A programação do festival É Tudo Verdade, realizado em São Paulo, contou com a estreia brasileira do documentário O Processo, abordando o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em duas sessões realizadas no Insituto Moreira Salles. Ambas as sessões lotaram, gerando filas e alta procura.
Para dar conta da demanda, foi aberta uma terceira sessão às 23h, que também teve ingressos esgotados. O Processo teve sua estreia internacional no último festival de Berlim, conquistando o terceiro lugar na escolha do público na seção Panaroma. A obra foca nos seis meses que ligam a aceitação da denúncia contra Dilma até a confirmação de seu afastamento. O lançamento comercial está previsto para 17 de maio.
Sobre o filme
O documentário dirigido por Maria Augusta mostra como a equipe que defendeu Dilma, acusada de maquiar as contas públicas, preparou sua estratégia e lutou até o final, apesar de estar cada vez mais consciente de que a destituição, apoiada pela oposição, seria inevitável.
Sem voz em "off" nem entrevistas, o documentário de mais de duas horas de duração mostra, além disso, as conversas de corredor, os encontros de dirigentes políticos, assim como os momentos de tensão nos bastidores e nas ruas, sintoma do clima de polarização que tomou conta dos brasileiros.
Artífices da defesa ante à comissão especial que conduziu o processo de 'impeachment', o advogado José Eduardo Cardozo e a senadora Gleisi Hoffmann - atual presidente do PT - se transformam assim em protagonistas de um documentário em que Dilma é onipresente, mesmo que seja apenas mostrada falando à imprensa ou fazendo pronunciamentos.
"Faço filmes para entender a realidade" e "o que estava acontecendo no Brasil me preocupava muito", afirmou Maria Augusta à AFP.
Ela é autora de uma trilogia sobre o sistema judicial de seu país e vencedora de vários prêmios no exterior.
Maria Augusta explica que a defesa de Dilma concedeu um amplo acesso ao processo. "Conheciam meu trabalho e confiavam em mim. Houve poucas exceções por parte de alguns senadores que optaram por deixar uma reunião quando eu entrava com a câmera", explica a cineasta, enfatizando que a oposição preferia não se deixar filmar.
Ela assegura, no entanto, que a todo momento pôde trabalhar com independência total.
Seu filme não pretende "mudar a opinião de ninguém", segundo ela.
"Não sou uma ativista, caso contrário faria filmes mais fáceis", afirma, definindo sua obra como essencialmente um documento histórico.
Repercutindo o mal-estar expressado no ano passado por seus colegas na Berlinale, Maria Augusta concorda que a situação política, econômica e cultural piorou desde a posse de Temer, que pôs fim a mais de 13 anos de governo de esquerda.
"A direita e a extrema-direita ganharam muita força, propagando suas ideias (conservadoras) na sociedade", lamenta, dando como exemplo a proibição de uma exposição de arte por seu conteúdo sexual, o que causou um grande debate.