Em sua última entrevista coletiva na Casa Branca, nesta quarta-feira (18), o presidente Barack Obama defendeu as decisões adotadas nos últimos dias de seu governo, falou de temas sensíveis e fez um balanço de seu legado, além de dar conselhos ao sucessor, Donald Trump.
Hoje, Obama disse que é do interesse dos Estados Unidos ter laços construtivos com a Rússia, mas reconheceu que a relação retornou a um espírito de confronto com a volta de Vladimir Putin à Presidência.
"Acho que é do interesse dos Estados Unidos e do mundo que tenhamos uma relação construtiva com a Rússia. Este tem sido o meu enfoque ao longo da minha Presidência", declarou Obama, às vésperas da posse do republicano, nesta sexta-feira (20).
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Obama contou que, nos oito anos de sua Presidência, pediu à Rússia que tivesse um papel "construtivo" no mundo e tentou colaborar com o Kremlin.
Ele ressaltou que, após a volta de Putin à Presidência, em 2012, uma crescente "retórica antiamericana" e um "espírito confrontador", que evocava a Guerra Fria, "tornaram a relação mais difícil".
Em um momento delicado pela situação na Ucrânia e na Síria, Washington e Moscou aprofundaram sua desconfiança mútua após as acusações da Inteligência americana sobre a interferência russa na eleição presidencial. Enquanto o governo em final de mandato e a comunidade de Inteligência se mantêm muito críticos em relação a Moscou, o próximo presidente dos EUA, Donald Trump, manifestou seu ceticismo quanto a essas acusações.
Os Estados Unidos impuseram sanções econômicas a pessoas próximas a Putin, após a invasão russa à Crimeia. Recentemente, devido às revelações de ciberpirataria nas eleições americanas, essas sanções foram ampliadas.
Obama também criticou Putin por se negar a aprofundar os compromissos sobre a redução de armas nucleares (START). De qualquer modo, o democrata deu a Trump o benefício da dúvida de uma nova relação com Moscou.
"Se o presidente eleito Trump conseguir reiniciar essas negociações de uma maneira séria, acho que resta muito espaço a ambos os países para reduzir nossos arsenais nucleares", disse Obama.
Gestos de última hora
Entre as medidas adotadas no apagar das luzes, está o fim da política "Pés Secos, Pés Molhados", que beneficiava imigrantes cubanos, e a comutação da pena da ex-soldado Chelsea Manning, que vazou milhares de documentos confidenciais ao site WikiLeaks.
O democrata lembrou que Estados Unidos e Cuba mantiveram "duras" negociações que permitiram a Washington pôr fim à política de "Pés Secos, Pés Molhados" para os imigrantes cubanos, mas conseguiram uma normativa "justa e apropriada".
Essa política era "um vício de uma antiga forma de pensar que não fazia sentido nestes dias e nesta era", disse Obama, acrescentando que os dois países alcançaram "uma política (migratória) que penso que é justa e apropriada para a natureza mutável da relação" bilateral.
A política de "Pés Secos, Pés Molhados" permitia aos imigrantes cubanos que chegassem ilegalmente ao território americano se beneficiar de um trâmite acelerado para obter o visto de residência permanente. Aqueles que fossem interceptados no mar eram devolvidos para Cuba.
Com essa política, ressaltou Obama, os Estados Unidos tratavam "os imigrantes cubanos de forma completamente diferente de pessoas de El Salvador, ou Guatemala, ou Nicarágua".
De acordo com o presidente, essa transformação deve ser vista como parte de uma "mudança monumental" nas relações entre os dois países.
O presidente também justificou sua decisão de comutar a pena de Chelsea, alegando que já cumpriu parte importante da sentença.
"Sejamos claros: Chelsea Manning já cumpriu uma dura sentença na prisão", disse o presidente, avaliando que a condenação de 35 anos era "desproporcional" em relação a outras sanções em crimes similares.
"Sinto que se fez justiça", apontou.
Na mesma coletiva, Obama também se referiu à situação dos imigrantes em geral no país, estimando que expulsá-los seria uma violação dos "valores medulares" dos Estados Unidos.
"Há uma diferença entre o funcionamento normal da política e certos temas onde nossos valores medulares podem estar em risco (...) Ponho nessa categoria os esforços institucionais de silenciar o dissenso e a imprensa, e de deportar garotos que cresceram aqui e que, na prática, são americanos".
Esses jovens filhos de imigrantes em situação irregular, mas que nasceram e foram criados nos Estados Unidos "amam este país, são amigos dos nossos filhos, estão agora ingressando nas universidades e, em alguns casos servindo nas nossas Forças Armadas", acrescentou o presidente.
Tensão insustentável no Oriente Médio
Hoje, Obama também advertiu que a continuidade da tensão entre israelenses e palestinos é "insustentável", além de ser perigosa para todas as partes envolvidas.
"Estou preocupado, porque penso que o 'status quo' é insustentável. É perigoso para Israel, é ruim para os palestinos e é ruim para toda a região, e é ruim para a Segurança Nacional dos Estados Unidos", alertou.
Segundo ele, a prioridade é "preservar a possibilidade de uma solução de dois Estados".
"Não vejo outra alternativa. E disse isso ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu (...), porque, se não tivermos uma solução de dois Estados, de alguma forma estaremos estendendo uma ocupação".
Para Obama, "o aumento dos assentamentos está criando uma realidade no terreno que gradualmente torna impossível a solução de dois Estados".
E, sem essa solução, completou, "não vejo de que forma Israel continue sendo ao mesmo tempo judeu e uma democracia".
Obama lembrou que seu sucessor, Donald Trump, "terá sua própria política" para essa região, mas lhe advertiu sobre os riscos de promover "mudanças unilaterais" em um "ambiente volátil".
"Obviamente, é uma situação volátil. Vimos no passado que, quando há bruscos movimentos unilaterais, que afetam temas centrais e sensibilidades, isso pode ser explosivo", manifestou.
Segundo Obama, se alguém quiser fazer grandes mudanças de política, é necessário "pensar muito bem e entender que haverá consequências e que ações geram reações (...) Ninguém quer fazer coisas subitamente em um assunto tão volátil quanto esse".
Sobre seu futuro imediato, Obama contou que pretende dedicar tempo "a escrever, quero ficar quieto por um tempo sem me ouvir falar tanto. Quero passar tempo com minhas filhas".
No final, em sua derradeira mensagem aos americanos, prometeu: "tudo ficará bem".