Disco

Roger Waters Atualiza Música de Protesto em Novo Disco

Trump é Inspiração e Alvo Prioritário do Roqueiro Inglês

JC Online
Cadastrado por
JC Online
Publicado em 01/06/2017 às 13:27
foto: divulgação
Trump é Inspiração e Alvo Prioritário do Roqueiro Inglês - FOTO: foto: divulgação
Leitura:

"Nincompoop" ("imbecil", "cretino"), é como o presidente americano Donald Trump é tratado na Is This the Life We Really Want?, canção que dá nome ao novo disco de Roger Waters, um dos fundadores do Pink Floyd, em carreira solo desde 1985. O álbum tem lançamento oficial amanhã. Há 25 anos, ele não lançava disco de estúdio (o último foi Amused to Death, de 1992). Um trecho de uma entrevista de Trump é reproduzida na abertura da canção. Mas o histriônico e confuso Trump não foi o único chefe de estado para o qual o ativista músico inglês apontou sua metralhadora giratória. Recentemente, em sua página no Facebook, fez uma postagem dirigida aos brasileiros, com o rosto de Temer ao lado da frase que batiza o álbum, "É Esta a Vida que Vocês Querem?"

Nick Mason, David Gilmour e Rick Wright foram fundamentais para forjar a sonoridade do Pink Floyd, um dos grupos mais cultuados da história do rock. Porém, convenhamos, assim como Syd Barrett na primeira fase do PF era a banda, depois de sua saída, Roger Waters ocupou o posto. Sem ele, inquestionável, não haveria The Dark Side of the Moon (1973), magnus opus do Pink Floyd, um dos clássicos e cânones do rock. Os discos solo de Roger Waters são confessionais e idiossincráticos. Um deles, a ópera­rock Ça Ira, que tem a revolução francesa como temática, só atraiu os fãs de carteirinha. Ele estava se lixando para vendas e público. Queria se expressar. Os fãs tomaram partido. Ficaram com o PF de David Gilmour, e só atenderam em massa aos concertos de Roger Waters quando ele voltou a tocar a música do Pink Floyd ao vivo.

Is This The Life You Really Want? é um álbum que bate forte em tiranos, políticos corruptos, destinos ecológicos, sem eufemismos, nem dispensar o baixo calão. Escapa à classificação de panfleto pelo cuidado com a música. A sonoridade é a de um Pink Floyd contemporâneo, com produção e parceria de Nigel Godrich, produtor da Radiohead, e uma banda formada por Jonathan Wilson (teclados e guitarra), Gus Seyffert (baixo, guitarra, e teclados) Joey Waronker (bateria) Roger Manning Lee Pardini (teclados adicionais), Jess Wolfe e Holly Laessig (da banda Lucius, backing vocals).

When You Were Young, a faixa inicial, lembra o início de The Dark Side of the Moon, com conversas e efeitos especiais. É uma balada que lembra similares em The Wall (1979). Picture That desenvolve­se lembrando Echoes (do álbum Meddle, 1971). Efeitos especiais pontuam o disco, que tem as faixas interligadas por vozes, ruídos. Roger Waters, o paladino por um mundo melhor (sem a carolice de Bono Vox), aos 72 anos, não tira por menos, nada nem ninguém. Até Deus é admoestado, na faixa Deja Vù: "Se eu fosse Deus/ com minha equipe e meu cajado/ se tivesse a oportunidade/ creio que teria feito um trabalho melhor". Enfim, com os infinitos superpoderes do Criador ele nos daria um mundo ideal. Por enquanto, se limita a fazer o seu melhor disco solo.

TRUMP É O ALVO

Na abertura da nova turnê, Us & Them, dia 26 de maio, em Kansas City, no Missouri, Roger Water bateu forte em Donald Trump, ao cantar Pigs (Three Different Ones), canção do álbum Animals, do Pink Floyd. Imagens do presidente americano foram reproduzidas no telão, com trechos da letra, enquanto um porco, inflável, sobrevoava o palco. Pigs (Three Different Ones), fala de "homem grande, homem porco, quase um bobo da corte". Foi uma do momentos mais aplaudidos do concerto, que teve músicas de Is This The Life That You Want? Mas irritou uma pequena parte do público, que foi embora mais cedo.
Is This the Life That You Really Want? é um disco de canções de protesto, o que não é novidade na música de Roger Waters, desde o Pink Floyd. Mas suas diatribes políticas também tinham fundo psicológico, traumas da morte do pai na Segunda Guerra Mundial (o avô foi morto na Primeira Guerra).

Ele globalizou o protesto. Em 2015, por exemplo, mandou uma carta a Caetano Veloso, tentando dissuadi­lo de fazer apresentações, em Israel, com Gilberto Gil. Caetano respondeu afirmado que não iria cancelar o show, e foi chamado de "ingênuo" numa carta tréplica do músico inglês.

O novo álbum foi inspirado em duas fontes. Uma delas, Donald Trump, que se tornou o inimigo nº 1 também dos roqueiros, e, a outra, uma peça que escrevia sobre um avô e uma neta que investigam os motivos por que crianças são mortas em terras distantes. Nem o mais furibundo eleitor democrata nutre pelo presidente dos EUA o ódio que destila Roger Waters, escancarado em faixas como Picture That, que traz versos, impublicáveis, deliberadamente grosseiros: "Picture a shithouse with no fucking dreams/ picture a leader with no fucking brains" (Visualize uma privada desprovida de sonhos/imagine um líder sem a porcaria de um cérebro).

É curioso ouvir sonoridades características do Radiohead no disco de um músico que influenciou Thom Yorke. Certamente estão ali trazidas por Nigel Godrich, que assina a produção de todos os discos da Radiohead ( ainda toca com Yorke, no projeto paralelo, Atoms for Peace). Aos 73 anos, Roger Waters continua com voz firme, de ir fácil aos tons altos. Mais do que isso, ao contrário da maioria dos medalhões dos anos 60, ele está ainda mais engajado em contribuir para mudar o mundo, ou pelo menos alertar para a teratologia de males que assolam o planeta e seus habitantes. No início da música que dá nome ao disco, escuta­se Trump dizer: "Parece a CNN, é matéria atrás de matéria, e mais matérias". Roger Waters luta para mudar o teor das matérias da CNN.

Últimas notícias