A Alemanha iniciou nesta quarta-feira (22) o processo para reabilitar e indenizar os cerca de 50.000 homens condenados por homossexualidade com base em um texto nazista que seguiu em vigor depois da Segunda Guerra Mundial.
"A reabilitação dos homens que foram levados ante os tribunais por sua homossexualidade deveria ter sido feita há muito tempo", declarou em um comunicado o ministro da Justiça, Heiko Maas, depois da adoção de um projeto de lei sobre este tema no conselho de ministros.
"Foram perseguidos, castigados e desonrados pelo Estado alemão apenas por seu amor por outros homens", acrescentou o ministro social-democrata, que, para apresentar seu texto, teve de perseverar com empenho ante as reticências da ala conservadora do partido da chanceler Angela Merkel, durante meses de negociações.
O texto ainda tem de ser aprovado pelo Parlamento. Ele estabelece 3.000 euros de indenização por condenação e 1.500 euros por cada ano de prisão. Além disso, o governo investirá 500.000 euros por ano em uma fundação especializada em memória deste tema.
Estigma
"Os homossexuais condenados não têm de sofrer mais este estigma, que, em muitos casos, destruiu sua trajetória profissional e sua vida", enfatizou o ministério da Justiça.
Esta iniciativa acontece meses depois do anúncio de uma lei similar na Inglaterra e em Gales, apesar de nesses casos o texto só se aplicar aos falecidos. A Escócia, no entanto, anunciou que também gostaria de reabilitar os homens atingidos ainda em vida.
Durante 122 anos, de 1872 até sua revogação, em 1994, o artigo 175 do código penal alemão castigava com penas de prisão "os atos sexuais contra a natureza (...), sejam entre homens de sexo masculino ou entre homens e animais".
As penas foram intensificadas em 1935 por uma emenda nazista que estabelecia até dez anos de trabalhos forçados para os réus. Mais de 42.000 homens foram condenados por esta causa durante o Terceiro Reich, enviados à prisão e a campos de concentração.
Mas o artigo 175 foi mantido depois da guerra, convertendo-se durante décadas no único vestígio legal das perseguições nazistas e levando a 50.000 novas condenações sob a jovem democracia da Alemanha Ocidental.
"Eram perseguidos, expulsos de seus trabalhos, interrogados por seus colegas, seus amigos e pelos membros de suas famílias", recordou recentemente o jornal Süddeutsche Zeitung, que definiu a situação como "uma morte social".
Vários condenados explicaram à imprensa a tragédia de levar uma vida incompleta e o medo constante de serem perseguidos por seus amores clandestinos. Ao ponto de, segundo o Süddeutsche Zeitung, depois da guerra, ocorrerem uma série de castrações voluntárias.
Comportamento descontrolado
"Tínhamos um pé na latrina e outro na prisão", recorda "Fritz", na revista gay Siegessäule, lamentando não ter podido se desculpar com um de seus amantes, condenado a sete anos e meio de prisão, enquanto ele, por ser menor na época, ficou detido apenas algumas semanas.
Os julgamentos por homossexualidade foram realizados até 1969, quando o artigo 175 voltou a sua versão anterior a 1935. Na Alemanha Oriental, esse artigo foi restabelecido automaticamente em sua primeira versão e depois foi suprimido em 1968.
Em 1957, a Corte Constitucional alemã continuou atribuindo aos homens homossexuais um "comportamento sexual descontrolado", sinônimo de perigo social, assegurando, em compensação, que as mulheres homossexuais eram "mais passivas".
Para a comunidade homossexual na Alemanha, a anulação das condenações representa mais um passo para seu reconhecimento. Outra reivindicação, mais atual, é a do matrimônio entre pessoas do mesmo sexo, que continua proibido por lei.
O Partido Social-Democrata decidiu militar a favor disso nas próximas eleições legislativas, em setembro, frente ao partido da chanceler, cuja ala na Baviera, mais conservadora nesses temas, se opõe a isso.