NOPO
'Armar população fere papel constitucional das Forças Armadas', diz Jungmann
Ex-ministro da Defesa e Segurança do governo Michel Temer, Raul Jungmann diz que há preocupação nas Forças Armadas em relação à ofensiva do Palácio do Planalto com a flexibilização do porte de armas
Cadastrado por
Estadão Conteúdo
Publicado em 24/02/2021 às 15:20
| Atualizado em 24/02/2021 às 15:25
Notícia
X
Notícia
É o fato ou acontecimento de interesse jornalístico. Pode ser uma informação nova ou recente. Também
diz respeito a uma novidade de uma situação já conhecida.
Artigo
Texto predominantemente opinativo. Expressa a visão do autor, mas não necessariamente a opinião do
jornal. Pode ser escrito por jornalistas ou especialistas de áreas diversas.
Investigativa
Reportagem que traz à tona fatos ou episódios desconhecidos, com forte teor de denúncia. Exige
técnicas e recursos específicos.
Content Commerce
Conteúdo editorial que oferece ao leitor ambiente de compras.
Análise
É a interpretação da notícia, levando em consideração informações que vão além dos fatos narrados.
Faz uso de dados, traz desdobramentos e projeções de cenário, assim como contextos passados.
Editorial
Texto analítico que traduz a posição oficial do veículo em relação aos fatos abordados.
Patrocinada
É a matéria institucional, que aborda assunto de interesse da empresa que patrocina a reportagem.
Checagem de fatos
Conteúdo que faz a verificação da veracidade e da autencidade de uma informação ou fato divulgado.
Contexto
É a matéria que traz subsídios, dados históricos e informações relevantes para ajudar a entender um
fato ou notícia.
Especial
Reportagem de fôlego, que aborda, de forma aprofundada, vários aspectos e desdobramentos de um
determinado assunto. Traz dados, estatísticas, contexto histórico, além de histórias de personagens
que são afetados ou têm relação direta com o tema abordado.
Entrevista
Abordagem sobre determinado assunto, em que o tema é apresentado em formato de perguntas e
respostas. Outra forma de publicar a entrevista é por meio de tópicos, com a resposta do
entrevistado reproduzida entre aspas.
Crítica
Texto com análise detalhada e de caráter opinativo a respeito de produtos, serviços e produções
artísticas, nas mais diversas áreas, como literatura, música, cinema e artes visuais.
Após pedir, em carta aberta aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), uma reação da Corte à flexibilização da política de armas no Brasil, o ex-ministro da Defesa e Segurança do governo Michel Temer, Raul Jungmann, disse ao
Estadão que há preocupação nas Forças Armadas em relação à
ofensiva do Palácio do Planalto. "O armamento da população significa também ferir o papel constitucional das Forças Armadas, o que é da maior gravidade. Cria-se outro polo de violência", afirmou. Afastado da política, o ex-ministro atua no setor privado na área de tecnologia da informação.
Por que a flexibilização do porte de armas pode significar uma lesão ao sistema democrático?
Até aqui o debate sobre armamento, desarmamento e controles se dava no âmbito da segurança pública. O presidente transpôs esse campo e levou para a política no momento em que defende o armamento dos brasileiros para defesa da liberdade. Não vejo ameaça real ou imaginária. Ao mesmo tempo, ele consubstancia esse seu desejo com mais de 30 regulamentações, seja através de lei, decreto ou portaria. Estamos diante de um fato muito preocupante para todos nós.
Por quê?
A certidão de nascimento do Estado nacional é exatamente o monopólio da violência legal. A primeira que preocupa muito é a quebra desse monopólio. Quem dá suporte a esse monopólio, que é fundamental para a sobrevivência do estado democrático, são as Forças Armadas. O armamento da população significa também ferir o papel constitucional das Forças Armadas, o que é da maior gravidade. Cria-se outro polo de violência. Por último, na medida em que não se vê ameaça externa sobre a Nação, isso só pode apontar para um conflito de brasileiros contra brasileiros. Um cenário horripilante de um flagelo maior, até uma guerra civil. Essa é uma preocupação que precisa de uma resposta da parte dos demais poderes, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional. Caso contrário, pode se repetir aqui o que aconteceu nos Estados Unidos, no Capitólio, lembrando que temos eleições em 2022. Se cada brasileiro é responsável pela própria segurança, então não precisamos de segurança pública e força policial.
Como o sr. avalia a proposta do excludente de ilicitude?
Só agrava o que está ocorrendo. Reduz os controles sobre a força policial, lembrando que o Código Penal já tem os instrumentos necessários para lidar com essa questão. Toda nação democrática tem regulamentos rígidos para a concessão do direito à posse e ao porte de arma. Não estou me posicionando contrário ao cidadão que cumpriu as regras e, de acordo com a lei, tem a posse ou porte de armas. Não se trata de negar o direito a esse cidadão, mas, quando se fala em armar a população, estão dizendo outra coisa. Estão falando em uma situação que pode descambar para um clima de violência generalizada. É isso que temos que exorcizar.
Não é contraditório que um presidente tão ligado às Forças Armadas e com tantos militares no governo tenha adotado uma bandeira que ameaça a instituição?
Não represento as Forças Armadas, mas sei que existe uma preocupação com isso. Recentemente, o Departamento de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército baixou duas normas que visavam ao rastreamento de armas e munições. Isso é fundamental para o esclarecimento e redução da violência. Por determinação do Executivo, essas duas normas foram revogadas. O general que cuidava desse departamento pediu exoneração. Fica claro que a disposição das Forças Armadas é pela rigidez no controle. O Executivo está jogando no sentido contrário. Mas, de fato, há apreensão.
Como foi a repercussão da carta do sr. ao Supremo?
A resposta de todos os ministros do Supremo com os quais eu tenho acesso e me comunico foi no sentido de que há uma preocupação.
Como avalia o argumento de que arma é garantia de liberdade da população?
A garantia da liberdade está na democracia, no respeito à Constituição e aos poderes. Não há ameaça pesando sobre a liberdade dos brasileiros e brasileiras, real ou imaginária. Isso atende muito mais a uma preocupação política e ideológica de atender aqueles que são sua base eleitoral. Esse armamento pode nos levar a uma tragédia. Quanto mais se liberam armas, mais corremos risco que ocorra aqui o que ocorreu no Capitólio.
Argumenta-se que a compra de armas é para caçadores e colecionadores, mas eles usam fuzis para essa prática?
Fuzil é uma arma de uso restrito. Não é uma arma para colecionador ou para clubes esportivos de tiro. Fuzil é uma arma exclusivamente voltada para o combate ao crime pesado e ao uso na guerra. Não faz nenhum sentido essa liberalização, pelo contrário.
Há pressão da indústria das armas?
Ela sempre existiu. Sempre lidamos com ela.
Como vê o argumento de que os brasileiros têm o direito de se proteger e, se muitos possuírem armas, o criminoso pensaria duas vezes antes de agir?
A legislação já permite isso. Comprovada a necessidade e a capacidade técnica e psicológica, o brasileiro que cumprir os mandamentos legais tem direito a isso. É uma falácia. A primeira vítima é a própria pessoa. Onde você vai guardar uma arma em casa? Na gaveta? Embaixo da cama? Todo bandido tem a vantagem da surpresa. E, se for para cada brasileiro dar conta da própria segurança, para que segurança pública? Quando uma população é armada vemos o que acontece na Síria, Iraque e Venezuela. Há uma tragédia nacional.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.