Quando conversou com a reportagem, por telefone, na última sexta-feira, 14, Ney Matogrosso não sabia os detalhes das homenagens a ele no 28º Prêmio da Música Brasileira, que será realizado nesta quarta, 19, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. "O que vai ser dito lá será tudo surpresa", conta o célebre cantor, que tem 44 anos de carreira e está prestes a completar 76 anos de vida, no dia 1º de agosto. Ney sabe quem estará na linha de frente desse tributo que revisitará seu repertório: Chico Buarque, Ivete Sangalo, Alice Caymmi, Laila Garin, Lenine, Pedro Luís, Karol Conka e BaianaSystem.
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Chico cantará As Vitrines; Ivete, Sangue Latino; Alice e Laila, Bomba H; Lenine, Bicho de Sete Cabeças II; Pedro Luís, O Mundo; Karol Conka, Homem com H; e BaianaSystem, Inclassificáveis. "Bethânia vai falar um texto de abertura", ressalta ele. "O Zé (Maurício Machline) que está organizando tudo, sei minimamente do que está acontecendo, mas vou saber mesmo de tudo na hora que eu sentar lá e assistir."
Mas Ney, claro, não estará só na plateia. Ele apresentará cinco números marcantes de sua trajetória, incluindo a inesquecível Rosa de Hiroshima (Vinicius de Moraes e Gerson Conrad), a afetiva Pro Dia Nascer Feliz (Cazuza e Frejat) e a tocante Melodia Sentimental (Heitor Villa-Lobos e Dora Vasconcellos), que terá o acompanhamento do Trio Madeira Brasil.
Homenagens, invariavelmente, fazem o próprio homenageado olhar em retrospectiva sua trajetória. E, ao mirar esse retrovisor, como Ney enxerga esses 44 anos de carreira? "Acho que fui coerente. Desde que a música se apresentou na minha vida, ela ocupou o primeiro lugar no meu interesse, e eu me dediquei exclusivamente a ela. Durante muitos anos, exclusivamente. Agora que estou abrindo para o cinema", avalia o cantor.
É que, antes de ingressar no grupo Secos & Molhados, nos anos 1970, e iniciar sua trajetória na música, Ney Matogrosso queria ser ator, fazer teatro. Pelo menos conscientemente. Mas, ao responder à pergunta feita pelo músico João Bosco a convite da reportagem, o cantor faz uma constatação interessante: quando criança, ele gostava de cantar num parque de diversões no bairro carioca de Padre Miguel, onde o artista - nascido em Bela Vista, Mato Grosso do Sul - foi criado; ou seja, ele já pensava em ser cantor na infância, mas aquela informação ficou esquecida em suas memórias por tempos.
Nos últimos anos, Ney foi intensificando sua presença no cinema. Fez Luz nas Trevas - A Volta do Bandido da Luz Vermelha, Primeiro Dia de Um Ano Qualquer, Ralé, Não Devore Meu Coração, entre outros. Ele conta que acabou de rodar dois filmes, Sol Alegria, de Tavinho Teixeira, aqui no Brasil, e Caminhos Magnéticos, de Edgar Pêra, em Portugal. "Sol Alegria é uma história de ficção, filme totalmente anárquico que adoro, me lembro um pouco de coisas dos filmes de Pasolini", descreve o cantor. "O filme português se passa num futuro bastante sombrio da humanidade, e faço um médium, mas que é um subversivo, e minha última aparição no filme é preso numa cela, falo um poema do Almada Negreiros de sete minutos, que se chama A Cena do Ódio, que é um poema maravilhoso."
Para Ney conseguir transitar entre a música e a atuação, o cinema acaba sendo um aliado. "No cinema, é mais fácil, porque dura menos. O teatro, não, porque o teatro solicita tanto quanto a música. O cinema, não: eu vou, faço no máximo um mês e está tudo resolvido." Na área musical, aliás, o cantor está há 4 anos com a turnê Atento aos Sinais, mas já planeja um novo espetáculo E, por ora, não tem um novo disco à vista.
Nova biografia
Ney Matogrosso também receberá outra espécie de homenagem no Puro Ney, espetáculo multimídia inspirado em sua trajetória musical, que vai estrear no dia 22 de agosto, no Teatro dos Quatro, no Rio. Só que, nesse caso, a participação do cantor se restringirá a projeções de suas imagens gravadas especialmente para o projeto.
Acompanhados de banda, os cantores Soraya Ravenle e Marcos Sacramento mostrarão releituras teatrais de 25 canções significativas do repertório do cantor, divididas em cinco blocos temáticos. "Minha participação é só isso mesmo, nem interferi em nada", afirma o cantor, sobre o espetáculo.
Além de estar presente nos palcos e nas telonas, o artista ganhará ainda uma biografia, de autoria de Julio Maria, do Caderno 2. Segundo Ney, a proposta do livro partiu do jornalista "Quando ele fez a da Elis Regina (Nada Será Como Antes), encontrei com ele e elogiei a biografia dela. Aí, ele me propôs um tempo depois fazer a minha. Eu não tinha nenhuma intenção de uma biografia, para falar a verdade, mas, como não se pode mais impedir, não é isso? Tudo bem, mas presta atenção para ser tudo verdade."
O cantor já foi tema de outra biografia anos atrás, Ney Matogrosso, Um Cara Meio Estranho, de Denise Pires Vaz, lançada em 1992, sobre a qual ele também comenta: "Foi feita quando eu tinha 50 anos, que eu achei muito precoce", diz. "E sinceramente a impressão não me foi agradável, de ter minha vida devassada dessa maneira."