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Fusão do DEM e PSL pode criar "superpartido" com muito poder e dinheiro para as eleições 2022

Se a fusão ocorrer, partido terá mais de 80 deputados. O número de 17, com o qual Bolsonaro se elegeu, pode ser deixado de lado

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Cássio Oliveira

Publicado em 14/09/2021 às 17:50 | Atualizado em 15/09/2021 às 6:34
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Presidente nacional do Democratas (DEM), ACM Neto afirmou nesta terça-feira (14) que a fusão entre seu partido e o PSL, de Luciano Bivar, está em um momento decisivo. A conversa por uma fusão entre as legendas já conta com sinal verde das cúpulas de ambos os partidos, mas  esbarra em divergências locais. Ainda assim, na visão de especialistas ouvidos pela reportagem, a junção só traz benefícios para ambos os lados.

Durante transmissão ao vivo em evento do BTG Pactual, ACM Neto declarou o seguinte: "a fusão de dois partidos desse tamanho implica em uma série de questões, eu diria a vocês que os próximos 15 dias serão decisivos. E nesse período a gente vai ter uma ideia se essa fusão vai adiante ou não”. O presidente do DEM explicou que a prioridade é lançar um candidato próprio para as eleições de 2022. “O que a gente discute hoje é a possibilidade de criação de um novo partido, que nasceria como o maior partido do Brasil, com uma grande participação na Câmara, no Senado, com uma perspectiva de fazer uma quantidade importante de governadores e com o objetivo de lançar candidato próprio à Presidência da República.”

O cientista político Adriano Oliveira, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ressaltou que o empecilho para a fusão é decidir quem vai comandar o novo partido. Mas destacou que o facilitador da fusão é o impacto financeiro. "Tem a vantagem de se unir. Os partidos adquirem robustez financeira e facilita qualquer condução de campanha eleitoral". 

Ele ainda citou problemas enfrentados pelo DEM nos últimos tempos que reforçam a necessidade do partido de se reforçar visando o próximo pleito.  "O Democratas, apósa eleição de 2020, todos cantaram a pedra de que havia saído fortalecido, principalmente, por conta da eleição de Eduardo Paes, no Rio de Janeiro. Mas, após a eleição Paes saiu do partido, o Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara, rompeu com ACM Neto, ACM teve problema com João Roma, o presidente do senado, Rodrigo Pacheco, deve sair do DEM e migrar ao PSD, então não é uma situação confortável", disse Adriano em entrevista à Rádio Jornal.

PSL

Aliados do deputado Luciano Bivar (PSL-PE) o querem à frente da nova legenda após a fusão, tendo seu braço-direito no PSL, Antônio Rueda, numa vice-presidência. Enquanto isso, ACM Neto, que deve concorrer ao governo baiano, abriria mão do comando para ser o secretário-geral.

Em entrevista ao JC, Roberto Gondo, professor de comunicação política da Universidade Mackenzie, explica a importância da fusão para o PSL – partido pelo qual Jair Bolsonaro se elegeu presidente em 2018 e, em seguida, rompeu laços e seguiu sem partido, até os dias de hoje. 

"O PSL tem algo hoje e sabe que pode não ter de novo, que é dinheiro. O PSL é a segunda maior bancada em questão de fundos e isso gera um interesse muito grande. Sobre a percepção do recurso, em especial para 2022, existe um interesse de união dos nomes mais fortes do Democratas, em uma costura nacional, pois as as regionais terão sua maneira de ser resolvidas. Mas, com dinheiro alto envolvido e tempo de exposição de TV já é quase 60% de que pode ocorrer a fusão e se não for com o Democratas será com outro partido de tradição", comentou o especialista.

Após se tornar a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados, com a eleição de 2018, o PSL viu sua parte nos recursos do fundo eleitoral subir, mas teme não manter-se entre os grandes após a eleição de 2022, por não ter mais apoio da onda bolsonarista. "O PSL sabe que, se for para a eleição com nomes fracos politicamente, vai perder bancada, volta a ser um partido nanico. Então, esse é o caminho, o Bivar não é ingênuo, ele sabe que dessa forma (sem fusão) o PSL não e sustenta", comentou Gondo.

O cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Arthur Leandro diz ser uma relação de 'ganha-ganha' e explica os pontos favoráveis da fusão às duas legendas. "Os dois saem ganhando na fusão, o DEM é bem estruturado, é um partido de máquina tradicional, com quadros conceituados, é um partido lembrado, que goza do aparato institucional montado ao longo do tempo. O PSL era nanico até a eleição de 2018 e foi catapultado pela eleição de Bolsonaro, mas não tem estrutura, o partido receava voltar ao estado de irrelevância com as eleições do ano que vem. Os deputados em fim de mandato poderiam sair do partido seguindo o movimento de Bolsonaro. Então, o PSL se gabarita pela aproximação com o DEM e o DEM consegue os recursos para sobreviver. É uma manobra que favorece os dois lados da aliança, além de que do ponto de vista ideológico não há muita diferença entre os dois", ressaltou.

Terceira via

Hoje, o PSL conta com 53 deputados, a maior bancada da Câmara ao lado do PT, também com 53. O DEM possui 28 deputados federais, totalizando uma super bancada de 81 parlamentares. No Senado, são 6 senadores do PSL e 1 do DEM, a bancada única seria de 7 parlamentares.

Segundo ACM Neto, a nova sigla pode ter a condição de lançar um candidato para superar a polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Lula (PT), que aparecem à frente nas pesquisas recentes de intenção de voto para 2022. Ele citou os nomes do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e o atual presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Mas, na visão de Roberto Gondo, os protestos do último dia 12, contrários ao Governo Bolsonaro, mostraram uma divisão no espectro de centro, o que dificulta a chance de uma candidatura única de terceira via.

O professor Arthur Leandro ressalta que o partido será realmente expressivo, cruzando o linear de 10% dos assentos na Câmara, mesmo com a possível saída de parlamentares que discordem da união. Todavia, uma chapa com recurso e tempo de TV não garante força eleitoral para a disputa pelo Palácio do Planalto, avalia o especialista, que cita como exemplo o resultado pífio de Geraldo Alckmin em 2018. O ex-governador disputou a Presidência da República com a maior composição de partidos, nove no total, e ficou em quarto lugar, atrás de Bolsonaro, Fernando Haddad e Ciro Gomes.

"A grande chapa montada em 2018 que lançou Alckmin não teve seus esforços de articulação partidária convertidos em votos. O fato de amealhar muitos recursos não significa ativo eleitoral irresistível", comentou Arthur Leandro. "Resta saber se a imagem será bem trabalhada para viabilizar com estatura política, se o PSDB se unir ao grupo, se houver uma aliança, pode haver viabilidade, mas a liderança de João Doria inviabiliza, pois ele só aceita participar se for sentando na janela", completou.

Pernambuco

As divergências nos estados são um problema para a fusão. Aliado próximo a ACM Neto, o deputado federal Efraim Filho (DEM-PB) avaliou em entrevista ao O Globo que será “natural” que um nome do PSL assuma a presidência nacional da sigla, mas ressaltou que ainda é preciso “construir consensos nos estados” para viabilizar a fusão. "As conversas têm acontecido em ritmos diferentes em cada estado. Há um canal aberto entre os presidentes Bivar e Neto, mas não tem data marcada para a fusão. A reunião entre as executivas partidárias no próximo dia 21 é para dar o 'start' no processo", afirmou Efraim.

Em Minas, por exemplo, o DEM ensaia formar um palanque nacional de terceira via com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, enquanto o PSL segue próximo ao bolsonarismo. Já em Pernambuco, o DEM tem comando, hoje, do ex-ministro Mendonça Filho, e conta com a chegada do prefeito de Petrolina, Miguel Coelho, que pretende ser lançado como governador. Acomodar as lideranças nos espaços disponíveis nos estados e definir palanques para a eleição de 2022 é um dos desafios. 

O professor Adriano Oliveira destaca que o DEM em Pernambuco ganha um importante reforço com Miguel Coelho e que a fusão beneficiaria o prefeito de Petrolina. "Os Coelho têm força e capital eleitoral e exigirá articulações maiores do PSB (para se manter no governo). Miguel fortalece a eleição proporcional daqueles que querem ser candidatos pelo Democratas, mas há problemas. Quem comanda a sigla em Pernambuco é Mendonça. O PSL já apoiou o PSB, não seria surpresa se o PSL apoiasse Geraldo Julio, mas Mendonça, o DEM, é oposição e não se veria obrigado a apoiar, seria complicado", destacou.

"O País tem diversos tipos de arranjos e situações locais que definem as alianças. Estados como Rio, São Paulo, Espírito Santo e Pernambuco há problema. Aqui há liderança de Mendonça Filho, mas o partido seria deslocado para liderança de Bivar, que seria o presidente nacional da legenda. E mesmo Mendonça continuando como presidente estadual seria um downgrade para ele", comentou o professor Arthur Leandro. Ele também destaca que com a força da fusão, Miguel ganha maior suporte para ser o candidato da oposição ao governo estadual.

Para o deputado Delegado Waldir (PSL-GO), que se reaproximou nos últimos meses do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), e deve apoiá-lo à reeleição e disputar o Senado, empecilhos locais devem ser superados. "Onde não houver acordo, veremos quem fez o dever de casa e se manteve fiel às orientações dos partidos", disse ao O Globo.

Há ainda discussões sobre qual nome manter no partido e qual número usar. A ideia inicial seria não usar o 17 com o qual Jair Bolsonaro se elegeu em 2018 e ficar com o tradicional 25, utilizado pelo Democratas.

Roberto Gondo, por sua vez, destaca que como não há mais amarras do PSL com Bolsonaro fica mais fácil a negociação levando em conta as necessidades locais de cada estado.

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