Saúde

Zika: cientistas avançam na criação de fármaco para tratar a doença

Primeira etapa para criação de antiviral contra o zika foi cumprida com maestria

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 16/08/2017 às 9:45
Alexandre Gondim/JC Imagem
Primeira etapa para criação de antiviral contra o zika foi cumprida com maestria - FOTO: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Pesquisadores da Fiocruz Pernambuco caminham rumo ao desenvolvimento de uma medicação capaz de ser utilizada em duas situações: em pessoas que são expostas a um quadro de risco para a infecção pelo zika e também em pacientes que desenvolveram os sintomas da doença e precisam bloquear a proliferação do vírus no organismo. A primeira etapa para o desenvolvimento do medicamento foi cumprida com maestria. Na fase in vitro (no laboratório), os cientistas descobriram que a substância 6-metilmercaptopurina ribosídica (6MMPr) pode ser um potencial medicamento antiviral contra o zika, pois é capaz de bloquear a replicação do vírus em células nervosas e epiteliais humanas. Os achados estão documentados na revista científica International Jornal of Antimicrobial Agents.

“Os resultados são relevantes para a prática clínica. Se uma gestante, por exemplo, sabe que uma pessoa adoeceu por causa da zika na rua onde mora, ela poderia receber a medicação para prevenir a infecção pelo vírus”, explica o médico veterinário Lindomar Pena, pesquisador do Departamento de Virologia e Terapia Experimental da Fiocruz Pernambuco. Coordenador do estudo, ele destaca que leva tempo para que uma situação como essa deixe de ser hipotética. “A partir do momento em que se identifica uma substância-líder (com potencial para projetar novos fármacos), a média é de dez anos para que ela cumpra todas as fases e se torne um medicamento. Devido à gravidade do zika e da necessidade de se ter uma terapia (contra a doença), diria que esse tempo pode ser reduzido pela metade. É preciso que sejam cumpridas todas as etapas com muito rigor por questões de segurança”, frisa Lindomar.

A equipe do pesquisador preencheu todos os critérios para o teste laboratorial, de validação da 6MMPr. Em breve, será iniciada a segunda fase, de investigação em animais, cujo protocolo já foi estabelecido. Serão feitos testes em camundongos e também em outras espécies.

No caso de pacientes que adoecem em decorrência da infecção pelo zika e evoluem com comprometimento neurológico (como a síndrome de Guillain-Barré, doença autoimune capaz de levar à paralisia), um medicamento antiviral poderia ser indicado para o tratamento. “Seria interessante uma substância dessa tratar essas complicações no início dos sintomas. Então, precisamos fazer mais estudos”, avalia. O pesquisador acrescenta que atualmente a equipe colabora com outros grupos de estudo para analisar a necessidade de se aperfeiçoar a 6MMPr para uma possível melhoria da atividade e segurança da substância durante o processo de bloqueio da replicação do zika.

“O teste in vivo (animais) é essencial para mostrar a eficácia da 6MMPr, que pode ser modificada para que a gente consiga melhorar os ‘atributos’ dela. Ou seja, é uma substância que já inibe muito bem o zika. Mas, se ela bloqueia 99,6%, queremos chegar a 99,9%. Esse aperfeiçoamento também pode ser necessário no caso de se perceber a existência de algum efeito colateral, o que é muito comum nos testes com drogas”, reforça Lindomar, cuja equipe já havia identificado a utilidade da 6MMPr para o vírus da cinomose canina. "Por ser um RNA vírus como o zika, levantamos a hipótese de que a 6MMPr também teria atividade contra o zika."

Inovação

Outros pesquisadores têm estudado moléculas capazes de diminuir a produção de zika. O diferencial dos cientistas da Fiocruz Pernambuco é que eles mensuraram a atividade do vírus nas células. “Além disso, nem todos os estudos avaliaram a replicação do zika. E o nosso analisou não só nas células epiteliais, mas também nas neuronais, já que o vírus tem predileção pelo sistema nervoso em desenvolvimento e ainda pelo cérebro de pessoas adultas, que podem ser afetadas pelas síndromes neurológicas.” A primeira fase do estudo, que teve duração de um ano, contou com recursos financeiros do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facepe).

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