O desembargador Souza Ribeiro, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), derrubou a liminar da 24ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo que impedia, temporariamente, o processo de transferência da Embraer para a Boeing. Para o magistrado, a ação popular foi “precipitada, infundada e carente de demonstração de qualquer vício de legalidade da operação negocial em andamento”.
No entendimento do desembargador, a negociação ocorre “entre duas empresas privadas, que operam segundo os princípios da livre iniciativa e liberdade negocial, não se vislumbrando afetação a interesses públicos e nem restrições advindas de normas jurídicas em geral, constitucionais ou legais, de forma que se mostra incabível qualquer interferência do Poder Judiciário em tais ajustes que destoe do controle da legitimidade dos atos praticados”.
O desembargador destacou ainda que por ser uma operação muito complexa, a negociação já está cercada de um acompanhamento rigoroso por parte de vários órgãos públicos como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o que implica em “incontáveis regras de compliance e da legislação comercial, tanto observando normas de direito interno como as normas de órgãos internacionais”.
Ele também observou o fato de haver a ação de classe especial (golden share) na qual é estabelecido que a União tem o poder de veto na operação (art. 17, §7º, Lei das S.A), caso se identifique a possibilidade de algum dano ou prejuízo aos interesses públicos, no exercício de seu poder discricionário.
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Doutrina Chenery
O magistrado citou ainda o precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em torno da Doutrina Chenery, em que ficou evidenciado que o Poder Judiciário não tem a expertise técnica necessária para avaliar as consequências econômicas e políticas de uma decisão que tange ao mérito administrativo.
Ele argumentou ainda que a invasão do Judiciário na autonomia privada das partes causa insegurança jurídica, o que gera reflexos no mercado nacional e internacional, lembrando que no dia do anúncio da liminar, na semana passada, as ações da Embraer caíram quase 3%, resultando em “prejuízo de milhões e milhões à referida companhia”.
De acordo com o relato, tais operações envolvem uma agenda rigorosa e planejamentos rígidos, sendo que uma suspensão pode além dos prejuízos levar à até uma desistência do negócio. O magistrado observou também que a operação está ainda nas fases iniciais de um complexo procedimento e que qualquer decisão do Conselho Deliberativo da Embraer não é final e definitiva e será submetida ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
“Mostra-se descabido obstar um procedimento tão complexo sem que se tenha neste momento processual qualquer elemento concreto de práticas ilícitas e sem que os interessados se manifestem sobre os questionamentos trazidos na ação popular, o que produz inegavelmente inúmeros prejuízos à tramitação regular da operação e também aos interesses econômicos das partes interessadas, não somente pelos atrasos provocados nos expedientes exigíveis segundo a normatização legal, como também prejuízos econômicos advindos do óbice à livre atuação no mercado e, especialmente, pela própria insegurança jurídica advinda de uma intervenção judicial precipitada e infundada”, justificou.
Ação popular
A ação popular contra a negociação havia sido articulada por um grupo de parlamentares do PT como Paulo Pimenta (RS) e Carlos Zarattini (SP). O acordo em andamento entre as duas companhias prevê a criação de uma nova companhia, uma joint venture no termo do mercado, na qual a Boeing teria 80% e a Embraer, 20%. Caberia à Boeing, a atividade comercial, não absorvendo as atividades relacionadas a aeronaves para segurança nacional e jatos executivos, que continuariam somente com a Embraer. Hoje o governo brasileiro possui uma participação qualificada na empresa, por meio daquilo que se denomina no mercado de golden share, uma ação especial que dá mais controle ao seu proprietário.