MEMÓRIA

Secos & Molhados, um fenômeno ainda não igualado

Caras, bocas e purpurina em plena ditadura

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 05/03/2013 às 6:15
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Em 1973, a indústria fonográfica brasileira vivia um impasse. A censura pós-AI-5 tornou-se tão voraz que a grande maioria das estrelas da MPB, grandes vendedores  na década anterior, precisavam compor o dobro de canções que cabiam num álbum, sabendo que a censura cortaria, pelo menos a metade do que submetessem ao crivo dos censores. As gravadora partiram para uma estratégia meio 171. Artistas brasileiros rebatizados com sonoros nomes como Dave Mclean,  Mark Davis, ou Michael Sullivan, cantando em inglês.

Foi em pleno apogeu dos falsos importados (como os rotulou o crítico Tárik de Souza), que explodiu o maior fenômeno musical que o país já testemunhou: o Secos & Molhados. Em uma matéria para o semanário alternativo Opinião, a então crítica de música Ana Maia Bahiana registrava que o grupo se destacava de congêneres do incipiente rock nacional que as gravadoras começavam a contratar.”Ney Matogrosso (vocais, 32 anos), João Ricardo, violões e harmônica, 24 anos, e Gerson Conrad, violões e vocal, 21 anos. Com 50 mil cópias vendidas de LP para a gravadora Continental, shows para platéias de seis mil pessoas, tournées programadas e convites profusos dos maiores empresários brasileiros”. 

Logo o trio (mais uma  banda de apoio) estaria superlotando ginásios de esportes Brasil afora (como aconteceu no Recife, no Ginásio de Esportes Geraldo Magalhães), provocando polêmicas com um clipe de O vira no Fantástico. O rebolado de Ney Matogrosso, os rostos maquiados e purpurinados de João e Gerson a ambigüidade de algumas canções (“vira, vira, vira homem/vira, vira, lobisomem”), o país nunca tinha visto tamanha ousadia.

João Ricardo Carneiro Teixeira Pinto, português, o João Ricardo, era filho de um poeta respeita, Cassiano Ricardo. Ele teve a ideia de uma grupo com o nome de Secos & Molhados ainda em 1970. O nome inspirado numa placa na de um estabelecimento comercial em Ubatuba, São Paulo. No ano seguinte, o S&MS aparece com sal primeira formação: Antonio “Pitoco” Carlos, e Fred. Uma formação que dura pouco. Entrou no grupo seu vizinho, Gerson Conrad, e Nei Matogrosso, um ator, que gostava de cantar.

Ney morava no Rio, e volta para São Paulo no final de 1972, para integrar definitivamente o Secos & Molhados.  Fazem uma temporada na Casa de Badalação e Tédio em São Paulo, em dezembro de 1972. mas continuou até o lançamento do disco uma história localizada nos circuito udigrudi paulistanos, que não chegava nem ao Rio. Na época Naná Vasconcelos, que já havia deixado o Brasil, e gravado o primeiro álbum, África Adeus, na França, voltou ao país para divulgar o disco e tentar lançá-lo pela Phillips: “Eu não sabia do Secos & Molhados. Conhecia Mutantes Equipe Mercado, A Tribo, Som Imaginário, toquei com todos mas não queria ficar em nenhum!, conta o percussionista que, certamente, só não tocou com o Secos & Molhados porque quando o grupo estourou ele já estava de volta a Europa.

Rock, desde a fase ingênua e juvenil da Jovem Guarda, nunca vendeu bem no Brasil. Nem Mutantes venderam. Assim é que a citada Maria Bahiana parecia surpreendida pelos 50 mil disco vendidos inicialmente do LP Secos & Molhados. Porém os números foram crescendo. Chegaram facilmente aos 300 mil. Acredita-se que a um milhão (a aferição então era bastante precária). Vale a pena ressaltar que o Krig-ha bandolo, o LP inaugural de Raul Seixas vendeu a então estupenda marca de 300 mil cópias.

O álbum teve todas as faixas exaustivamente executada no rádio. Empresários engalfinhavam-se para contratá-los. João Ricardo, que assumiu a liderança da banda  (tornou-se o dono da marca Secos & Molhados), refutava qualquer parentesco estético com os tropicalistas: “Eu estou mais preocupado comigo do que com Caetano”, ironizava ele uma matéria em que ambos eram citados. Recusou ate a trabalhar com Guilherme Araújo, o empresário dos baianos “Daí nosso desinteresse total em nos juntarmos a Guilherme Araújo. Nosso trabalho não em nada a ver com o grupo de Caetano, Gal, Gil”.

S&m MANIA

O LP Secos & Molhados foi gravado com uma banda formada por Gripa (flauta), John (guitarra), Willy (baixo) e Marcelo (bateria). A capa de Antonio Carlos Rodrigues e Décio Ambrósio também causou impacto (ainda hoje é incluída nas listas de Melhores Capas de Todos os Tempos). E o sucesso foi se aproximando como uma bola de neve. O lançamento oficial no Teatro Aquarius, na Rui Barbosa, em São Paulo, foi dentro do que se esperava. A temporada de 15 dias no Teatro Itália, também em São Paulo, já resvala para a histeria de fãs. E foi num crescendo, culminando com um show no Maracanazinho, que tinha tanta gente do lado de fora quanto dentro do ginásio. Foi o começo do fim.

O Secos & Molhados chegaram a se apresentar no México,. Na volta, a gravação do segundo, e derradeiro, disco de estúdio com João, Ney e Gerson. Este último faz uma análise sucinta da razão da dissolução do grupo: “- Incompatibilidade de gênios, o monstruoso sucesso... ganância... imaturidade, enfim, a somatória de tudo isso”. Ney Matogrosso, o integrante de maior visibilidade, confessou que foi difícil superar o fim do trio: “havia uma expectativa massacrante em cima de mim de todos os três Secos & Molhados, é verdade. E quem não correspondesse a essa expectativa dançava, como dançou”.

 

 

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