Joaquim Dantas Vilar, 36 anos, engenheiro, pecuarista e produtor de queijos deixou a Fazenda Carnaúba, zona rural de Taperoá, no Sertão, e percorreu quase 300 quilômetros de carro até o aeroporto da capital paraibana. Lá encarou um voo de quase 4 horas até São Paulo. O quarto dos cinco filhos do engenheiro Manelito Dantas - reconhecido desbravador, empreendedor e fiador das terras secas do Nordeste - viajou para participar do II Prêmio Queijo Brasil, do Mesa Tendências, o maior concurso de queijos artesanais do País. Na bagagem de ida levou queijos sertanejos. Na de volta traz o brilho da amálgama entre estudos, crenças e persistência: os queijos da Carnaúba abocanharam duas medalhas de ouro, mais uma de prata e outra bronze.
O leite produzido pelas cabras nativas da fazenda foram matéria prima para os dois ouros: um chama-se Arupiara; o outro é Dom Ariano, queijo em homenagem ao escritor Ariano Suassuna (1927-2014), idealizador da criação de cabras junto com o primo Manelito, que também dá nome a um dos premiados.
Os produtores celebram a conquista: são cinco anos seguidos de seca; sem chuvas, a fazenda só consegue produzir 20% de sua capacidade. “Concorremos com 244 queijos de todos os recantos de todas as espécies”, celebra Joaquim Dantas, sobrinho neto de Ariano.
“Esses queijos foram criados em merecida homenagem a Ariano e Manelito que, ao longo de décadas, traçaram uma diretriz exitosa de produção no semiárido. Pudemos mostrar, mais uma vez, nossa riqueza , nossa grandeza e nosso potencial.”
MATURADOS
Os queijos Dom Ariano e Dom Manelito são produzidos em grandes peças: pesam 4 quilos e passam por uma maturação de seis meses. O Dom Manelito é feito com leite de vaca; a homenagem a Ariano vem da produção leiteira das cabras nativas: moxotó, canindé, marota…
"A França, que tem um rebanho caprino estimado em apenas 960 mil cabeças, ganha uma fortuna com o leite e o queijo de suas cabras. O brasileiro é de 14 milhões, dos quais 11 milhões estão no Nordeste”, disse, certo dia, o visionário escritor, homem que perseverou, insistiu e acreditou: no Brasil e no seu povo.
Os rótulos dos queijos da Carnaúba, premiados nacionalmente e também na Espanha, trazem desenhos de Ariano, a tipografia armorial idealizada por ele - inspirada nos ferros de marcar boi do Sertão paraibano - e criação gráfica de Ricardo Gouveia de Melo.
Produzir queijos no Sertão não é fácil, assegura quem faz: eles ainda não conseguiram regulamentar a produção junto ao governo - uma peleja que dura muitos anos. Os primeiros queijos da Carnaúba surgiram na década de 1950; a queijaria passaria a funcionar 20 anos depois. Em vez de ervas francesas, marmeleiro, alfazema de periquito, cumaru e aroeira aromatizam e dão mais sabor à produção, que já é vendida em diversas lojas do Brasil e pode ser despachada pelos queijeiros sertanejos para o Brasil inteiro.
Segue a peleja: “Precisamos da regulamentação do queijo artesanal. Só assim poderemos vender em qualquer lugar, aumentar a produção empregar mais gente . Seca não é problema. Uma legislação mal elaborada sim”, afirma Joaquim, perpetuando as ideias que levam o Sertão adiante.