CRÍTICA

O hotel muito louco de Wes Anderson

O Grande Hotel Budapeste estreia nesta quinta-feira (3/7)

Ernesto Barros
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Ernesto Barros
Publicado em 02/07/2014 às 6:00
Fox Filmes/Divulgação
O Grande Hotel Budapeste estreia nesta quinta-feira (3/7) - FOTO: Fox Filmes/Divulgação
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Ele é um dos mais talentosos e excêntricos cineastas americanos da atualidade. Até seu jeito de vestir é diferente: parece um dândi, com roupas tomadas emprestadas ao escritor Tom Wolfe. No seu oitavo longa-metragem, Wes Anderson prova que estilo e imaginação são ferramentas imprescindíveis para conquistar os olhos e o coração do espectador.

O Grande Hotel Budapeste, que estreia nesta quinta-feira (3/7) em circuito nacional, é um desses filmes com o raro poder de nos transferir para outra dimensão – com suas cores, personagens e peripécias sem fim, somos levados para um tempo e um lugar que só existem graças a magia do cinema e sua intrínseca capacidade de encantar e embevecer. Os recifenses foram os primeiros a ficarem apaixonados pelo filme, que abriu o Cine PE – Festival do Audivisual em abril passado. Um pouco antes, em fevereiro, O Grande Hotel Budapeste ganhou o Grande Prêmio do Júri do Festival de Berlim.

Nas mãos de Anderson, o cinema parece um brinquedo de armar, uma arte da bricolage e da memória. Ele foi buscar inspiração nos escritos do escritor alemão Stefan Zweig para recriar uma Europa que já começara a sentir os efeitos das guerras que iriam marcar tragicamente sua geografia e mentalidade. Zweig, um austríaco culto e pacifista, bandeou-se para o Brasil quando o nazismo mostrava suas unhas. Aqui, entre outros livros - inclusive os contos que resultaram O Grande Hotel Budapeste – escreveu o espantoso Brasil: País do futuro. Apesar de toda a esperança, suicidou-se ao lado da mulher, Lotte, em Petrópolis, em 1942.

A época em que a historia se desenrola é imprecisa, mas, pelo que se vislumbra em alguns momentos, deve ser os anos 1930. No entanto, mais do que a própria realidade histórica, a fictícia Zubrowska remete à Europa das comédias de Ernst Lubistch, com seus personagens românticos, frívolos e trapaceiros. Estas três qualidades formam a personalidade de Gustave H., o concierge do Grande Hotel Budapeste, uma imponente construção fincada nas bordas de um montanha. Como se não bastasse mandar em todos os funcionários, ele ainda seduz todas as mulheres louras, ricas e idosas que se hospedam no hotel. O inglês Ralph Fiennes está excelente como o concierge, com destaque para sua habilidade ao trafegar pelas várias facetas do personagem.

Fascinante – e repulsivo, em determinados momentos –, o retrato de Gustave chega ao espectador por meio de hábeis subterfúgios narrativos, como se Wes Anderson quisesse dizer que quem conta um conto sempre aumenta um ponto. Assim, um escritor (Tom Wilkinson) conta para o espectador como conheceu, quando era mais jovem (agora vivido por Jude Law), o recluso e misterioso dono do Grande Hotel Budapeste, numa uma rápida estadia no lugar. Durante um jantar, o escritor ouve do Sr. Zero Moustapha (F. Murray Abraham), a história de sua amizade com Gustave H. e como se tornou dono hotel, onde começou a trabalhar ainda adolescente. 

Zero (o estreante Tony Revolori) e Gustave H. vivem uma extraordinária aventura em que uma fortuna, herdada de um rica amante idosa (Tilda Swindon, irreconhecível sob pesada maquiagem), modifica o destino dos dois. Mas, até botar o dinheiro nas mãos, eles enfrentam vilões terríveis, como o irascível Dmitri (Adrien Brody) e seu violento comparsa Jopling (Willem Dafoe), que vão atrás deles por causa do desaparecimento de uma quadro famoso. Gustave ainda passa uma temporada na prisão, onde se salva graças a ajuda do preso Ludwig (Harvey Keitel, em ótima ponta), que faz um túnel e serra barras de aço com a ajuda de utensílios de cozinha.

Se a história a maioria das vezes parece absurda, a maneira como a ação é apresentada na tela é ainda mais espantosa. Para mostrar que as ações se passam em tempos diferentes, Wes Anderson apresenta-as em formatos específicos: a mais antiga em 1.37 (como os filmes clássicos), a intermediária em 2:35 (CinemaScope) e a mais recente 1.85 (tela plana). Além disso, há um grande uso de maquetes e efeitos mecânicos que dão a O Grande Hotel Budapeste uma aura de intensa magia e inventividade. Poucas vezes, no últimos anos, um cineasta brincou tanto com poder do ilusionismo cinematográfico em um filme que é um encanto da primeira à última cena.

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