Transição

Miguel Díaz-Canel se prepara para substituir Raúl Castro em Cuba

Pela primeira vez em décadas, o presidente não será um membro histórico da revolução de 1959

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Publicado em 18/04/2018 às 19:16
Foto: Alejandro Ernesto / AFP
Pela primeira vez em décadas, o presidente não será um membro histórico da revolução de 1959 - FOTO: Foto: Alejandro Ernesto / AFP
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O número dois do governo em Cuba, Miguel Díaz-Canel, de 57 anos, se prepara para suceder Raúl Castro na presidência de Cuba, uma substituição que abrirá o caminho para uma nova geração na revolução da ilha.

"Cabe-me a honrosa missão, em nome da Comissão de Candidaturas Nacional, de propor-lhes para presidente dos Conselhos de Estado e Ministros da República de Cuba o companheiro Miguel Mario Díaz-Canel Bermúdez", disse nesta quarta-feira (18) a sua presidente, Gisela Duarte, ante a Assembleia Nacional.

Após o anúncio, Díaz-Canel e Raúl Castro se abraçaram. Minutos antes, haviam entrado juntos e ocupado seus assentos como deputados no Palácio das Convenções de Havana. Atrás deles estavam Ramón Machado Ventura e Ramiro Valdés, históricos da revolução e vice-presidentes de Cuba.

A proposta, submetida a voto do plenário na Assembleia Nacional, também inclui como candidato o primeiro vice-presidente o sindicalista afro-cubano Salvador Valdés Mesa, de 72 anos. Na chapa constam, ainda, as propostas únicas para cinco vice-presidentes, um secretário e os outros 23 membros do Conselho de Estado.

O resultado da votação, que será revelado na sessão de 19 de abril, não deixa espaço para dúvidas. A data é simbólica: corresponde ao 57º aniversário da vitória na Baía dos Porcos (Playa Girón), quando foram derrotadas as tropas anticastristas, treinadas e financiadas pelos Estados Unidos em 1961.

Os 31 cargos do Conselho de Estado são nomeados entre os 605 deputados que integram a Assembleia Nacional, eleita por votação popular em março. O novo Parlamento também empossou na quarta-feira e manteve na presidência Esteban Lazo, no cargo desde 2013.

O Conselho de Estado renovará 13 de seus 31 membros. Combatentes históricos como Ramón Machado Ventura (87 anos) e Álvaro López Miera (76) deixam o grupo, mas permanecem Ramiro Valdés (85) e Guillermo García (90).

Nascido depois da revolução

Após o triunfo da revolução em 1959 e da eleição de Fidel Castro como presidente em 1976, Cuba só teve uma transição real, quando em 2006 ele ficou doente e passou o comando para seu irmão mais novo. Fidel morreu no final de 2016 e agora é Raúl, de 86 anos, que cederá seu assento a um representante da nova geração.

Díaz-Canel continuará com as reformas econômicas iniciadas por seu antecessor e levará a política na ilha frente o aprofundamento do embargo dos Estados Unidos e o retorno de Washington a uma linguagem que, para Havana, lembra a Guerra Fria. 

Em 2015, Cuba e Estados Unidos retomaram as relações diplomáticas após meio século de ruptura, e no ano seguinte Barack Obama visitou a ilha. Entretanto, a chegada de Donald Trump deteve essa aproximação.

Díaz-Canel, nascido depois do triunfo da revolução, percorria nos anos 1990 seu bairro em Villa Clara, a leste de Havana, montado em uma bicicleta e em plena escassez de combustível após a queda de sua fornecedora, a desaparecida União Soviética. 

"Díaz-Canel me impressiona um pouquinho por sua semelhança com o ator americano (Richard Gere), por sua estatura, por seus cabelos brancos (ri). Não se pode negar que é um homem interessante", diz Yani Pulido, de 27 anos, garçonete em uma cafeteria de Havana Velha.

"Se o compararmos com Fidel, e é difícil não fazê-lo, fica aquém. Mas dizem que está muito preparado e está há vários anos ocupando cargos de responsabilidade no governo", acrescenta.

Tarefa difícil

Este militante proveniente das pedreiras do Partido Comunista de Cuba (PCC) terá uma difícil missão. Pela primeira vez em décadas, o presidente não será um membro histórico da revolução de 1959, não vestirá o uniforme verde oliva, nem será o líder do governante PCC, único autorizado a existir na ilha.

Mas poderá suprir essas carências com o apoio de Raúl Castro, que continuará na liderança do PCC até 2021. De lá, pode assegurar o apoio da velha guarda, percebida em sua maioria como resistente às mudanças.

"Ele não é nem Fidel nem Raúl, e as pessoas não vão ter com ele a mesma relação (de comando). Tem que se mostrar mais capaz de fazer coisas", considerou o cientista político cubano Arturo López-Levy.

Mas "essa transição não é improvisada, e sim muito bem estudada a partir da experiência que eles admitem como bem-sucedida, de Fidel a Raúl", declarou.

Para agir, deverá ter em conta os alinhamentos aprovados pelo PCC e pelo Parlamento, que traçaram as orientações políticas e econômicas até 2030.

"O governo que estamos escolhendo vai ser devido ao povo, o povo vai participar das decisões", declarou Díaz-Canel depois de votar nas últimas eleições legislativas.

As reformas apontam para reativar uma economia que cresceu 1,6% em 2017, altamente dependente das importações e da ajuda de seu aliado, hoje enfraquecido, Venezuela.

A tarefa mais urgente é a unificação das moedas nacionais que circulam no mercado, além da eliminação das taxas de câmbio preferenciais para empresas estatais - que são a maioria na ilha -, uma situação que gera distorções na economia.

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