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Kendrick Lamar continua insaciável em 'untitled unmastered.'

Lançado de surpresa, novo álbum do rapper contém sobras de estúdio que representam seu ápice criativo

GGabriel Albuquerque
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GGabriel Albuquerque
Publicado em 05/03/2016 às 3:02
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Lançado de surpresa, novo álbum do rapper contém sobras de estúdio que representam seu ápice criativo - FOTO: Foto: Divulgação
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Kendrick Lamar é incansável. Depois de Good Kid M.a.a.d. City (2012), aclamado como um dos maiores discos da década, seguiu com To Pimp a Butterfly (2015), ambicioso álbum que capta o zeitgeist do negro contemporâneo e o clima das recentes tensões raciais nos Estados Unidos. O álbum o fez líder de indicações do Grammy, somando 11 nominações. Agora, o maior rapper da atualidade ataca novamente. Na madrugada de quinta (3) para sexta-feira (5), o rapper lançou de surpresa um novo álbum no Spotify e no Itunes.

O disco, seu quarto álbum de estúdio, chama-se untitled unmastered. (com minúsculas e ponto final mesmo) e tem oito faixas que juntas somam pouco mais de trinta minutos. Todas as músicas também levam o nome de untitled, mais a data em que foram gravadas. Conforme os títulos e a capa indicam, é um álbum de restos de estúdio, compilando material que foi gravado entre maio de 2013 e 2016 (sem mês especificado).

Duas das músicas já eram conhecidas do público e agora são enfim lançadas oficialmente. untitled 08 foi interpretada no programa The Tonight Show, do apresentador Jimmy Fallon, em janeiro, na época conhecida como untitled 2 ou Blue Faces. Alguns meses antes, Kendrick cantou Untitled, que agora foi renomeada como untitled 03, no The Colbert Report.

Mas as aparências enganam. Seria um erro tratar este novo disco como um bootleg ou CD destinado apenas para os aficcionados. Certamente não é um trabalho tão estruturado, coeso e conceitualmente amarrado quanto os álbuns anteriores. No entanto, Kendrick está voando numa fase criativa tão intensa que mesmo suas sobras são o bastante para fazer de untitled unmastered. um dos lançamentos do ano, mais interessante do que uma dúzia de outros rappers.

Lamar ficou conhecido – especialmente após Good Kid – pela sua qualidade narrativa ou storytelling, criando ou recontando fatos, personagens e locais esmiuçados nos mínimos detalhes. Somando isso ao contorno explicitamente político de To Pimp..., Kendrick foi pintado pela crítica como uma espécie líder civil engajado – “o John Lennon da era digital”, cravou um perfil da revista Época. Este novo álbum serve, também, para sair dessas imagens cristalizadas. Proporciona uma experiência poética fragmentada e permite lidar com os espaços micro da música do rapper. O Kendrick de sempre, mas com menos rótulos.

Destaque para as duas primeiras faixas, que evidenciam a problemática católica recorrente em suas letras em forma de culpa, complexo de mártir e conflitos psicológicos entre bem e mal. untitled 7 é outro ponto alto: começa com beats eletrônicos frenéticos no estilo trap, depois passa para uma atmosfera funky e encerra como jam session descontraída. Já untitled 8, com participações dos cantores Anna Wise, Bilal e Thundercat, é uma forte crítica à marginalização social do negro.

No Grammy deste ano, Kendrick era o favorito. Das onze indicações, levou cinco prêmios, incluindo Melhor Rap e Melhor Álbum de Rap. Contudo, ficou restrito ao nicho de seu gênero musical e perdeu nas categorias principais. Mas não cabe clamar por “justiça”: Lamar é maior que qualquer prêmio da indústria fonográfica. untitled unmastered. é mais uma mostra de sua inquietação e insaciedade criativa.

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