Até o dia 31 de outubro deste ano, brasileiros que possuem recursos de origem lícita não declarados no exterior até dezembro de 2014 podem regularizar a situação junto à Receita Federal. Segundo estimativas de analistas, há R$ 200 bilhões de ativos legais fora do País. A medida é uma forma de tentar trazer de volta dinheiro deixado nos famosos paraísos fiscais – países ou regiões autônomas que oferecem condições favoráveis de investimento a empresas. Por exemplo, tributação inexistente ou inferior a 20% sobre a renda, segundo a Receita Federal, além de sigilo absoluto.
Entre as 64 localidades nessas condições mapeadas pela receita, estão Bahamas, Ilhas Cayman e Panamá. Apesar da fama dessas localidades em ocultar recursos ilegais, enviar dinheiro para paraísos fiscais não é considerado um crime, desde que o dinheiro seja declarado corretamente.
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As condições especiais oferecidas pelos paraísos fiscais viabilizam a criação de empresas ou contas bancárias chamadas offshores, que significa distante da costa. Recebem este nome porque pertencem a pessoas sem ligação com o local e que estão em busca de vantagens. Isso gera concorrência desproporcional e fuga de recursos. De acordo com o relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), multinacionais de 26 países desenvolvidos tiveram mais lucro em Bermudas (US$ 43,7 bilhões) que na China (US$ 36,4 bilhões) em 2014.
Os paraísos fiscais conseguem oferecer benefícios atrativos, em geral, por causa da estabilidade econômica e política do país ou região. Em troca, o investimento das offshores também os beneficia. “Os paraísos fiscais fazem de tudo para facilitar a abertura de empresas. A tributação feita é sobre a movimentação financeira. Eles se beneficiam de outra forma, com a atuação de muitas empresas e bancos captadores de recursos, que investem, constroem e geram empregos”, afirma o professor de economia internacional da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Écio Costa.
Enquanto isso, no Brasil, a burocracia é maior. No ranking Doing Business 2016, que avalia a facilidade de fazer negócios em cada país, o Brasil figura na 116ª posição. São avaliados vários quesitos, como alíquota de impostos sobre os lucros. Em São Paulo, o valor é de 69%. Enquanto a alíquota das Bahamas, no 108º lugar, é de 33,7%. Cingapura, o lugar mais fácil para fazer negócios, tem 18,4%.
O programa de repatriação de recursos é a última chance de contribuintes irregulares serem perdoados. “Até 2018, mais de 130 países trocarão informações entre si sobre transações financeiras. Quem não declara está sonegando. A tendência é que o sigilo acabe, os contribuintes irregulares sejam identificados com facilidade e iniciados processos criminais contra eles. Vários países estão incentivando a repatriação”, comenta o tributarista e professor titular de direito financeiro da USP, Heleno Torres.
REMESSA
Os interessados em repatriar recursos lícitos no exterior e regularizar a situação junto à Receita Federal precisam correr. Para receber a anistia, o contribuinte precisará empreender um processo que envolve a contratação de um advogado especializado e o pagamento de 15% de multa e 15% de Imposto de Renda sobre o valor no exterior até dezembro de 2014.
O primeiro passo é apresentar a Declaração de Regularização Cambial e Tributária (Decart) em formato eletrônico e, em seguida, pagar os tributos. “Depois, o contribuinte emite a guia junto à Receita Federal. A situação só será considerada regularizada após o pagamento dos tributos. O governo também exige que sejam declarados os valores consumidos no exterior até dezembro de 2014”, explica a advogada de Direito Empresarial Camila Oliveira.
Desde que o contribuinte faça a declaração de recursos enviados ao exterior de forma correta, não há motivos para ficar preocupado. Caso ele deseje aplicar recursos em paraísos fiscais, dependendo do motivo escolhido e da razão declarada, a taxa incidente sobre a remessa é de até 25%.
Antes de enviar, o contribuinte precisa informar ao Banco Central o que vai fazer. “O Banco Central vai analisar o caso para que não ocorra fuga de recursos do País. Depois de pago, se a pessoa quiser trazer o dinheiro de volta, não terá que pagar nenhum imposto. Porém, se tiver rendimentos no exterior com a venda vantajosa de um imóvel ou de ações, vai ter que declarar no Imposto de Renda”, afirma o advogado tributarista Rodrigo Accioly.
Em outras situações, como remessas de valores para cobrir gastos pessoais no exterior, a alíquota é de 6% para valores de até R$ 20 mil. Se ultrapassado esse montante, incide a alíquota de 25%. Já remessas para fins educacionais ou para cobertura de despesas médicas estão isentas.