Protesto

Esvaziados, atos contra Bolsonaro evidenciam dificuldade de união daqueles que querem impeachment, avaliam especialistas

De acordo com a organização, no Recife, o público girou em torno de 200 e 300 pessoas

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Cássio Oliveira

Publicado em 12/09/2021 às 18:31 | Atualizado em 13/09/2021 às 9:29
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As manifestações deste domingo (12) demonstraram dificuldade em unir diversas forças de oposição ao presidente da República, Jair Messias Bolsonaro (sem partido). Na visão de especialistas ouvidos pelo JC, são diversos os motivos para a baixa adesão dos protestos, com a falta de uma liderança carismática de terceira via e ausência do poder de mobilização do Partido dos Tralhadores (PT) entre as razões. Os atos foram convocados pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e ocorrem em diferentes capitais do país, com adesões na oposição para além da direita. De acordo com a organização, no Recife, o público girou em torno de 200 e 300 pessoas.

Galeria: as imagens dos protestos pelo país

A cientista política e professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho) Priscila Lapa destacou que os atos deixaram claro que as oposições a Bolsonaro são distintas e não devem se unir. "Essas manifestações demonstraram a dificuldade de haver um protesto político consistente que una diversas forças de oposição a Bolsonaro. Temos dois tipos de oposição no tabuleiro: uma que tenta se consolidar como terceira via regada com forças de centro-direita e centro-esquerda e a oposição mais claramente à esquerda, que é o PT. Eles são como água e óleo, não se juntam, a manifestação foi um teste da possibilidade de construir a pauta consensual, de se unir a oposição, o mote dos protestos, por mais que tenham sido convocados pelo MBL, se colocou com agenda de defesa da democracia, tentando criar movimento apartidário como os de 2013, sem protagonismo de líderes partidários, mas parece não ter sido suficiente, não parece haver clima favorável a isso", destacou.

FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM
Manifestação no Recife contra o presidente Jair Bolsonaro convocado pelo MBL. - FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM

Coordenador estadual do movimento Livres, Francisco Layon destacou o movimento como apartidário. "Entendemos que passou da hora do impeachment de Bolsonaro, estávamos organizando a manifestação e demos abertura para quem quisesse participar. Após a escalada golpista de Bolsonaro no 7 de setembro, as forças de esquerda se uniram e entendemos que acima de bandeiras partidárias precisamos aglutinar forças ao que nos une, que é a democracia", comentou. "É preciso dar um basta independentemente da bandeira que você vai levantar em 2022, hoje é dia de unir liberais, forças de esquerda, e pedir o impeachment", completou.

A manifestação na capital pernambucana ocorreu no Marco Zero. Além da presença de movimentos mais à direita, como o próprio MBL, estavam presentes membros da esquerda como o PDT, alguns poucos com camisas do PSB e eleitores do ex-presidente Lula (PT) que compareceram à manifestação mesmo sem apoio do PT. O Partido dos Trabalhadores resistiu aos atos pela má relação com os grupos organizadores, visto que o MBL e o Vem pra Rua apoiaram o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Além disso, o mote inicial da manifestação deste domingo (12) seria "nem Bolsonaro nem Lula", o que incomodou as lideranças petistas.

ALEX OLIVEIRA/JC IMAGEM
Manifestação no Recife contra o presidente Jair Bolsonaro convocado pelo MBL. - ALEX OLIVEIRA/JC IMAGEM

"A proposta inicial era 'nem Lula, nem Bolsonaro', mas vimos ameaças do presidente em 7 de setembro e relembramos a Diretas Já. Nos juntamos e fizemos convite à esquerda, temos divergências, mas estamos dentro das quatro linhas da Constituição. Pedimos o impeachment, votamos nele, mas mantemos a coragem de pedir o impeachment como tivemos coragem de pedir o de Dilma Rousseff (PT), destacou Izaque Costa, coordenador do MBL em Pernambuco.

Isso não impediu a presença do apoiador do ex-presidente Lula (PT), o professor Jarbas Luciano de Souza, 64, que foi ao protesto por acreditar na necessidade da união para tirar Bolsonaro do poder. "Vim aqui hoje para tirar Bolsonaro, é o objetivo principal. É um homem que não tem capacidade nem de ser vereador, quanto mais presidente da república. O colocaram lá e deram um tiro no pé. Eu sou Lula, mas caso ele não se eleja, tem que ser qualquer outro menos Bolsonaro", defendeu.

Na visão de Priscila Lapa, sem o PT, faltou mobilização dos organizadores do ato. "O PT continua sendo um partido muito representativo, come capacidade de mobilização, que continua tendo organicidade. Ele convoca e as pessoas vão. O PT tem ainda a capacidade de mobilizar diferente de outras forças e esse esvaziamento dos atos ficou visível com a divisão de PT e MBL, visto que remontaram ao impeachment e entenderam não haver capacidade de união", comentou.

ALEX OLIVEIRA/JC IMAGEM
Manifestação no Recife contra o presidente Jair Bolsonaro convocado pelo MBL. - ALEX OLIVEIRA/JC IMAGEM

O pré-candidato à Presidência pelo PDT, Ciro Gomes, fez um aceno ao PT neste domingo e disse ainda haver tempo para "o PT amadurecer” e se aliar com desafetos e conseguir tirar Jair Bolsonaro do Palácio do Planalto. A declaração foi em São Paulo, durante ato na avenida Paulista. "Para fazer o impeachment e proteger a democracia brasileira temos que juntar todo mundo. Ainda há tempo para o PT amadurecer. Quem for democrata tem que entender que o impeachment é a a única saída. Precisamos fazer um acordo com a direita e um centro democrático", disse.

Vice-presidente do PDT no Recife, Rafael Bezerra destacou que partidos de esquerda como PT e PSOL não se uniram ao movimento por haver uma "tentativa de hegemonização". "De manter a falsa polarização entre PT e Bolsonaro. Quando na verdade a sociedade brasileira já está cansada e espera sim a apresentação de projetos. E a gente observa que dos candidatos agora até então postos, Ciro Gomes, o PDT, e um campo maior, mais amplo, tem buscado apresentar essa alternativa que é uma alternativa viável, que não é uma terceira via. É até então o único conglomerado de forças políticas no Brasil que apresenta uma proposta concreta de projeto nacional", comentou.

Elton Gomes, cientista político e professor da Faculdade Damas, analisa haver dificuldade daqueles que pretendem emplacar uma terceira via contra Bolsonaro e Lula. Principalmente, uma semana depois que os atos em favor do governo federal demonstraram que Bolsonaro é, sim, um líder carismático que goza de forte apoio entre seus apoiadores. Para o professor, o fato de o MBL ter mudado a pauta da manifestação muito próximo ao dia do ato não foi o suficiente para atrair a militância mais à esquerda, que quis distância dos protestos. "O PT cerca seu eleitorado, diz que a reivindicação é sua e que a cobrança deve ser em sua manifestação. Além disso não é interessante ao PT  impeachment, mas que ele siga no poder e fique enfraquecido pelos efeitos da pandemia", comentou o especialista. 

O professor destaca ainda haver uma grande quantidade de "caciques" buscando ser a terceira via e que um dos mais carismáticos seria Ciro, mas que o ex-governador enfrenta dificuldades tanto com a direita por criticar Bolsonaro, quanto com a esquerda por não ter apoiado Fernando Haddad em 2018, contra Bolsonaro.

Membros do Partido Novo e da Rede Solidariedade também marcaram presença na manifestação. "Na verdade existem diferenças no campo democrático, nas forças dos partidos políticos, nos movimentos, mas a pauta desse momento é não buscar as nossas diferenças. A pauta nesse momento é não buscar o que nos une. E o que nos une nesse momento é a defesa da democracia, a defesa da vida, a defesa do estado democrático de direito, a defesa da República. E para isso é fundamental que haja não só a participação através da internet, mas principalmente nesse momento também, a participação dessa maioria da população em manifestações de rua dizendo que não quer o retrocesso", afirmou Roberto Leandro, ex-deputado e porta-voz da sigla em Pernambuco.

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