Lançamento

Flaira se atira às canções em sua estreia em disco

Corações umbilicais é o CD que lança com show no Santa Isabel

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 23/01/2015 às 9:39
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Cordões umbilicais, estreia de Flaira em disco, que será lançado hoje, às 21h, no Santa Isabel, dentro da programação do Janeiro de Grandes Espetáculos, é um trabalho que trafega totalmente na contramão do que se ouve, ou se espera ouvir, hoje. Flaira é passista, aluna mais aplicada do lendário Nascimento do Passo, que se tornou tão conhecida quanto o mestre, um dos maiores da história do frevo. Ganhou fama, virou também mestra. Mas só a dança não lhe era suficiente para expressar­se. Herdou do pai, o ex­deputado petista Fernando

Ferro, a desinibição e a habilidade de boa oradora. Fala olhando nos olhos do interlocutor e não parece ter receio de confessar que fez um disco não apenas para chegar às pessoas, como também para se conhecer melhor. Um trabalho confessional e de catarse: "Sou má, sou mentirosa/ vaidosa e invejosa/ sou mesquinha, grão de areia/ malandra, fofoqueira/ moralista, interesseira/mas se eu não tiver coragem pra enfrentar meus defeitos/ de que forma, de que jeito/ vou me curar de mim", canta em Me curar de mim, em que assina letra e música.

"Sempre gostei de escrever como uma forma de organizar a minha cabeça. Estava em crise, tinha machucado o joelho. A palavra era importante para dar a vazão às outras inquietações que o corpo não supria", comenta Flaira sobre o que a levou a procurar a música como uma forma de autoanálise. Ela sabe que as pessoas que a conhecem como passista bem sucedida, de espetáculos premiados, provavelmente irão estranhar, ou mesmo desdenhar antecipadamente das suas qualidades de cantora e compositora. Ainda mais porque não fez um disco de frevos.

"Minha ligação com o frevo realmente vem de criança: faço aniversário no Carnaval. Quando eu tinha 6 anos, estava com meus pais, tiraram uma foto minha e saiu no jornal com o título de Musa mirim do Carnaval. Algum tempo depois, comecei a estudar na escola de Nascimento do Passo. Ele me estimulou bastante a aprender a dança", explica Flaira, que se tornou a passista mais conhecida de Pernambuco. Não demorou para ela ensinar a tal dança que nenhuma outra terra tem.

Flaira está desde 2012 em São Paulo, como professora do Instituto Brincante, criado e dirigido por Antônio Nóbrega. Foi naquele ano que começou a acalentar o desejo de um disco. Os amigos mais próximos, os parentes, conheciam bem a Flaira compositora e poetisa. Veio deles o incentivo para que se lançasse como cantora: "Quando fui para São Paulo levei uma grana de reserva, para caso não desse certo querer voltar. Foi a grana que usei para gravar o disco, que foi feito também com a ajuda de parentes, dos amigos. Todos projetados na epiderme da cantora no trabalho gráfico da fotógrafa, a amiga Flora Pimentel.

A música, aponta Flaira, sempre esteve muito presente em sua vida. Criança hiperativa, acha que se decidiu inicialmente pela dança, como uma necessidade física. "Eu não parava, gritava de deixar as cordas vocais com calos, dava nem para cantar". Mas a música para ela transcende ao diletantismo: "Penso que as canções nasceram de uma necessidade de exercitar a afetividade", explica.

No Instituto Brincante, ela aprendeu que a integração de canto, dança e representação não era tão difícil quanto a princípio supunha: "Foi quando desmistifiquei a ideia de que música só se aprendia parado, estudando partituras numa salinha, e passei a me interessar por ela como uma linguagem inteiramente associada ao movimento. O ritmo como vibração, o tempo como gesto, o pulso como respiração, a melodia como desenho espacial".

Flaira admite que Cordõeis umbilicais é um disco que, talvez, Freud explique, porque quanto a ela, são muitos os questionamentos: "Ô menina, o que é que você vai ser?/ atriz, cantora ou dançarina?/ o mundo te afiram o tempo inteiro/ você em que escolher ligeiro/ um código de barra pra sua vida", escreveu em Atriz, cantora ou dançarina?. "De todas as descobertas, a mais instigante foi reconhecer a minha voz. Ao longo da vida, guardei vários medos na garganta. Talvez por saber que a voz é um veículo de muitas emoções que nunca deixei sair. Cantar sempre representou um lugar de receios, julgamentos e aceitação externa." E vai além: "não tenho consciência de quando isso começou. Só sei que, ao meu ver não dá pra se esconder quando se canta. Pra mim, cantar é uma manifestação crua que revela toda força ou fraqueza de um ser humano", assume Flaira.

(leia matéria na íntegra na edição impressa do Jornal do Commercio)

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