Durante três minutos, Iván abraçou sua família, se esqueceu do medo, encurtou as distâncias e venceu o muro entre México e Estados Unidos que o presidente Donald Trump tanto promove.
Na linha de fronteira, sobre um afluente seco no deserto, a família de Iván Castañeda voltou a se encontrar pela primeira vez desde que, há um mês, sofrera o trauma da separação.
Ex-soldado do Exército mexicano, Iván, 40 anos, foi deportado dos Estados Unidos há duas semanas, para onde fugiu da violência do México com sua família.
"Não sei o que poderia dizer aos meus filhos com palavras, meu coração é que sabe. Ser pai é a maior bênção, mas é também triste saber que eu não posso oferecer nada mais que morte e dor", comentou com a AFP.
Um ato de protesto
A de Iván é uma das milhares de famílias de migrantes mexicanos que vivem separadas pela fronteira.
Mas neste fim de semana, 310 delas puderam se abraçar durante três minutos sobre a linha que separa Ciudad Juárez, no México, e El Paso, nos Estados Unidos, graças ao evento "Abraços, Não Muros", organizado pela ONG Rede Fronteiriça pelos Direitos Humanos.
É a quinta edição do evento, que já permitiu que mais de 1.252 famílias separadas se reunissem brevemente. Uma ocasião em que aproveitam para pedir perdão, chorar juntos, rir, conversar ou tirar fotos depois de, em alguns casos, quase 26 anos sem se ver.
"Cada abraço é um ato de protesto", afirma Fernando Garcia, organizador do evento.
Trump chegou à Casa Branca com a promessa de deportar milhões de pessoas sem documentos e levantar um novo muro de fronteira para evitar a chegada de migrantes sem papéis, a quem tem qualificado como criminosos.
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Fugindo do tráfico
Há um mês, Iván abria a porta de sua casa para ir trabalhar na construção civil em Denver quando foi surpreendido e detido por agentes de migração escondidos atrás de sua caminhonete. Desde então, não via sua mulher e seus cinco filhos, que ficaram nos Estados Unidos.
Neste fim de semana, abraçaram-se na terra natal de Iván, Chihuahua, uma zona violenta disputada pelos cartéis de Juárez e Sinaloa, que traficam droga aos Estados Unidos.
Militar durante seis anos, Iván foi recrutado pelo braço armado do cartel de Juárez. Desertou do Exército em 2003, após três tentativas de baixa, cansado da corrupção, das violações e dos assassinatos que cometiam.
"Eu não me neguei, disse que sim. No momento, não pude dizer que não, porque poderia haver represálias. Peguei minha família e cruzei como ilegal" aos Estados Unidos, conta.
Mas eles foram deportados e, como vingança, os criminosos balearam sua mãe em 2012.
Decidiu então pedir asilo aos Estados Unidos, onde trabalhou durante anos para pagar quase 15.000 dólares ao advogado que cuidava de seu caso. Mas este se esqueceu de ir ao tribunal e apelar por sua repatriação, o que fez com que Iván fosse preso e transferido a um centro de detenção por 15 dias.
"Lá faz tanto frio que, na verdade, não se pode dormir. Amarram suas mãos, sua cintura, seus pés, eles te têm como um animal, dormindo no chão. Éramos 200, 300 pessoas em pequenas celas de 600 pessoas. Se vai ao banheiro, temos que dizer às pessoas, porque estão encostadas no vaso sanitário", relembrou.
Agora vive na Ciudad Juárez, trabalhando escondido em uma oficina mecânica enquanto espera a apelação de seu caso.
"Ficar sozinho outra vez não é nada fácil, eu preciso do meu marido e meus filhos precisam do pai", disse entre lágrimas Hilda Melissa Martínez, quando o breve abraço com Iván teve que terminar.