POLÍTICA

STJ retoma julgamento de recursos de Flávio Bolsonaro no caso das 'rachadinhas'

Os recursos contestam o compartilhamento de informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) com o MP do Rio e a competência do juiz Flávio Itabaiana para cuidar do caso na primeira instância

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Estadão Conteúdo

Publicado em 16/03/2021 às 14:17
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A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) retoma nesta terça-feira, 16, a partir das 14h, o julgamento de dois recursos da defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que podem esvaziar e comprometer de maneira crucial as investigações sobre o desvio de salários de funcionários do gabinete do filho mais velho do presidente na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). As chamadas "rachadinhas" ocorreram, de acordo com o Ministério Público do Rio, quando Flávio era deputado estadual.
 
Os recursos contestam o compartilhamento de informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) com o MP do Rio e a competência do juiz Flávio Itabaiana para cuidar do caso na primeira instância. O ministro João Otávio de Noronha já anunciou que vai acolher os dois pedidos da defesa do senador.
Em relação ao Coaf, os advogados de Flávio Bolsonaro alegam que houve quebra dos sigilos bancário e fiscal sem autorização judicial. No caso de Itabaiana, a defesa do senador argumenta que, após a Justiça do Rio reconhecer o foro de Flávio perante o Órgão Especial, as decisões do magistrado no caso devem ser anuladas.
 
Um primeiro recurso da defesa já foi analisado pela Quinta Turma no fim do mês passado. Por quatro votos a um, o STJ anulou a quebra do sigilo bancário e fiscal de Flávio, ocasionando o maior revés sofrido pelo MP-RJ desde a abertura do inquérito em 2018. A decisão determinou que os promotores retirem da apuração todas as informações obtidas pela quebra do sigilo do senador e de outros 94 alvos, incluindo o ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz.
 
A decisão também comprometeu a denúncia apresentada contra Flávio Bolsonaro no ano passado por peculato, organização criminosa e lavagem de dinheiro. A PGR recorreu nesta segunda-feira ao STJ da decisão que anulou as quebras de sigilo. O pedido, assinado pelo subprocurador-geral da República Roberto Luis Oppermann Thome, é para que o caso seja enviado para julgamento no Supremo Tribunal Federal.

Efeito cascata

 
Na pauta desta terça, o recurso que trata do Coaf causa apreensão entre promotores e procuradores não somente pelo impacto no caso Flávio Bolsonaro, mas por abrir uma brecha capaz de gerar um efeito cascata sobre outros processos e investigações, com pedidos de nulidade Brasil afora.
 
Se a tese da defesa de Flávio Bolsonaro, de que o MP não pode abrir apuração com base em relatórios de informação do Coaf (documentos de inteligência financeira essenciais nas apurações contra crimes financeiros no mundo) prevalecer, uma série de outras apurações contra acusados de corrupção, lavagem de dinheiro - seja desvio de dinheiro público, seja recurso oriundo do tráfico de armas ou drogas - podem ser comprometidas.
 
A sub-procuradora-geral da República Luiza Frischeisen avalia que uma decisão do STJ no caso do Coaf pode impedir o início de uma série de investigações no Brasil, extrapolando o caso do senador. Para ela, que é coordenadora da Câmara Criminal da PGR no STJ e outros colegas do MPF, as tentativas de anular os processos contra Flávio Bolsonaro e, em especial, os processos da Lava Jato, podem resultar em alterações legais e estruturais que representam retrocesso no combate à corrupção e aos crimes financeiros, em geral.
 
"Pode haver um retrocesso com a modificação da legislação e da forma como o STF ou o STJ trabalham a jurisprudência que está se construindo nesses processos em que se discute uma eventual nulidade. E que isso influencie outros processos e impeça a investigação do ilícito", afirmou Luiza Frischeisen, referindo-se à decisão do ministro Edson Fachin, que anulou as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no âmbito da Lava Jato e os recursos do caso das "rachadinhas".
 
Desde 2019, procuradores, delegados e investigadores apontam uma série de medidas que buscam "frear" as ações anticrimes financeiros no País, inicialmente focadas na Lava Jato, mas que transcendem o âmbito do caso. "É preciso ter cuidado com o tipo de resultado, e mais do que o resultado, o efeito do resultado, do ponto de vista de vincular outras investigações que sequer começaram. Dependendo do tipo de resultado, pode impedir o início de investigações, como é a questão que envolve os temas relacionados ao Coaf", disse Luiza Frischeisen.
 
A votação que pode beneficiar o filho mais velho do presidente acontece em meio a uma série de derrotas que o MP e os órgãos de fiscalização e controle vêm sofrendo. Conforme revelou o Estadão, propostas de alteração em leis consideradas vitoriosas para investigadores de crimes do colarinho branco, como da Lei de Lavagem de Dinheiro, Lei de Improbidade Administrativa e a Lei de Organizações Criminosas, estão em discussão no Congresso e podem fragilizar as regras e instrumentos de controle.
 
"O processo penal tem regras para corrigir aquilo que a defesa considera, seja a suspeição de um juiz, alguma prova que não tenha sido colhida na forma incorreta, algum ato de ofício do juiz que tenha sido do sistema acusatório, e os tribunais vão analisar em vários graus. Então, o processo penal tem todos os mecanismos necessários para analisar os pedidos da defesa e do Ministério Público. O meu receio é que isso leve a uma modificação das leis, como a Lei de Lavagem de Dinheiro, a Lei de Combate à Corrupção, que é onde está a leniência, e a Lei de Improbidade Administrativa", afirmou a sub-procuradora geral.

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