Josefa Nice de Moura, nascida em 17 de abril de 1945, está prestes a completar 72 anos de vida e acumula 42 na profissão de cobradora de ônibus. O tempo de serviço de Josefa, mais conhecida como Pirrita - apelido que a acompanha desde pequena -, chama a atenção. A senhora feliz e cheia de vida contrasta com a realidade que se constrói para a profissão, no atual cenário de violência urbana.
"Eu amo meu trabalho. Sinto-me bem demais. Venho para o trabalho e acaba o meu estresse", conta Dona Pirrita, num pique que deixaria até o mais disposto jovem com inveja. Ela já é aposentada e, mesmo assim, não deixou a função: "Continuo ativa", afirmou. Sempre que ouve dos familiares para se afastar da profissão, com a justificativa de que "vai acabar morrendo", é enfática na resposta: "Trabalho mata ninguém não. Trabalho mata é gente preguiçosa".
A gente tem que ser guerreira, tem que lutar pelo o que a gente quer
Pirrita começou a trabalhar ainda criança, na roça com os pais, quando morava em Vitória de Santo Antão, sua terra natal. Depois, trabalhou em olaria e casas de família. Já foi casada, mas se separou. "Vou continuar até quando Deus quiser. Eu amo demais trabalhar", disse.
A rotina de Pirrita
Sempre às 3h, ela acorda e vai para a garagem da empresa Mobibrasil, em São Lourenço da Mata, Região Metropolitana do Recife (RMR), de onde é funcionária. Pirrita sai da garagem na linha 2493 - Tiúma/TI Camaragibe, às 3h51, como faz questão de frisar. Daí então, segue seu destino até a tarde - hora de término de seu experiente. "Passageiro, motorista, tudo por aqui gosta de mim. Até meu patrão fala comigo", comenta, cheia de orgulho.
Situações chatas? Raramente acontecem, segundo ela. O único momento triste para a senhora foi o dia em que sua linha foi assaltada, há oito anos. Mas a nossa personagem não liga: "Não vou brigar com ninguém. Se não eu fico velha". Ela não é de se intrigar, mas também não leva desaforo para casa: "Se alguém fala coisa comigo, eu falo também. Respeito é bom e eu gosto", disse.
Quando não está trabalhando, Pirrita gosta de dormir e descansar, assim como ficar com seus filhos, netos e bisnetos. Religiosa, gosta de visitar igrejas e visitar locais como Juazeiro do Norte, no Ceará, terra de Padre Cícero, de quem é devota.
Atividade na terceira idade é positiva
A geriatra Carla Núbia comenta que se manter ativo depois dos 60 é positivo: "É extremamente saudável. A falta de atividade tem sido um grande fator para o desenvolvimento de depressão na terceira idade", disse. Carla conta que há um estudo que versa sobre o "envelhecimento ativo", que é você planejar muito bem essa fase da vida. "No nosso estado há muitos idosos ativos. Há no interior aquelas mulheres centenárias que trabalham na roça", conta.
Passado, presente e futuro
Dona Pirrita não lembra exatamente quando entrou na profissão, mas calculando secamente com as informações que ela cedeu à reportagem - entrou com 30 anos e está prestes a completar 72, em abril - estima-se que Pirrita entrou no ramo em 1975. Ela acompanhou as mudanças e evoluções no transporte: "Hoje, os ônibus são bem melhores. Trabalhei naquelas sucatas velhas, mas hoje está bem melhor", relata, aos risos.
Nos últimos dois meses, oito linhas de ônibus deixaram de circular com cobradores na Região Metropolitana. Pirrita não se preocupa com esta questão: "O futuro a Deus pertence. Não sei como vai ser, mas não vou me preocupar agora". Ainda no futuro, Pirrita sempre faz questão de afirmar que ama o trabalho e vai continuar "até quando Deus quiser", mas faz uma ressalva: "Também não vou ficar até morrer, né? Quando sair, quero tempo para me divertir um pouquinho", conclui, novamente aos risos.
Para o Dia da mulher, Pirrita deixa seu recado: "Mulher tem que ser lutadora. A gente tem que ser guerreira, tem que lutar pelo o que a gente quer. Lutem e garantam o seu", encerrou.