Um bairro com dimensão de cidade. Em uma década, Boa Viagem ganhou 22.534 novos moradores. Saltou de 100.388 habitantes, em 2000, para 122.922 no ano passado. A localidade da Zona Sul do Recife tem hoje população superior à de alguns municípios da Região Metropolitana, como Igarassu (102.021), Abreu e Lima (94.429) e Ipojuca (80.637). Não tão grande em extensão territorial, Rosarinho, na Zona Norte da capital, cresceu numa proporção até maior: 56%. O número de moradores pulou de 2.606 para 4.077.
O crescimento da população nos 94 bairros do Recife compõe o conjunto de dados consolidados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), liberado ontem com novos indicadores sociais. O mapa não surpreende a secretária de Gestão e Planejamento do Recife, Evelyne Labanca. "Qualquer dado novo é importante para fazermos uma revisão. Mas essa fotografia já era esperada, vem sendo acompanhada ao longo da década", avaliou. Segundo ela, o resultado da contagem populacional não muda o curso das ações já em andamento, só confirma o que vinha sendo constatado sobre as áreas de maior concentração de moradores nas Zonas Sul e Norte.
"As pessoas se deslocam de acordo com os empreendimentos econômicos. Em Boa Viagem, além do crescimento imobiliário, empreendimentos no Porto de Suape, em Ipojuca, no Litoral Sul do Estado, aqueceram a busca por moradia nas cidades próximas", argumenta. A tendência, na próxima década, espera Evelyne, é a sobrecarga em bairros de classe média alta com alto crescimento populacional na Zona Norte diminuir. "Muitos imóveis ocupados nesses últimos dez anos estavam autorizados antes da proibição da Lei dos 12 Bairros, que limita o adensamento", explica. O Censo 2010 revela também aumento do número de moradores em áreas mais populares, como Dois Unidos e Passarinho, o que estaria associado à melhor infraestrutura e construção de imóveis para pessoas de menor renda.
Para o pesquisador Jan Bitoun, professor da pós-graduação em geografia da Universidade Federal de Pernambuco, o censo revela um crescimento populacional moderado no Recife (8% em dez anos), fenômeno comum a outras grandes metrópoles. Quanto ao aumento maior em determinados bairros que estão sendo verticalizados, ele lembra que a cidade é "a expressão do modelo de crescimento capitaneado por grandes empresas imobiliárias". E destaca a necessidade de buscar um modelo sustentável do ponto de vista ambiental, para uma melhor convivência no espaço urbano.
Ao mesmo tempo que recebeu mais pessoas, Boa Viagem, por exemplo, passou a sofrer com problemas típicos de grandes centros urbanos: o trânsito piorou, os prédios se multiplicaram e a tranquilidade está cada vez mais distante. "Está parecendo São Paulo. É uma coisa enorme. A quantidade de edifícios e carros aumentou e as ruas são as mesmas", comenta a aposentada Maria José Meireles, 77 anos.
A realidade de Boa Viagem é encontrada também em outros bairros. "Falta espaço para respirar. As casas que sobraram estão alugadas para o comércio. Hoje, da minha janela, só consigo ver o apartamento dos outros", relata a dona de casa Luíza Oliveira, 55, moradora do Rosarinho.
Em Pau-Ferro, bairro menos populoso da cidade, área de preservação ambiental, a faxineira Adriana Alzira Batista, 35, diz que a água encanada não chega. "Peço um carro-pipa a cada 15 dias para abastecer a cisterna", contou Adriana.