Bossa Nova Pernambucana

João Gilberto no início, quando se enturmava e visitava amigos

Normando e João varavam madrugadas em papos sobre música

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 08/10/2016 às 9:08
foto: reprodução/arquivo Normando Santos
Normando e João varavam madrugadas em papos sobre música - FOTO: foto: reprodução/arquivo Normando Santos
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O cantor e violonista Normando Santos conheceu o baiano João Gilberto no final dos anos 50 no Rio de Janeiro, na época em que ele gravou Chega de Saudade, e ainda era de andar em turma e de visitar os amigos. Aqui o bossanovista recifense conta um pouco sobre seu relacionamento com João naquela época:

"Quando conheci João Gilberto, ficamos muito ligados. Ele passava com freqüência no meu apartamento, que ficava estrategicamente no meio de Copacabana, em cima de um restaurante chamado Sphaguetilândia. João aparecia quase sempre depois da meia-­noite e ficávamos conversando até de manhã, e muitas vezes ele acabava ficando pra dormir. Ficava meio zangado quando chegava e eu não queria bater papo. Isso acontecia quando eu tinha que dar aula aos meus alunos de violão às 9h da manhã.

Ele dizia que eu vivia agarrado com o relógio, e eu respondia sempre que ele era irresponsável, e que eu, no fim do mês, teria que pagar meu aluguel. Mas eu gostava muito quando João aparecia. Muitas vezes vinha da casa do Tom (Jobim) trazendo músicas acabadas de serem feitas, e que mais tarde se tornariam sucesso no mundo inteiro, e que ocupam até hoje uma boa parte do meu repertório. Conversávamos muito sobre a importância de saber respirar quando cantamos, e tanto treinamos que eu acabei cantando Saudade Fez um Samba, do Carlinhos Lyra, com um fôlego só. Utilizei muito em meus shows quando tenho certeza que o público conhecia a música, pois sem treino poucos chegam até a metade! Valia como uma brincadeira. Hoje eu ainda consigo chegar até o fim, mas aquela voltinha do final, eu não consigo mais dar, tudo tem limite!

O PATO

Lembro muito bem do João ensaiando O Pato de frente para o ângulo da sala, para obter melhor retorno do som. Ele cantava: "O pato"... Só isso, e repetia "O pato" e repetia "O pato"... Depois me dizia: "Tá vendo Normando? Não é "O pato", é: O pato." E eu respondia que só ele sabia da diferença entre "O pato", e, "O pato". Mas o importante não era que eu soubesse a diferença, pra mim o importante era que ele sabia! Quando ele apareceu com aquela batida eu lhe pedi para me mostrar como era e ele me mostrava, mas não adiantava nada porque eu não entendia, eu escutava, prestava bem atenção e não conseguia entender onde começava e onde era o fim. O que era evidente pra ele, não era pra mim. Passaram­se dias e dias e eu matutando... Aquele som estava na minha cabeça, eu podia quase vê­-lo, mas a minha mão não obedecia. Desde que matutando um bocado de tempo, estava tudo pronto na minha cabeça só faltava à fórmula!

Não era só eu acertar fazer aquele balanço como o João, eu tinha é que saber como transmitir aos meus alunos! Para mim isso era o mais importante. Como professor João era um nulo, mas como criador era um gênio! Daí eu tive a ideia de seccionar o que estava na minha cabeça, primeiro preenchendo um compasso e depois dois. Eureca! Encontrei a fórmula. Essa era naturalmente a base, o resto você balança como sente de acordo com a música. Meus alunos recebiam aquele balanço todo mastigado e sem dificuldade até o momento de cantar e de se acompanhar ao mesmo tempo... Porque aí eram outros 500! Aí a coisa se complicava já que enquanto a mão balança de um jeito a boca está dividindo outra coisa.

Hoje em dia pra falar com João é um cinema! Ele não atende telefone. Uma vez de visita ao Rio, liguei pra ele, dizendo que queria visitá-­lo. Ele me disse: "Você telefona pro Antonio (o porteiro do prédio, e pernambucano!). Antonio telefona pra mim e eu telefono pra você! Tive com ele algumas vezes, mas antes de ele ser pai da última criança.

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