O Brasil tem passado por um processo conturbado nos últimos anos. De forma mais intensa, a nação está atravessando um processo de autoanálise e, ao olhar-se no espelho, tem desconstruído muitas imagens pré-concebidas que por séculos definiram o que seria sua identidade. Diante de um cenário que tem colocado em destaque aspectos lúgubres (intolerância, por exemplo), o cantor Silva buscou refletir sobre o que é ser filho dessa terra por tons mais solares, ainda que não menos críticos. Essas impressões do capixaba marcam o álbum Brasileiro, cujo repertório ele apresenta sexta-feira (31), às 21h30, no Teatro Boa Vista.
Quinto álbum de estúdio de Silva, Brasileiro vai na contramão de seus três primeiros trabalhos autorais ao se afastar dos sintetizadores e do r&b e abraçar a MPB (e o complexo guarda-chuva sonoro que a sigla representa). O trabalho começou a tomar forma após o disco em que ele explorou o repertório de Marisa Monte, lançado em 2016.
“Este é um caminho que sempre gostei, mas não trazia essas referências para as minhas músicas. Tinha medo que soasse como um cosplay de tempos antigos, talvez. Acho que fui amadurecendo e aprendi a fazer mesmo o que eu mais gosto, sem me importar com nada além de ter essa satisfação. Flertar com Marisa também ajudou a aflorar o meu lado mais brasileiro. Quando compus o disco, não pensei muito se a música seria um samba, bossa ou samba-reggae. Fui deixando as músicas saírem do jeito que elas deviam ser e esse foi o processo mais divertido que fiz até hoje”, revela.
Esse mergulho no DNA musical do País veio acompanhado de uma busca por entender o que significa ser brasileiro – pergunta para a qual ele não encontrou uma resposta (se é que ela há), mas sobre a qual procurou se debruçar.
“Quando entendi que música é feita para emocionar e comunicar ideias, eu comecei a me voltar para a música de fato, para tocar melhor, cantar com mais frequência e essas coisas todas. Isso fez minha autoestima crescer e comecei a gostar de ser o que sou, mesmo sabendo que ainda tenho tanta coisa para melhorar. E pra mim o Brasil é isso, um lugar que é tão bom que a gente ainda quer fazer alguma coisa pra ele melhorar”, reflete.
POSITIVIDADE
O tom de Silva ao longo do disco é deliberadamente positivo, talvez até como um contraponto à polarização que tem dividido o País desde as eleições de 2014. O cantor e compositor imprime em suas letras uma identidade que não idealiza o brasileiro (o homem cordial não somos nós), mas que identifica que há beleza e potência para transformar o contexto atual.
“Sou otimista, mas porque prefiro ser assim, talvez faça parte da minha natureza. Confesso que esse momento me assusta um pouco, mas acho que independente do que vier a acontecer e por mais bizarro que pareça, estou falando daquele lá que é homofóbico e eu prefiro não dizer o nome (risos), acho que a gente vai dar um jeito de evoluir, apesar disso. Espero que esse momento una mais as pessoas. Meu sonho é um país menos polarizado e com menos ódio gratuito. O negócio tá agressivo”, diz.
“Eu já me perguntei/ Como a gente vai ser brasileiro/ Não abrace o desdém/ Muita gente não gosta daqui”, canta em Nada Mais Será Como Antes, faixa na qual busca, diante do desespero, encontrar alguma esperança. Em Brasil, Brasil, ele pergunta: Onde fica o Brasil? Quem conhece o Brasil?
O repertório do show que ele apresenta no Recife será focado nas canções de Brasileiro e contará com faixas como Fica Tudo Bem, parceria com Anitta, e A Cor É Rosa, além de sucessos dos álbuns anteriores.
“Posso dizer que é um show alegre. Dá trabalho fazer um show alegre, porque você tem que estar se sentindo assim para fazer. Então, acho que esse esforço é recompensado quando alguém diz que meu show deixou as coisas mais leves. Isso é o que me deixa mais feliz”, reforça.