversos partidos estão muito incomodados com essa salada de frutas que foi feita nesse bloco. Ele não reflete a realidade dos seus deputados, que conhecem o perfil de cada candidato e sabem o que é marcante em cada um. Na Câmara dos Deputados, sou conhecido pelo diálogo e por cumprir acordos. A minha palavra vale. Recebo com muita responsabilidade cada apoio que é declarado ao nosso projeto e espero retribuir essa confiança à frente da Câmara dos Deputados.
JC - Aguinaldo Ribeiro foi um dos nomes alinhados a Rodrigo Maia. Essa divisão dentro do PP poderá prejudicar o seu nome? Como pretende unificar o partido?
LIRA - Não há divisão. Meu partido está unificado e meu nome é consenso. A participação do deputado no grupo de disputa deixa claro que não há uma base de uma dita oposição. Todos são base e votaram com o governo. A diferença é que deixo isso claro. E tenho essa postura ao longo dos meus dez anos na Câmara dos Deputados. O país precisa avançar e precisamos de projetos estruturantes que seguem além do tempo de mandato. A minha visão sempre foi em benefício dos brasileiros.
JC - Como o senhor vê a atuação do STF nos últimos dois anos, inclusive relacionada às pautas da Câmara. O senhor vê como intromissão indevida em algum momento?
LIRA - Numa democracia, os poderes devem ser fortes e independentes. Acredito que há um amadurecimento neste sentido no Brasil. Mesmo diante das dificuldades, das crises e dos temas mais duros que tratamos recentemente, mostramos que queremos essas instituições fortalecidas e respeitadas por todos.
JC - Em 2021, ainda com a pandemia no centro do debate, o que o senhor acha que deverá ser prioridade na agenda da Câmara? O presidente Rodrigo Maia esteve em Pernambuco, no mês de setembro, para tratar da reforma tributária. Será uma das pautas a ganhar celeridade a partir do ano que vem?
LIRA - O Brasil precisa, nesses próximos dois anos, ter rumo para fortalecer o seu crescimento, em especial no período pós-pandemia. A economia precisa deslanchar e, para isso, é preciso ter um cenário seguro para o investimento, sustentável para as políticas públicas e propício para gerar emprego e renda. Assim, as pautas de reformas estruturais do país devem ser colocadas em discussão e progressivamente apresentadas para votação em plenário. Precisamos, por exemplo, discutir a PEC Emergencial e a Reforma Administrativa. O que prejudica o país é não pautar os assuntos importantes para o nosso desenvolvimento social e econômico. A reforma tributária precisa entrar em debate. É um tema pendente há anos. Na centralidade da presidência da Câmara dos últimos meses, perdemos a oportunidade de avançar no assunto em 2020.
JC - A Câmara tem hoje vários pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro que estão há meses sem serem analisados. Qual a sua posição sobre esses pedidos? O senhor pretende desengavetá-los, seja para abrir ou para rejeitar as alegações?
LIRA - Se o presidente Rodrigo Maia, que diz fazer oposição ao governo, não deu andamento a nenhum deles até hoje é porque não deve haver nenhum fato que justifique. O Brasil precisa amadurecer na sua democracia. Se não tiver um assunto pontual, que justifique um processo máximo que é tirar um presidente da República, não se pode estar ao sabor do interesse político momentâneo e instabilizar o país com essa pauta. Mas acredito que qualquer assunto que chegue à presidência da Câmara, como um pedido de impeachment, deve ser tratado com independência e isenção.