SEGURANÇA

Audiências de custódia na berlinda

Soltura de presos é questionada

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Publicado em 11/08/2017 às 7:28
André Nery/Acervo JC
Soltura de presos é questionada - FOTO: André Nery/Acervo JC
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Presos com armas e drogas durante a operação policial em que a garota Sthefanny Vitória, de apenas dois anos, foi morta, no último dia 4, no bairro do Ibura, Zona Sul do Recife, Felipe Lopes Prado, Moisés Cabral da Silva e Edson Souza de Araújo estão em liberdade. Por não terem sido apresentados à Justiça no prazo de 24 horas, foram liberados em uma audiência de custódia. Segundo a Polícia Militar, os três voltaram ao bairro, onde continuam a delinquir e a ameaçar testemunhas.

O caso ilustra a polêmica em torno das audiências de custódia, que, neste mês, completam dois anos de aplicação no Brasil. A ideia é simples: submeter o preso em flagrante à avaliação de um plantão da Justiça, que analisa se a prisão deve ser mantida ou se a pessoa pode responder em liberdade ao processo legal, desde que devidamente monitorada e sob condições impostas pelo juízo.

Apesar de não se pronunciarem publicamente, setores das Polícias Militar e Civil estão incomodados com decisões recentes do judiciário. Além dos suspeitos do caso Sthefanny – que acusam a Polícia de ter feito o disparo que matou a garota –, citam o sargento da PM que foi baleado no último dia 9 de julho, em Floresta, no Sertão, durante uma perseguição a dois suspeitos de tráfico de drogas. A bala ficou alojada no colete do policial, e o criminoso terminou liberado para responder em liberdade.

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Ou o caso de Artur Alexandre do Carmo, de 19 anos, suspeito de 17 assaltos a ônibus no Recife em 2017. Preso em julho, ele confessou um dos crimes e foi liberado. No último dia 7 de agosto, depois de concluída a investigação, a Justiça decretou a prisão de Artur, mas ele está foragido. “Bate aquela sensação de enxugar gelo, né? A gente sabe que a lei prevê isso, mas, em certos casos, é como se o nosso trabalho fosse jogado pelo ralo”, diz, em reserva, um oficial da PM.

QUINTO LUGAR

Casos pontuais podem causar indignação, mas o cenário não é tão “libera geral” quanto parece. Percentualmente, Pernambuco é o quinto Estado em que as decisões pela manutenção das prisões superam as liberações – 60,3% dos casos registrados entre agosto de 2015 e junho deste ano resultaram em prisão preventiva, enquanto em 39,6% dos registros, os presos em flagrante foram liberados para responder ao processo em liberdade. Os dados são do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O Estado fica atrás apenas de Tocantins, Rondônia, Mato Grosso do Sul e do campeão Rio Grande do Sul, onde 84,8% das ocorrências terminam com a prisão. A Justiça da Bahia é a que mais libera, segundo o levantamento do CNJ, com 61,2% dos casos.

Oficialmente, o Executivo estadual se queixa de que a falta de plantões do Judiciário em várias cidades do interior leva o efetivo policial a percorrer grandes distâncias para apresentar, em outras cidades, presos em flagrante. O governo estima que isso represente uma perda de 20% na capacidade de policiamento. 
“Já estamos conversando com o Tribunal de Justiça para melhorar essa logística de modo a não perdermos capacidade operacional. Como toda novidade – e tem apenas dois anos – a audiência de custódia precisa de ajustes”, explica o secretário de Defesa Social, Antônio de Pádua.

“A audiência é um instrumento importante no sentido de evitar que pessoas sejam jogadas, desnecessariamente, no sistema prisional, por exemplo. Eventualmente, o entendimento de um magistrado em liberar ou manter presa uma pessoa pode ser considerado incorreto por outro juiz, pela defesa ou o Ministério Público. Mas a defesa pode recorrer à manutenção de uma preventiva, e o Ministério Público pode representar pela prisão de alguém que ele considere que foi solto injustamente”, afirma o desembargador Mauro Alencar, que representa o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) no Pacto pela Vida. “Estamos afinados com o governo do Estado no sentido de aprimorar os procedimentos”, completa.

Para o titular da 19ª Promotoria de Execuções Penais do Ministério Público, Marcellus Ugiette, antes das audiências de custódia “se prendia muito e sem necessidade”. Segundo o promotor, o remédio para corrigir eventuais distorções é o acompanhamento dos presos em flagrante que sejam liberados. “Seria importante criar uma estrutura apenas para um monitoramento constante, com assistentes sociais. Muitas vezes o preso é liberado e até o endereço que ele fornece à Justiça pode ser fictício”, completa.

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