REPRESSÃO

Violência ameaça o Mimo em Olinda

Polícia nega, mas público e produtores dizem ter sido agredidos por policiais ao final da última noite do festival

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 21/11/2017 às 10:39
Foto: Valentine Herold/Especial para o JC Imagem
Polícia nega, mas público e produtores dizem ter sido agredidos por policiais ao final da última noite do festival - FOTO: Foto: Valentine Herold/Especial para o JC Imagem
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Por volta das dez horas da noite de domingo, a produtora carioca Lu Araújo saía do camarim do músico Otto depois de passar pra lhe dar um abraço de agradecimento pelo show emocionante com o qual fechou a excelente programação do festival Mimo deste ano quando, no meio da Praça do Carmo, foi surpreendida por cenas de uma violência inesperada. "O que eu vi e vivi, jamais vou esquecer. Depois de tentar obrigar a plateia a se dispersar, os policiais correram atrás de uma garota muito jovem, frágil, de vestido vermelho, que tentava fugir pelo monte da Igreja do Carmo quando foi agarrada por eles, derrubada e agredida com vários chutes. Muito horrível tudo o que vi”, diz ela, que conta também ter sido agredida. “Não sei de onde veio, mas me atingiram também com spray de pimenta. Fiquei muito tempo sufocada”, conta ela.

Segundo depoimentos de várias pessoas nas redes sociais e da própria produtora, a polícia agiu com violência gratuita para dispersar o público. Logo após o show de Otto, um grupo de cerca de dez pessoas começou a cantar e tocar coco de roda no meio da praça. A polícia teria ordenado para que eles parassem com a música e deixassem o local. Como continuaram com a música, a PM teria iniciado a repressão. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Polícia Militar de Pernambuco nega os excessos. Em nota oficial, diz que só reagiu com força depois que populares atiraram garrafas e objetos nos policiais.

“Nós encerramos o show antes das 22h e começávamos a dispersar o público. Eu realmente não consigo entender o porque de mandar as pessoas esvaziarem a praça se nós tínhamos acordado com a polícia, a prefeitura e as demais autoridades que a praça poderia ser usada pelo evento até meia noite”, diz a produtora.

O secretário de segurança pública de Olinda, coronel Pereira Neto, estava na praça do Carmo no momento dos incidentes. Ele diz que não cabe à Prefeitura de Olinda pedir rigor nas investigações por parte da polícia para averiguar se houve ou não excesso de violência por parte da polícia. “Supomos que, se houve qualquer excesso, a própria polícia investigará”, diz ele, descartando a possibilidade de a Prefeitura Municipal de Olinda pedir, oficialmente, à Polícia Militar de Pernambuco que apure as denúncias. “As pessoas devem procurar a corregedoria da Polícia Militar”. Ele também diz que a dispersão do público por parte da polícia também é prevista em lei. "Qualquer evento público precisa de autorização para acontecer, e ali autorização era expressa para os eventos oficiais da Mimo".

Com 14 anos de atuação, o Mimo acontece em várias cidades históricas do Brasil, além da cidade portuguesa de Amarante, reunindo alguns dos mais importantes nomes do jazz e da “world music, colocando Olinda, onde foi criada, no circuito internacional de grandes festivais. A decisão ainda não foi tomada pelos produtores e patrocinadores, mas Lu Araújo diz que, caso o fato não seja apurado como esperam, há a possibilidade de o festival não voltar a acontecer em Olinda.

“Amamos Olinda e fazemos todos esforços para manter o festival na cidade. A polícia não deve um pedido de desculpas apenas ao festival, mas sobretudo às pessoas agredidas. Acredito que as autoridades irão se empenhar para apurar e coibir os excessos. De outro modo, não poderíamos manter o festival num lugar em que o público é agredido por quem deveria propor sua segurança. O Mimo gera renda e prestígio internacional para Olinda. Às vezes, acho que as autoridades precisam estudar mais para entender a importância de um festival como esse. Se não nos quiserem aqui, vamos embora. Temos várias cidades nos pedindo para realizar o festival e fazemos questão de manter em Olinda. É muito triste o que está acontecendo nesta cidade”.

VERSÃO DA POLÍCIA

A Polícia Militar nega que tenha havido excesso de violência por parte dos policiais. Por meio de nota oficial divulgada por sua assessoria de imprensa, não informa a abertura de processo de investigação e diz que os policiais agiram apenas para reprimir agressões por parte do público. “A Polícia Militar informa que a MIMO transcorreu na mais absoluta tranquilidade, de sexta-feira a domingo, na Cidade Patrimônio Cultural da Humanidade, com famílias inteiras podendo se divertir a aproveitar as apresentações do festival. Apenas um incidente foi registrado em todo o evento, quando já estava encerrado. Um homem arremessou uma garrafa de vidro contra o efetivo do Batalhão de Choque, atingindo o olho de um policial(...) durante as abordagens, um grupo se revoltou pela ação proativa do policiamento, criando um tumulto, passando a atirar objetos no efetivo. Para impedir o agravamento da situação envolvendo a multidão presente ao evento, evitando que inocentes fossem lesionados, se fez necessário o uso da força por parte do efetivo”, diz um trecho da nota.

Leia a íntegra da nota oficial do Mimo contra o ocorrido após o festival em Olinda:

O MIMO Festival repudia a atitude da Polícia Militar de Pernambuco que, após o concerto de encerramento do evento neste domingo, 19 de novembro, avançou de forma truculenta sobre as pessoas que deixavam a Praça do Carmo, entre jovens, mulheres e crianças, utilizando bombas de efeito moral e violência física.

A produção esclarece que dispõe das autorizações dos órgãos públicos (Prefeitura de Olinda, Polícia Militar, Polícia Civil e da Ciatur) para a dispersão da plateia até às 23h. O incidente ocorreu por volta das 22h.

O festival, que nasceu na cidade-patrimônio há 14 anos e é realizado com programação gratuita, dissemina arte e cultura de forma democrática. Jamais assistiu a uma situação semelhante e não compactua com esta atitude, que é contrária a tudo o que o festival representa e cultiva.

O MIMO Festival repudia qualquer manifestação de violência e repressão desnecessária e exige das autoridades uma apuração de responsabilidade deste inaceitável comportamento.

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