“Acho que está na hora de dar uma sumida”, comenta Ney Matrogrosso, quando é indagado sobre os DVDs que lançou num período de pouco mais de um ano, quatro. Dois como convidados: Infernynho - Marília Bessi convida Ney Matogrosso, e Dani Nakagawa convida Ney Matogrosso, ambos de 2013. Marília Bessy é da nova geração do rock carioca. O show Infernynho foi produzido por Rodrigo Faour. Dani Nakagawa é ator, cantor e compositor paulistano, com três CDS solo. Ambos os DVDs tem selo da Coleção Canal Brasil (o segundo também da YB Music). No mês passado saiu em DVD, o documentário Olho nu (Coleção Canal Brasil), de Joel Puzzini. Por fim, mas não menos importante, na semana passada, Atento aos sinais ao vivo (Canal Brasil/Som Livre), registro do aclamado espetáculo homônimo, com o qual Ney tem percorrido o Brasil e exterior há dois anos: “É muito, acabo sofrendo de superexposição, algo que sempre procurei evitar. Vou dar uma sumida mesmo. Uma parada estratégica”, continua o cantor. “Há quanto anos você não dá uma sumida?”. A resposta vem rápida: “Há 40 anos”.
Há quatro décadas, Ney Matogrosso surpreende em disco e no palco. Primeiro com o Secos & Molhados, um grupo em que o surrado termo “icônico” não é apenas um clichê. O S & M completou quatro décadas no ano passado, uma celebração que continua rendendo. Embora não aconteceu uma reunião do trio. Ney Matogrosso incluiu uma das canções menos conhecida do grupo no Sinais dos tempos (Amor, de João Apolinário/ João Ricardo). O Seco & Molhados foi homenageado por terceiros. A cantora Karina Buhr, por exemplo, montou um show em que intérpreta canções dos dois álbuns da banda com participação de Ney Matogrosso, que partiu para carreira solo em 1975, com o disco que tem seu nome por título : “Imagino que se o Secos & Molhados surgisse agora não haveria espaço para ele. As pessoas não têm mais abertura para aceitar o diferente. O que me espanta hoje é que os estudantes não protestam mais. É até engraçado que eu, um homem de 73 anos, fale contra o que acho errrado”, diz Ney Matogrosso que abre o show Atento aos sinais com Rua da passagem (trânsito), parceria de Lenine e Arnaldo Antunes, espécie de manual de bom comportamento no trânsito, e no relacionamento com o outro no dia a dia.
Gravado no HBSC Tom Brasil, em junho de 2014, Atento aos sinais ao vivo (Som Livre) foi dirigido por Felipe Nepomuceno, praticamente sem interferências de Ney Matogrosso: “A única coisa que pedi para ele alterar foi uma interferência em preto & branco. Na abertura, enquanto me dirijo ao palco é em preto & branco, quis que ficasse apenas este trecho assim, sem as imagens em preto & branco que há dentro do show. O DVD é o show sob a visão do diretor, os closes, as tomadas diferentes, trechos em câmera lenta. Eu gostei, não ficou apenas um registro de um espetáculo, vai além disso ”, comenta, o cantor. O repertório do DVD traz todas as 19 canções do espetaculo, que surpreendeu pelo ecletismo e variedade das fontes. Paulinho da Viola, com a pouco lembrada Roendo as unhas, a obscura Two Nayra fifty Kobos, de Caetano Veloso, com canções também pouco conhecidas de novos autores: Todo mundo o tempo todo, de Dani Nakagawa ou Samba do Blackberry, de Alberto David Continentino e Rafael Rocha (este último tem mais uma músico no DVD, Não consigo).
“Como a gente compreende o tempo. Ele é uma invenção. Não existe ontem, hoje e amanhã. O tempo é”, afirma Ney Matogrosso no início do elogiado documentário Olho nu. Em Atento aos sinais Ney volta a se maquiar (discretamente), veste um macacão justo no corpo, e destila sensualidade trocando de roupas em pleno palco. Exatamente o que fazia em Bandido, seu espetáculo de 1979. Ney desafia o tempo rebolando, desnudando-se 35 anos depois, levando às inevitáveis referências à sua idade, na imprensa: “Deve ser porque as pessoas não estão acostumadas com gente da minha idade na ativa, viajando, atuando, dirigindo automóveis. Mas com o final desta temporada agora, pela primeira vez, não tenho um novo projeto na cabeça. Acho que isto aconteceu porque eu estava com a intenção de dar uma parada, então não pensei em um novo disco”.
(leia matéria na íntegra na edição impressa do Jornal do Commercio)