Disco

Almério passa tranquilo pelo teste do segundo disco

Bandas de pífanos e o ser humano no conceito de Desempena

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 30/03/2017 às 11:37
foto: Breno/Divulgação
Bandas de pífanos e o ser humano no conceito de Desempena - FOTO: foto: Breno/Divulgação
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Até os 20 anos, Almério morou em Altinho, sua cidade natal, no Agreste pernambucano, a 160km da capital e 35 km de Caruaru, a principal cidade da região. Desde adolescente, fazia música e cantava. Quando se mudou, seu sonho era cantar na noite caruaruense, que oferecia, obviamente, muito mais oportunidades do que na pequena cidade natal. Conseguiu um emprego numa das bancas de revistas mais frequentadas de Caruaru:

 "Diante da banca ficava o ponto de encontro dos músicos, fui conhecendo todo mundo. Conheci os compositores de Caruaru, Junio Barreto, Ortinho, Herbert Lucena, Valdir Santos, Daniel Finizola, e comecei a cantar na noite. Passei 12 anos cantando em bares", conta Almério. Terça-­feira, Desempena, seu segundo disco, aterrissou nas plataformas digitais. O disco físico está previsto para chegar nas lojas amanhã (gravado no Recife, no Estúdio Muzak). No dia 6 de abril ele faz o show de estreia no Teatro de Santa Isabel. Desempena tem selo do Natura Musical, produção e arranjos de Juliano Holanda.

 Na mesma semana que engatilhava o lançamento de Desempena, Almério pôde, enfim, anunciar sua participação, em setembro, no Rock in Rio, no palco Sunset:

 "O Rock in Rio já estava certo desde o ano passado. Não contei nem pra minha mãe, eles pediram sigilo. A história aconteceu quando fizemos o Rec-­Beat 2016, e Gutie colocou eu, Liniker e Johnny Hooker na mesma noite. Eu abri, depois teve Liniker, e em seguida Johhny Hooker. Zé Ricardo do Rock in Rio estava lá, e disse que tentaria colocar a gente. O convite aconteceu em setembro, e eu topei, eles toparam. E fechou. Sinceramente, nunca pensei em fazer o Rock in Rio. Uma alegria que não sei nem explicar. Estou tentando não pensar pra me concentrar no lançamento do disco", conta Almério, por telefone, de Caruaru, e recém-chegado do Rio, onde abriu o show do projeto O Grande Encontro ­ com Elba Ramalho, Alceu Valença e Geraldo Azevedo ­ na Fundição Progresso, na Lapa (que também foi confirmado na programação do palco Sunset, do Rock in Rio).

 Os que não conhecem a história de Almério vão achar que ele teve uma ascensão rápida. O cantor se tornou conhecido fora de Caruaru a partir de 2013, quando lançou o primeiro disco, que tem seu nome por título. Dos bares da Rua da Má Fama, ponto da boemia da cidade, passou a cantar em palcos do Recife, São Paulo e Rio:

 "Foi relativamente rápido. Vinha trabalhando há 12 anos em Caruaru. Participei da banda de pífano Zé do Estado, fiz músicas com Valdir Santos e Isabela Moraes. Uma noite, André Brasileiro me viu cantando na noite de Caruaru, conversou comigo, elogiando o show. A gente começou a se aproximar e acabamos trabalhando juntos. Mas as coisas começaram a acontecer relativamente tarde, já estou com 36 anos", comenta.

 O período em que trabalhou na noite deu-­lhe cancha para adentrar palcos com grandes plateias, como o do citado Rec­-Beat, e gravar o segundo álbum sem afobamento (em Caruaru fez também cinco anos de teatro). Depois de confirmar a vitória no Natura Musical, e receber sinal verde para começar o novo projeto, reuniu-se com o produtor André Brasileiro e Juliano Holanda para traçar o roteiro do disco:

 "Nos reunimos antes mesmo do patrocínio chegar. Juliano foi mostrando algumas canções. Mas me deixou atordoado, pela quantidade de boas canções, foi difícil escolher as músicas dele. Pra mim um disco é um livro cantado. Tem canções mais solares, canções mais à sombra. Juliano tem muita experiência em lidar com artistas e me ajudou a escolher este repertório. Já a questão técnica ficou com ele, que conhece gente, músicos, gente de estúdio. Mas tudo feito sem pressa. Ele teve extrema atenção para amarrar minhas ideias, que são muito soltas, muito intuitivas".

 CONCEITO

 Ideias que formam um conceito estético, no qual estão embutidas sonoridade e temáticas específicas, detalhadas por Almério: "O conceito sonoro extraí da identidade percussiva das bandas de pífanos, que me influenciaram muito. Quando vi a primeira vez, no São João de Caruaru, achei a coisa mais rock and roll de todos os tempos. Eles tocam com outro gás. Procurei o som da junção daquela percussão ancestral, os tambores com aquela flauta indígena, isto ficou na minha cabeça. O som do disco é cru, seco, agrestino. Filipe Moreira Sales é o cara que toca pífano e flauta no disco, ele soube captar bem isso" (além de Sales e Juliano Holanda, tocam no disco também Marconiel Rocha e Piero Biachi).

 O tema é o ser humano, uma preocupação que Almério dizer ser constante: "O tema das letras tem a ver com esta crise de humanismo. As pessoas amam os animais, mas estão com medo do próprio irmão, da própria espécie. Isso se deve também à violência. Hoje, Caruaru está mais violento do que as grandes metrópoles, é uma cidade do interior, mas você não pode sair na noite, sem seguir um jogo, vamos sair por aqui, vamos botar o carro aqui". MÚSICA

 Num disco em que o produtor enfatiza a voz do cantor, de arranjos sem muitas firulas, Desempena é a música mais antiga do álbum. Almério a escreveu quando ainda trabalhava na banca de revistas: "Fiz a música por causa de um momento com uma pessoa íntima minha, que me magoava gratuitamente. Vi que a humanidade também estava tendo esse mesmo comportamento. Usei esta pessoa para falar do que acontecia à minha volta", explica a canção escolhida para abrir o álbum.

 Ele se derrama em elogios à amiga e compositora Isabela Moraes, autora de Segredo, que teve direito ao primeiro clipe do disco (lançado na semana passada), e conta que pensou em Elba Ramalho assim que escutou Do Avesso, de Juliano Holanda: "Disse que precisava de voz de mulher para cantar comigo, e perguntei a André Brasileiro se ele podia convidar Elba (Brasileiro faz a direção musical de O Grande Encontro). Ele sugeriu que eu mandasse uma carta pra ela. Mandei, e Elba aceitou", resume Almério, que canta também os caruaruenses Valdir Santos, Thiago Martins: "A música de Martins, Queria Ter pra te Dar, entrou quando o disco estava quase pronto. Eu precisava de uma canção mais solar e ele veio com a música certa".
 
 
 
 

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