Tudo começou no improviso, há meio século, pelas mãos de alguns jovens que queriam ganhar seu próprio dinheiro. Ao estilo hippie, eles espalhavam no chão o artesanato que lhes garantiria um pouco de independência e liberdade. Aos poucos, o negócio foi ganhando dimensões maiores. Virou ponto turístico obrigatório. Atraiu artistas renomados. Tornou-se Patrimônio Turístico e Cultural do povo pernambucano. Hoje, o título é só o que resta do glamour conquistado pela Feira de Arte e Artesanato de Boa Viagem, a segunda mais antiga do Brasil. À beira-mar da famosa Praia de Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, cercada de hotéis que recebem visitantes do mundo todo, é o retrato da decadência e do abandono. Seus 176 artesãos, artistas plásticos e comerciantes de comidas típicas vivem outra vez do improviso, com a diferença de que, agora, dependem do poder público para recuperar o brilho.
“A prefeitura não liga para essa feira. Tem muita barraca enferrujada e quando chove algumas dão choque”, reclama Maria José Brito, 58 anos, que tinha apenas 15 quando chegou ao local. Apontando para o quadro de energia (sem tampa e coberto com um saco plástico), ela diz que os feirantes precisam se preocupar em proteger o cliente e fazem manutenção a cada três meses para substituir as lonas, fiação, cobrir a ferrugem. “A gente queria ver essa feira bonita. Poderíamos pagar por isso, mas a prefeitura não autoriza nem tira os projetos dela do papel.”
Há mais de 20 anos na feira, Josiane Cavalcanti, 55, diz ter cansado de esperar pelo município e mandou fazer um boxe de alumínio, no mesmo modelo dos de ferro. “Temos clientes do mundo todo. Imagina uma pessoa se encostar na barraca e sair suja de ferrugem ou levar um choque? Optei por fazer investimento próprio. Gastei R$ 1,5 mil no boxe e mais R$ 200 na instalação elétrica. Mas a prefeitura precisa olhar pela gente”.
Há muito se fala na requalificação do espaço. A última vez foi em 2013, quando 40 ambulantes que atuavam indevidamente no local foram realocados para área próxima, onde a feira funcionou antigamente – e cobiçada pelos expositores. Nada se fez. Agora, os comerciantes voltam a negociar o tema com a secretária de Desenvolvimento e Empreendedorismo, Roseana Amorim, que assumiu há 90 dias.
“Apresentamos projeto de boxes de alumínio, fechadinhos, com cobertura em lona e telhas transparentes entre eles, para proteção contra a chuva e o sol, dessa forma não perderíamos a característica de feira como num projeto em alvenaria”, informa Gilvanete Silva, 59, uma das integrantes do Conselho Gestor da feirinha, eleito em abril. “Individualmente, cada boxe sairia por R$ 7 mil, mas coletivamente cairia pela metade, é uma proposta viável, é só o município buscar parcerias. Espero que não continuem empurrando o problema com a barriga e voltem a nos tratar com respeito. Muitos comerciantes são formados e colocaram a feira em primeiro lugar.”
A secretária garante que desta vez o projeto sai. “De fato, foram criadas expectativas com projetos não viabilizados. Mas agora eles mesmos estão definindo o que querem e a proposta está dentro do nosso orçamento. Este ano vamos tratar do projeto e das licitações, mas não dará tempo de executar tudo”, avalia. “A Celpe e a Emlurb fizeram levantamento das instalações elétricas e estão elaborando laudo até agosto para darmos solução ao problema. Também já estamos providenciando a colocação de banheiros na feira, que tem característica histórica a ser preservada.”