Moradores da Ilha de Deus, na Imbiribeira, bairro da Zona Sul do Recife, apontam defeitos nas primeiras casas construídas pelo governo do Estado na comunidade, um ano depois da inauguração dos imóveis. Interruptores de luz deixaram de funcionar, janelas emperraram, portas cederam e há vazamento nos banheiros. Além disso, nem todas as moradias contam com a fiação elétrica embutida. Há residências com os canos por onde passam os fios expostos em todas as paredes.
“Acho que houve pressa para entregar as casas”, avalia Grasiela Germano, 24 anos. Ela recebeu um duplex com sala, dois quartos, cozinha e banheiro. “Não adianta enxugar o sanitário, porque a pia vaza água no chão desde que me mudei para cá”, comenta. “Deixaram o tanque de lavar roupa quase solto, apoiado apenas em dois ferros presos na parede, e a caixa-d’água fica em cima de dois pedaços de madeira. Nas casas, o reservatório está numa laje de concreto”, acrescenta.
A casa onde Grasiela vive com o marido e três filhos pequenos é uma das que não tem fiação elétrica embutida. No imóvel ao lado a fiação é embutida, mas as janelas não fecham porque o buraco dos ferrolhos se partiram. “Janela nenhuma fecha direito, aliás nem uso mais a da cozinha, porque se eu abrir não consigo fechar”, diz Iris Andrade, 31. A porta da sala cedeu com pouco tempo de uso. “A gente suspende a porta na hora de abrir e fechar, para não arranhar o piso”, revela.
Os interruptores da escada e dos corredores não funcionam. “Pensei que a lâmpada tinha queimado, mas troquei e o problema continua do mesmo jeito”, lamenta. No banheiro, o cano da descarga quebrou pouco meses depois de ativado. Todas as casas contam com um fogão (tipo churrasqueira) na área externa, para os pescadores cozinharem crustáceos. Mas a comunidade alega que a peça é pequena e não tem utilidade. “Tirei o meu fogão para aumentar a área de serviço”, diz Iris.
No duplex da vizinha Camila Rocha, 22, a porta também cedeu. Para preservar a cerâmica do piso da sala, a família serrou a parte de baixo da madeira. A madeira das janelas apresenta rachaduras e parte dos interruptores não funciona. Segundo as três mulheres, o governo do Estado está ciente das queixas, mas não tomou nenhuma providência, até agora. “Falamos tudo isso em três reuniões, se marcarem novo encontro ninguém mais vai participar”, afirma Iris Andrade.
A pescadora Elizabete Andrade, 54 anos e 40 deles na Ilha de Deus, reivindica uma casa térrea com três quartos, para acomodar dois netos adolescentes e uma filha deficiente. “Ela não pode dividir quarto com outra pessoa, porque às vezes fica agressiva e pode machucar alguém. Tenho atestado médico provando e vou lutar pelo quarto da minha filha”, declara. Na distribuição dos imóveis, ela deverá receber uma casa térrea de dois quartos. “Está pronta, só falta a mudança”, diz.
Todas reconhecem as melhorias promovidas na Ilha de Deus com a obra de urbanização em curso. “Claro que o lugar está ficando melhor, antes a gente vivia na maré, pisando em lama e esgoto. Mas não podemos esconder os defeitos”, resume a pescadora. A intervenção na comunidade, considerada Zona Especial de Interesse Social (Zeis) teve início em 2008, com a construção da ponte de acesso, num convênio do governo com a Prefeitura do Recife. Inaugurada em 2009, para substituir uma frágil passarela de madeira, a ponte tem 216 metros de comprimento e 3,4 metros de largura.
RESPOSTA - A gerente de articulação de projetos da Secretaria Estadual de Planejamento e Gestão, Norah Neves, disse que a construtora corrigiu os defeitos das portas e janelas das casas. Mas de acordo com as famílias a única providência tomada até agora foi a colocação de uma pequena coberta nas janelas no andar superior.
Sobre os vazamentos no banheiro, Norah Neves não culpa a qualidade da construção. O problema, diz ela, surgiu em função do uso. "A equipe social vem orientando os moradores sobre formas corretas de utilização. Caso existam novas queixas, podem procurar o nosso escritório local". Segundo ela, a fiação exposta em parte das casas foi um projeto concebido e aprovado pelos moradores. "A proposta da tubulação aparente era facilitar a manutenção. Nas novas casas, alteramos o projeto, embutindo a tubulação, por solicitação das famílias".
Os fornos de cozinhar crustáceos também teriam sido acrescentados a pedido dos habitantes, que teriam discordado da construção de uma unidade coletiva.
O projeto prevê 349 unidades habitacionais, sendo 271 na Ilha de Deus e 78 fora, numa vila próxima. Desse total, 105 estão prontas e habitadas e mais 90 serão entregues este ano. O trabalho de urbanização termina em 2012. "Aproximadamente 70% da obra foi executada", diz Norah. Além das casas, estão previstos esgotamento sanitário, iluminação e pavimentação das ruas. O investimento é de quase R$ 40 milhões, recursos do Estado.