Ultrapassado, superlotado e alvo de denúncias até na Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Complexo Prisional do Curado, no bairro do Sancho, Zona Oeste do Recife, segue esquecido pelo poder público, produzindo motins e cadáveres. Na manhã de ontem, uma ousada tentativa de fuga terminou com a morte do detento Anderson Luiz de Souza, 23 anos, além de provocar ferimentos à bala em quatro outros presos e em dois agentes penitenciários.
O tumulto aconteceu no Presídio Frei Damião de Bozzano (PFDB), um dos três que fazem o complexo. Por volta das 8h, Anderson fingiu um mal-estar e solicitou atendimento na enfermaria da unidade. Ao chegar, armado, rendeu um agente penitenciário, tomando-lhe a pistola e o colete. Outros quatro detentos, também armados de revólveres e pistolas, se juntaram à investida e renderam as pessoas que estavam na enfermaria. Professores da Escola Joel Pontes, que funciona dentro do Frei Damião, foram usados como escudos humanos pelo grupo, que tentou fugir pelo portão principal da unidade.
Ao perceber a situação, os agentes penitenciários que estavam na permanência começaram a disparar. Os bandidos revidaram. No tiroteio, Anderson Luiz – que respondia a sete processos, a maioria por assaltos a bancos – foi atingido no rosto e morreu a poucos metros do portão de entrada. Quatro outros detentos tiveram ferimentos leves provocados por tiros e estilhaços. No confronto, os agentes Máximo Daniel da Silva e Marcos Antônio Borges Farias foram atingidos. Todos os feridos foram levados para o Hospital Otávio de Freitas, também no Sancho, e não correm risco de morte.Os detentos atingidos foram identificados como Emerson Tertulino Gomes de Cabral, 26 anos; Alexsandro Pereira de Souza, 24; Alexandre Felipe da Silva, 36; e José Robson Moura da Paz, 26.
A manhã foi de muita tensão na unidade. Policiais da Radiopatrulha, Companhia Independente de Operações Especiais (Cioe) e Batalhão de Choque foram chamados para controlar a situação. Apenas por volta das 11h os primeiros detentos feridos começaram a deixar o presídio. Ao meio-dia todas as unidades especiais da Polícia Militar já tinham saído do local, após uma varredura onde foram encontrados uma pistola, um revólver e bebida alcoólica artesanal.
Por volta das 12h30, peritos do Instituto de Criminalística (IC) saíram do Frei Damião com uma sacola em que eram vistas cápsulas de projéteis de pistola, revólver, fuzil e espingarda calibre 12. Do lado de fora, mães e esposas de detentos procuravam informações. “Eles não dizem nada para nós. O pau come aí dentro todo dia, é preso armado, agente armado, só pode dar nisso”, comentou a mãe de um dos detentos feridos, que pediu para não ser identificada.
CRÍTICAS
O titular da 19ª Promotoria de Execuções Penais do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), Marcellus Ugiette, esteve no local e criticou as ações do governo para evitar a entrada de armas nas unidades. “É preciso investigar com inteligência, pois a política dos muros e da força não tem dado resultado.” O promotor pediu pressa na análise de uma eventual desativação do complexo. O processo de desapropriação de imóveis do entorno para reforço dos muros foi suspenso pelo governador Paulo Câmara em julho de 2016.
O secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos, Pedro Eurico, disse que vai intensificar a fiscalização na unidade. “Infelizmente, existe o problema do acesso às armas pelos presos. Já apreendemos 24 apenas este ano e vamos realizar uma grande operação para coibir essa prática.” Eurico discorda de Ugiette em relação ao reforço na estrutura do complexo. “Isso impediu resgates com uso de explosivos. A única alternativa que eles (os presos) têm para fugir é a força. E isso vai ser repelido na mesma medida. Aqui em Pernambuco, lugar de bandido é na cadeia”, completou.