INVESTIMENTOS

Com PIB menor e mais incertezas, indústria suspende investimentos

A expectativa era que o investimento fosse 1,2% maior que em 2017, mas esse número já caiu em 0,4

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Publicado em 19/06/2018 às 12:12
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A expectativa era que o investimento fosse 1,2% maior que em 2017, mas esse número já caiu em 0,4 - FOTO: Foto: Heudes Regis/JC Imagem
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A constatação de que a economia deve crescer menos do que o esperado fez os empresários da indústria cortarem investimentos previstos para este ano. A greve dos caminhoneiros, que tirou quase 15 dias de faturamento das empresas, ampliou as incertezas no mercado interno, que já embutiam o risco eleitoral. As pressões externas, que culminaram com a alta do dólar, também aumentaram as preocupações do setor.

Duas pesquisas revelam que, nas últimas semanas, os empresários ficaram receosos em prosseguir com investimentos que levassem a aumento de produção, diante de uma ociosidade entre 25% e 30% nas fábricas. Na semana passada, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) cortou a projeção de investimento do setor para este ano. Em março, a expectativa, baseada na consulta a 442 empresas, era de que seria investido 1,2% mais do que em 2017. Agora, a estimativa é de queda de 0,4% ou R$ 503 milhões a menos. Com isso, o aporte total deve ser de R$ 117,3 bilhões. "O grande problema foi a redução da projeção do PIB e a greve", afirma o presidente em exercício da Fiesp, José Ricardo Roriz Coelho.

Outra pesquisa mostra que os empresários da indústria começaram a segurar os investimentos antes mesmo da greve. O Indicador de Intenção de Investimentos da Indústria do segundo trimestre, apurado pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV com cerca de 700 empresas em abril e maio, caiu 7,6 pontos em relação ao primeiro trimestre. O resultado é quase o mesmo do fim de 2017 e está abaixo da média registrada antes da recessão de 2014. "É um sinal preocupante porque 95% das indústrias foram consultadas antes da greve, que adicionou mais incertezas", diz o superintendente de Estatísticas Públicas da FGV/Ibre, Aloisio Campelo Jr.. Se a apuração tivesse ocorrido na época da greve, ele acredita que o resultado seria pior.

Efeitos

A retração de aportes da indústria afeta o investimento total da economia. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) projeta para este ano aumento de 4,5% da Formação Bruta de Capital Fixo, que mede o investimento. Seria o primeiro avanço desde 2013. Segundo o diretor do Ipea, José Ronaldo de Castro Souza Júnior, diante das incertezas, a alta deverá ser menor. "Os efeitos de se investir menos são perda de renda e de crescimento do PIB e a redução na capacidade de produção", diz Souza Júnior. Além disso, acrescenta Roriz Coelho, sem investimento em modernização, a produtividade cai e o País fica ainda mais distante de competidores globais.

Para o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, Rafael Cagnin, investimento em pesquisa e desenvolvimento, por exemplo, deveria ser contínuo, e interrompê-lo significa que talvez não possa ser resgatado. Segundo ele, grandes investimentos estão fora do radar e a retomada só deve ocorrer após a eleição. 

Greve de maio tirou fôlego da indústria

Na virada do ano, o empresário Fernando Antonio Gomes Martins, dono de uma fábrica de parafusos, esperava investir R$ 6 milhões no negócio em 2018. Ele já imaginava as dificuldades de um ano eleitoral, mas não previa tanta indefinição. "A greve dos caminhoneiros foi só a gota d'água, uma gotinha no maremoto que pode vir por aí", diz. Com a realidade se mostrando bem diferente do que as previsões, ele decidiu cortar R$ 2 milhões e antecipar as férias coletivas dos funcionários para adequar a produção à demanda menor.

A Continental Parafusos é uma indústria de médio porte que fornece para montadoras e fabricantes de eletrodomésticos. "Para alguns segmentos, a venda recuou 10% e não sei se vamos conseguir tirar a diferença", diz. Da previsão inicial de R$ 6 milhões, metade seria investida em máquinas e equipamentos para aumentar a capacidade e o restante em gestão e inovação. Agora, o aporte será de R$ 4 milhões. Os R$ 2 milhões que seriam para aumento da capacidade vão ser adiados. "Ficamos com investimentos em produtividade, eficiência energética e gestão." Após ter perdido duas semanas de vendas com a greve, a empresa tem hoje uma ociosidade de 40%, o dobro em relação ao final de 2017. "O grande problema é a taxa de crescimento da economia, que não aumenta."

Consenso

O problema enfrentado por Martins afeta a indústria em geral. "Como as empresas vão faturar menos e a ociosidade é maior, elas vão tirar o pé dos investimentos", diz o presidente em exercício da Fiesp, José Ricardo Roriz Coelho.

No setor têxtil, por exemplo, a última sondagem, feita em abril e maio, mostrava que 80% das empresas tinham intenção de investir mais ou o equivalente ao ano passado, ou seja, de 4% a 5% do faturamento, diz Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção. "Mas o humor piorou com a greve, o solavanco cambial e o risco de o País crescer menos", diz ele.

No setor de calçados, que opera com 70% de sua capacidade instalada e emprega 288 mil pessoas, a maior parte dos investimentos contemplados são de reposição de equipamentos. "Investimentos em expansão e inovação na manufatura são casos isolados", diz o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados, Heitor Klein.

"O investimento na indústria química está muito abaixo do necessário", diz Fernando Figueiredo, presidente da Associação Brasileira da Indústria Química. Serão R$ 2,6 bilhões ante R$ 3,8 bilhões em 2017. Na média, as cerca de 3 mil empresas usam 74% da capacidade.

A última pesquisa feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), entre abril e maio, mostrava que 81% das empresas tinham intenção de investir neste ano, ante 67% em 2017 e 64% no ano anterior. Flávio Castelo Branco, gerente executivo de Políticas Econômicas, não sabe se o indicador será mantido na próxima consulta.

"O cenário mudou; os juros americanos aumentaram e isso bate no nosso câmbio", diz. "Ainda tivemos a greve, que mostrou um ambiente político fraco para negociações e uma insegurança jurídica forte - ambiente que não favorece investimentos." Para João Marchesan, da Abimaq, a falta de projetos terá reflexos no futuro. "O investimento de hoje é o crescimento de amanhã".

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