Se para os países ocidentais a responsabilidade do presidente sírio no "ataque químico" não dá margem a dúvidas, os especialistas questionam as razões sobre o que teria motivado a ação.
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Em um solene discurso televisionado, o presidente americano, Donald Trump, explicou que Damasco estava "diretamente vinculado" aos fatos "horríveis" de terça-feira em Khan Sheikhun, onde pelo menos 86 pessoas, entre elas 27 crianças, morreram em um bombardeio aéreo.
As imagens das vítimas agonizantes, cujos sintomas eram parecidos aos constatados em vítimas de ataques químicos segundo médicos no terreno, comoveram o mundo.
Para o analista Salman Shaij, que dirige um grupo de consultoria que leva seu nome, a responsabilidade de Bashar Al Assad é inegável, "pois não se trata de um ato isolado, o regime já cometeu (ataques químicos) em várias ocasiões".
Segundo ele, "altos funcionários militares do regime, como Maher Al Assad e Ryad Majluf, disseram que não sabiam de nada sobre o ataque". "Sabemos que nas vezes anteriores (o regime) fez vários testes para ver se (os ocidentais) reagiriam", explicou à AFP.
Desde que o conflito começou há seis anos, os países ocidentais pediram repetidas vezes sanções contra Damasco, em vão pelo veto da Rússia, mas nunca haviam atacado, nem mesmo depois do ataque químico da periferia de Damasco que causou a morte de centenas de pessoas em 2013.
- Motivos 'pouco claros' -
"O que está menos claro são os motivos estratégicos por trás do ataque com armas químicas atribuído ao regime de Assad, pois se abriu caminho a intervenções posteriores que podem reduzir a capacidade militar da Síria", esclarece Reed Foster, analista militar do instituto Jane's.
Para o diretor de pesquisa do Royal United Service Institute (RUSI), o professor Malcolm Chalmers, a estratégia do regime "busca sobretudo desmoralizar a população civil dos territórios que não controla. É uma tática que (o regime) utilizou em muitas ocasiões (...) pois ainda acredita que pode controlar a maioria da Síria".
Outra hipótese pode ser uma operação dirigida pelo aparato militar sírio sem o aval de Bashar Al Assad.
"Acho que foram os linha-duras de Damasco que tomaram a decisão para vingar-se dos russos, que negociam pelas costas da Síria. A questão é saber se o próprio Assad estava a par", apontou o especialista em Síria do Washington Institute, Fabrice Balanche.
"Se os russos e o regime permanecerem tranquilos, não haverá nenhuma escalada após o bombardeio de sexta-feira. O objetivo é castigar os excessos do regime e não ir para o confronto. Putin entendeu o recado. Ele também está furioso com Al Assad mas é obrigado a apoiá-lo", argumenta Balanche.
- Os suspeitos -
Outros suspeitos seriam os iranianos, que "veem com maus olhos que os russos ocupem todo o espaço na Síria", acrescentou o especialista. "Não se deve excluir o Irã, pois esse país não quer ver uma aproximação entre Estados Unidos e Síria", concordou o pesquisador libanês que pediu anonimato, pois trabalha na Síria.
O secretário de Estado americano, Rex Tillerson, declarou durante uma visita à Turquia no final de março que o destino do presidente Al Assad deveria ser decidido pelo "povo sírio". "Cada um escolhe suas batalhas", afirmou por sua vez a embaixadora americana na ONU, Nikki Haley, indicando que a prioridade de Washington já não estava mais concentrada na saída de Bashar Al Assad.
Para Waddah Abded Rabbo, diretor do jornal Al Watan, próximo ao poder de Damasco, "o regime não teria nenhum interesse em provocar um ataque químico, sobretudo depois que Assad teve o que esperava há seis anos: o reconhecimento e a legitimidade por parte dos Estados Unidos".
"Por que ele teria arruinado essa oportunidade lançando um ataque químico em uma área que não tem nenhuma importância estratégica ou militar", acrescentou.
Para ele, são "provavelmente os turcos que executaram essa operação, pois a aproximação entre o governo sírio e Washington parece inaceitável".
"Toda essa operação os coloca de volta em cena e os aproxima novamente dos americanos, com a esperança de que Washington mude de opinião em relação a Al Assad", considerou.