A mansidão na voz denota calma; vez ou outra, as respostas curtas vêm para anunciar (muita) timidez. E quando recebe elogios, então, o riso acanhado entrega, de vez, que talento e modéstia caminham ao lado da cantora Isadora Melo. Mas nada que entre uma indagação e outra, não revele a existência de uma artista mais falante, pelo menos na hora de confessar o seu maior desejo: “Quero que as pessoas vejam a beleza que enxergo nas letras que interpreto. Quero me fazer entender”, ressaltou em entrevista ao Jornal do Commercio.
Uma preocupação desnecessária: a sinceridade e entrega com as quais ela interpreta no palco os compositores que, assim como ela, integram a (boa) safra da cena musical de Pernambuco é uma das maiores características do seu trabalho.
Hoje, no encerramento da temporada de janeiro do projeto Ouvindo e Fazendo Música, no Museu do Estado, Isadora mostra esse lado visceral. Um contraponto ao ‘esconderijo’ que vem mantendo por trás da voz sossegada.
O espaço nos palcos começou a ser conquistado ainda criança, nas idas despretensiosas aos bastidores artísticos, com o pai, o músico Karlson Correia e a mãe, a atriz Sônia Cristina. Na escola, passou a fazer parte das apresentações musicais e, no Conservatório Pernambucano de Música, se arriscou no violoncelo. Mas foi no passo seguinte, no curso de design, que se deparou com um cartaz “chamando” para compor o coro do >Baile do Menino Deus. Um teste de audição depois, e lá está Isadora, desde 2008, integrando o espetáculo.
Acho que posso afirmar que foi aí que tudo começou. Porque foi lá que encontrei com Rafael Marques (bandolinista) e ele me chamou para conhecer o Arabiando, grupo de choro, que precisava de uma cantora”, contou.
Um mês de ensaio e o chorinho também passou a integrar o seu currículo de cantora. “Participei de um festival em Viçosa, no Ceará, e a partir daí tudo em minha carreira começou a fluir naturalmente. Conheci uma galera do samba, de música popular e fui seguindo.”
Apesar de insistir no tom modesto, a verdade é que Isadora Melo não parou mais de “aparecer”. Com participações especiais em shows de Juliano Holanda e Zé Manoel, entre outros nomes, ela passou a marcar presença em palcos que foram além do Recife. “Fiz show em Orleans, na França, e em Lisboa. O público era pequeno, mas muito atencioso”, relata.
Quando o assunto é referência na música, Isadora volta a se “soltar”. Nada de acanhamento ao falar, por exemplo, do compositor, arranjador e instrumentista pernambucano Juliano Holanda, com quem mantém uma relação de cumplicidade nas interpretações de suas canções. “A maior parte do meu repertório é de músicas de Juliano. Um artista incrível que vai assinar a direção musical do meu primeiro disco”, confessa.
Com a palavra, então, Juliano Holanda: “Quando ela canta, as minhas músicas ficam melhores. As minhas composições ficam esperando pela voz dela”, derrama-se.
A promissora artista da Música Popular Pernambucana – é assim que alguns amigos a enxergam – também se deleita com as composições de Zé Manoel, Areia, Hugo Linns, Clara Simas e, como ela mesma define, “mais um bocado de gente massa”: Elizeth Cardoso, Cartola, Elza Soares, Jorge Mautner, Beto Vilares, Lucas Santana e Mayra Andrade.
"Apesar de não serem minhas as composições, elas falam muito de coisas que eu gostaria de falar. Eu dei muita sorte de cruzar com gente assim, tão sensível, talentosa e criadora”, vangloria-se Isadora.
PRIMEIRO DISCO
Na apresentação de hoje no Ouvindo e Fazendo Música – a estreia de Isadora no projeto – o público vai ter uma prévia do que vai ser o seu primeiro disco. Entre as novidades, está a sonoridade predominantemente acústica da produção. “Pelo formato e pelo perfil dos instrumentos, vai ser uma experimentação nova e desafiadora. Vamos gravar tudo ao vivo, em um único momento, e pouca coisa vai poder ser alterada” contou.
Isadora grava junto com Rafael Marques (bandolim), Areia (baixo), Júlio César (acordeom) e Juliano Holanda, que assume, além das guitarras e violões, a direção musical do disco. Os músicos Zé Manoel e Clara Torres fazem participação especial. “Dos nomes confirmados, por enquanto, temos os dois. Mas ainda podem surgir outros”, revelou.
A ideia é que o trabalho seja lançado ainda este ano. Na programação, uma série de ensaios deve compor a agenda da cantora, que prospecta o show de lançamento para o final do segundo semestre. “Não quero muito pensar lá na frente. Apesar de estar bem curiosa do que vai ser este ano para mim.”
Enquanto os novos sons de Isadora não ressoam por aí, ela consolida, mais uma vez, a boa música que faz. No Museu do Estado, hoje à tarde, o palco é dela e de Areia e Rafael Marques, com participações das cantoras Clara Torres e Ylana Queiroga.
Curta algumas interpretações da cantora Isadora Melo: