A obra da ponte que ligaria os bairros de Iputinga, na Zona Oeste do Recife, e Monteiro, na Zona Norte, é, acima de tudo, didática. A lição que dá é a dos atropelos na execução e do desperdício de recursos públicos. Iniciada em março de 2012, deveria estar pronta 18 meses depois, a um custo de R$ 42,8 milhões, numa parceria da prefeitura com o governo federal e o Banco Mundial. Os serviços pararam em meados de 2014, com apenas 35% de execução. Restaram as estruturas das cabeceiras da ponte, a descrença da população do entorno, além de um inquérito em que o Ministério Público Federal (MPF) investiga o que deu errado na obra.
Do lado da Iputinga, o monstrengo de 20 metros de altura e vergalhões de aço saltando da estrutura é a marca do abandono. Crianças que vivem no entorno se arriscam escalando o elevado para empinar pipa. O local virou ponto de conserto e lavagem de caminhões. E os primeiros barracos já começam a ser erguidos na área, no prenúncio de mais uma ocupação. “Não tem ninguém morando aqui ainda, esse local serve para guardar os animais”, diz o vigia José Carlos dos Santos, que mora nas proximidades. Ele se refere aos cavalos, bois e vacas que passam o dia pastando na área.
IPUTINGA
Ainda na Iputinga, o único sinal de que a obra foi realizada a contento é o calçamento da Rua Jornalista Possidônio Cavalcante Bastos, que leva até a cabeceira do elevado. A via é uma das 23 que seriam requalificadas dentro do projeto Capibaribe Melhor, que previa a recuperação das áreas do entorno do curso d´água.
No lado de Monteiro, o abandono é o mesmo. A única diferença é o tamanho da estrutura de concreto, um pouco menor. A única coisa que aumenta é a certeza da população na inviabilidade da obra. “Nem me lembro mais quanto tempo faz que a prefeitura veio aqui falar das desapropriações. Acho que essa ponte não sai mais”, reclama a doméstica Maria Geane, cuja casa está na rota da construção.
A conselheira do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Teresa Duere foi relatora do processo que investiga a obra no âmbito do município. Ela questiona a paralisação. “A justificativa da crise econômica não é pertinente, uma vez que várias outras coisas foram feitas”. Os R$ 42,8 milhões originais de custo viraram R$ 56 milhões após readequações no projeto. Duere afirma ter esgotado as instâncias locais e encaminhado o parecer do TCE para o Ministério Público de Contas, que por sua vez remeteu ao MPF, uma vez que a obra tem recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2). O resultado foi a instauração de um inquérito civil no início de 2015.
Não há definição sobre o resultado da investigação. Na página do Ministério Público Federal na internet, o último despacho do procurador da república João Paulo Holanda Albuquerque, responsável pelo caso, é de maio deste ano. Holanda dá conta de que a Prefeitura do Recife não respondeu a um ofício enviado por ele em março, solicitando a cópia do contrato com o Banco Mundial para a execução do projeto viário.
Por meio de nota, a assessoria de comunicação da Empresa de Urbanização do Recife (URB), afirma que “para garantir a viabilidade do projeto e o bom uso do dinheiro público, a URB irá realizar estudos de mobilidade e os projetos executivos para a readequação viária”.