Fiscais do Trabalho de pelo menos oito Estados decidiram parar após a edição da portaria que modifica as regras de combate ao trabalho escravo. Eles afirmam não saber que norma aplicar: a que estava em vigor até o início desta semana ou a nova, que consideram insustentável pelas falhas técnicas e jurídicas que contém.
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A insegurança jurídica fez parar as fiscalizações em São Paulo, Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul, de acordo com informações do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait). O Ministério do Trabalho disse não ter recebido "nenhuma informação oficial sobre a paralisação de auditores."
Um dia após sua edição, era grande a pressão contra a Portaria 1 129. O Ministério Público e o Ministério Público do Trabalho recomendaram ao ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, que revogue a norma. Segundo analisaram os procuradores, ela contraria leis como o Código Penal, duas convenções da Organização Internacional do Trabalho, decisões do Supremo Tribunal Federal e a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Num choque com o comando da Pasta, o secretário substituto de Inspeção do Trabalho, João Paulo Ferreira Machado, orientou os auditores a, na prática, ignorar a portaria e informou que pedirá ao ministro sua revogação, dada a quantidade de falhas técnicas e jurídicas.
Pelo menos dois projetos de decreto legislativo foram apresentados para revogar a portaria: um de autoria do deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) e outro do deputado Roberto de Lucena (PV-SP). O senador Paulo Paim (PT-RS) disse que a Comissão de Direitos Humanos do Senado fará requerimento para que o ministro explique a portaria e a revogue.
Apesar da reação, o presidente Michel Temer estava ontem disposto a manter a portaria. Uma eventual revogação da medida poderia indispor Temer com a bancada ruralista, às vésperas da votação da denúncia contra ele na Câmara dos Deputados. A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que reúne deputados e senadores ruralistas, já afirmou que a norma vem ao encontro de pautas da bancada.
Apesar disso, auxiliares reconheceram que a norma pode ser revogada, caso a pressão aumente. Recentemente, o presidente recuou da extinção da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca).
Um interlocutor do presidente comentou que a reação negativa decorre da "incompreensão" do que pretende a norma, que é dar mais segurança aos fiscais no exercício de suas funções. Em nota, o Palácio do Planalto afirmou que somente o Ministério do Trabalho se pronuncia sobre o teor da portaria.
Retrocesso
A ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, afirmou que a portaria não pode passar por cima do Código Penal e da Constituição. "O trabalho escravo é destruidor e quem pratica esse tipo de crime não pode ficar impune", disse. Afirmou que, se tivesse sido ouvida sobre a decisão, se posicionaria contra. "Não podemos retroceder em nenhuma área, muito menos na escravidão", ressaltou. Luislinda afirmou que pretende conversar com Temer sobre a portaria.
O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, divulgou na rede social uma nota de apoio à portaria, parabenizando o presidente e o ministro Ronaldo Nogueira. Segundo avaliou, a portaria dá critério às fiscalizações. Também a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic) apoiou a portaria.
Segundo a entidade, a norma fecha "brechas que induzem a má aplicação da legislação em vigor".
Questionado sobre a recomendação do Ministério Público e da própria área técnica, o Ministério do Trabalho reafirmou sua posição sobre a portaria: que ela aprimora e dá segurança jurídica à ação do Estado no combate ao ilícito. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.