A Venezuela completa, neste domingo (9), 100 dias de protestos que já deixaram 91 mortos contra o presidente Nicolás Maduro, e o cenário é de incertezas. A prisão domiciliar do líder opositor Leopoldo López pode abrir as portas para uma negociação que afrouxe a crise política.
"Cem dias e sigo em rebeldia contra a tirania", dizia o cartaz de um dos mais de 2 mil manifestantes que se concentraram em Caracas, trajando camisetas com o rosto de López.
Símbolo dos opositores encarcerados, López foi para o regime domiciliar neste sábado (8), após três anos e cinco meses na prisão. A oposição não se deu por satisfeita e convocou novas marchas até alcançar "a liberdade plena do país".
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"Estamos completando 100 dias de resistência pela Venezuela, seguimos nas ruas com mais firmeza para o plebiscito", disse o deputado Juan Andrés Mejía, em coletiva de imprensa da Mesa da Unidade Democrática (MUD).
A MUD chamou a população a participar de um plebiscito simbólico em 16 de julho, para mostrar a recusa maciça à Assembleia Constituinte convocada por Maduro, que vê como uma "fraude" do chavismo para proteger "uma ditadura".
No centro da cidade, milhares de seguidores de Maduro, vestidos de vermelho, participaram de um ato de campanha pela Constituinte, cuja eleição acontece no dia 30 de julho.
'Continuaremos lutando'
Em mensagem lida por seu colega Freddy Guevara, López incitou a população a continuar nas ruas e apoiar o plebiscito.
A mudança do regime de Leopoldo é o aceno mais expressivo do governo à oposição desde o início de uma onda de protestos em 1º de abril que já deixou 91 mortos, em meio a uma devastadora crise econômica.
O Supremo Tribunal de Justiça (TSJ), que a oposição acusa de ser aliado ao governo, alegou "problemas de saúde" para colocar López em prisão domiciliar - usando uma tornozeleira eletrônica, segundo sua família.
López, que tem 46 anos, foi detido em fevereiro de 2014 e condenado a quase 14, acusado de incitar a violência em protestos contra Maduro naquele ano, que deixaram 43 mortos.
A oposição vê a saída de López da prisão como um "triunfo inegável" dos protestos. "Continuaremos lutando pela liberdade dos presos políticos", assegurou Lilian Tintori, mulher do opositor.
Segundo a ONG Foro Penal, com as prisões destes 100 dias, os chamados presos políticos somam 430.
'Ninguém oferece a própria cabeça'
Ainda que analistas estimem que está cedo para medir o impacto da decisão, o governo cedeu ao tirar das grades quem ele acusa de "monstro". López aceitou a prisão domiciliar apesar de ter dito que só sairia com liberdade plena e após a libertação de todos os opositores presos.
Sua soltura acontece após três meses de esforços do ex-presidente espanhol José Luis Rodríguez Zapatero, que mediou, no ano passado, uma fracassada negociação entre governo e oposição.
Em comunicado, Rodríguez Zapatero defendeu que esse passo permitirá avançar para a paz e a convivência democrática" e que se intensifiquem os esforços na busca de soluções
A saída de López da prisão foi celebrada por governos da América Latina, Espanha e Estados Unidos. Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), duro crítico de Maduro, vê nisso uma oportunidade de reconciliação e uma "saída democrática".
Maduro, que acusa a oposição de promover a violência em protestos para dar um golpe de Estado, disse esperar que os opositores aceitem dialogar e que López "passe uma mensagem de reparação e de paz" .
"O governo pode estar interessado em reduzir a tensão porque a situação política atual representa riscos, como uma ruptura no setor militar, mas ninguém oferece a própria cabeça voluntariamente", opinou o analista Luis Vicente León.
"Sem dúvida, há uma oportunidade para a negociação, mas uma negociação que não é popular em nenhum dos extremos e que implica em concessões", advertiu León.