Uma quinta-feira de tempo bom, sem neve e com um solzinho tímido: um ótimo começo para a Berlinale 2013. Pela manhã, a Potsdamer Platz já estava fervilhando de jornalistas no maior corre-corre Em frente ao Berlinale Palast, alguns funcionários concluíam serviços de limpeza e estendiam o tapete vermelho. Afinal, nos próximos 10 dias, as estrelas do mundo do cinema vão passar por ali. Ontem (07/02), quem teve a honra de abrir o 63º Festival Internacional de Cinema de Berlim foi o cineasta chinês Wong Kar-wai, de 54 anos, com o longa-metragem The grandmaster. O diretor de Amor à flor da pele, que já esteve por duas vezes competindo na Berlinale, tem ainda outra grande missão pela frente: presidir o júri que outorgará o Urso de Ouro ao melhor filme do do festival.
Antes da sessão de gala, que teve a participação de ministros de Estado e do presidente do festival, Dieter Kosslick, o filme foi visto pelos jornalistas, que ocuparam duas salas do complexo Cinemaxx. The grandmaster, que estreou na China em janeiro passado, é um drama biográfico, o primeiro da carreira de Kar-wai. Trata-se da cinebiografia de um mestre das artes-marciais: Ip Man, mais conhecido no Ocidente por haver sido professor de Bruce Lee, o ator-lutador chinês que morreu no auge da carreira, em 1973, justamente quando estrelou seu único longa hollywoodiano, o clássico Operação: Dragão, de Robert Clouse
Mas, ao contrário de Operação: Dragão e da avalanche de filmes de Kung-Fu, que invadiram o Ocidente durante a década de 1970, a experiência de Kar-wai vai para outra direção. Apesar de The grandmaster exibir muitas cenas de luta, todas bem coreografadas por Yuen Woo-ping, o mesmo de de Matrix, Kar-wai quer chegar ao âmago do seu biografado e daqueles que tiveram algum tipo de relação com ele. Além é, claro, de expressar o mundo de acordo com seu estilo rebuscado e detalhista em que nada parece estar faltando, seja em relação à motivação dos personagens, reconstituição histórica, decoração ou ao figurino – só para citar a parte mais visível do seu trabalho.
Como sempre um aclamado esteta, Kar-wai diz a que veio já na abertura de The grandmaster: uma belíssima sequência de luta filmada na chuva que, às vezes, lembra mais um balé aquático. O filme cobre várias décadas da história chinesa. Começa em 1936, quando Ip Man é chamado pelo mestre Gong Youtian (Wang Quingxiang), que vai se aposentar, para ser seu sucessor numa escola de artes marciais. A filha do mestre, interpretada por Zhan Zyiy, revelada em O tigre e o dragão, tenta ser sua oponente, mas acaba se apaixonando pelo lutador, que já é um homem casado.A his tória deles, marcada por impossibilidades e desencontros, lembra o que Kar-wai desenvolveu em Amor à flor da pele.
Durante a entrevista aos jornalistas, o diretor revelou que começou a pensar no filme em 1999, quando assistiu a um filme de Super 8 da família de Ip Man. “Eram imagens de demonstrações do estilo Wing chun, sendo que já estava casa dos 80 anos. Ele morreu três dias depois que fizeram essa filmagem”, relembrou. Vendo o filme, percebe-se fácil que The grandmaster não é uma biografia muito comum. Algumas vezes, o biografado desaparece da narração para dar espaço ao que aconteceu com outros personagens, como Gong Er (Ziyi), e Ma San (Zhang Jin), um lutador protegido pelo mestre Gong.
Para interpretar o lutador, o diretor requisitou novamente os préstimos do ator Tony Leung, com quem já fez Felizes juntos, Amor à flor da pele e 2046. De acordo com Leung, o trabalho foi fácil porque, pela primeira vez com Kar-wai, ele estava lidando com uma pessoa real. “Desta vez, eu sabia quem eu era”, disse o ator.
O repórter viajou numa parceria com o Centro Cultural Brasil-Alemanha