DESAFIO

Derrotado no Nordeste, Bolsonaro terá que investir na infraestrutura da região

Para isso, desafio será finalizar projetos que se arrastam a mais de uma década, como a Ferrovia Transnordestina e a Transposição do Rio São Francisco

Angela Belfort
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Angela Belfort
Publicado em 29/10/2018 às 8:33
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Para isso, desafio será finalizar projetos que se arrastam a mais de uma década, como a Ferrovia Transnordestina e a Transposição do Rio São Francisco - FOTO: Foto: AFP
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O compromisso do presidente da República eleito, Jair Bolsonaro (PSL), com o Nordeste deve estar em duas grandes áreas: melhorar a infraestrutura e capacitar os jovens para a nova era do conhecimento. Dentro do primeiro item está o desafio de finalizar projetos que se arrastam há mais de uma década, como a Ferrovia Transnordestina e a Transposição do Rio São Francisco. “Elas beneficiariam vários Estados do Nordeste. Está na hora do governo federal descartar esse parceiro privado da Transnordestina e fazer uma nova concessão para explorar o empreendimento. Vai fazer bem à economia do Nordeste diminuir a dependência das rodovias”, explica o economista e sócio-diretor da Consultoria Ceplan Jorge Jatobá.

O presidente da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco, Ricardo Essinger, também considera “urgente” a conclusão das duas obras para a região. O empresário também defende a cassação da concessão da empresa à frente da ferrovia, a Transnordestina Logística S.A. (TLSA), subsidiária da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) que faz parte do grupo do empresário Benjamin Steinbruch.

A implantação da ferrovia fomentaria o surgimento de novos polos econômicos, além de alavancar setores existentes, como a avicultura, no Agreste do Estado, e o gesso, no Sertão do Araripe. “A continuidade da Transnordestina traria um impacto estruturante na formação do mercado consumidor da região, ligando o Agreste de Pernambuco ao Cariri do Ceará e da Paraíba – incluindo Campina Grande – ao Porto de Pecém (no Ceará). Isso colocaria a região num outro padrão de desenvolvimento”, cita o secretário de Desenvolvimento Agrário do Ceará, Assis Diniz.

“O Porto que não tiver uma ferrovia ficará estrangulado por não ter como escoar as suas cargas”, conta o secretário de Planejamento e Gestão de Pernambuco, Marcos Baptista. A Transnordestina vai ligar a cidade de Eliseu Martins, no Piauí, aos portos de Pecém e de Suape. 

A transposição e a Transnordestina se encontram em situações distintas. A primeira é composta por dois grandes canais: o Eixo Leste, concluído em março de 2017, e o Eixo Norte, que está com 96% de realização e deve ser entregue até o fim deste ano, segundo o Ministério da Integração Nacional. O próximo problema do projeto é a gestão, ainda não definida pela União.

As obras da ferrovia estão paradas desde 2016. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) instaurou, em julho deste ano, um processo administrativo para apurar os descumprimentos contratuais de implantação da obra. A iniciativa pode levar a empresa a perder a concessão. O prazo de conclusão desse processo vai até março de 2019. Ou seja, a decisão sobre isso caberá a Bolsonaro.

Ainda na área de infraestrutura, seria necessário requalificar a malha rodoviária do Nordeste e decidir quais os trechos estaduais de rodovias federais poderiam ser exploradas sob concessão. Depois das obras de infraestrutura física, os especialistas sugerem outras ações fundamentais para o desenvolvimento regional. “As forças do mercado não são suficientes para diminuir a desigualdade. A renda per capita do Nordeste é cerca de 50% da do Sudeste. É necessária uma ação do Estado com instrumentos que induzam o desenvolvimento”, comenta Jatobá. Esses instrumentos seriam incentivos fiscais e financiamentos interligados à política que alavancasse os setores econômicos instalados na região.

Ciência e tecnologia

O Nordeste é a região que menos recebe investimento em ciência e tecnologia per capita, segundo o documento Fisc Nordeste do Tribunal de Contas da União. Em 2014, a região ficou com R$ 27,4, enquanto no Sudeste chegou a R$ 125,3. Também no Nordeste está a menor média de escolaridade: 9,1 anos, enquanto no País é 10 anos. “A ciência, a tecnologia e a inovação são indispensáveis para reduzir as disparidades regionais. São fatores que podem gerar processos virtuosos. Temos que formar gente nessa área que tenha capacidade de produzir, sistematizar e analisar os dados. E melhorar a infraestrutura de banda larga é essencial nesse novo cenário. Cada vez mais, o conhecimento é fundamental para o desenvolvimento econômico e social”, resume a professora do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco Ana Cristina Fernandes. Para ela, essa formação deve se concentrar nos jovens.

Desenvolvimento do Estado passa pela União

Pernambuco depende de recursos da União para resolver o grande problema da oferta de água no Agreste do Estado. Para isso, é necessária a conclusão da primeira fase da Adutora do Agreste – em construção desde 2013 –, e o recém iniciado Ramal do Agreste cujas obras foram iniciadas em abril deste ano. Para concluir a primeira, serão necessários cerca de R$ 330 milhões. Para o segundo projeto é necessário um investimento superior a R$ 1,1 bilhão, sendo que, até agora, foram empregados R$ 86,1 milhões. Ambos são bancados com recursos da União e vão fazer a água do Eixo Leste da Transposição do Rio São Francisco chegar ao Agreste.

A Adutora do Agreste deveria ter sido concluída em 2015, o que não ocorreu devido à falta de repasses do governo federal à Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), que executa a obra. Tanto o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) como o do presidente Michel Temer (MDB) atrasaram a liberação de recursos para o empreendimento. Neste ano, a primeira verba para a adutora foi anunciada somente no dia 19 de outubro. Não há prazo para a conclusão da obra.

Já o Ramal do Agreste deve ser concluído em abril de 2021, de acordo com o Ministério da Integração Nacional, responsável pela obra. O ramal capta a água no Eixo Leste da transposição, em Sertânia, e levará até Arcoverde, onde começa a primeira etapa da Adutora do Agreste – que vai contemplar 23 cidades. A segunda fase da adutora beneficiará 45 cidades, mas não há prazo definido para o seu início.

Saindo da questão da água e indo para a mobilidade do Grande Recife, o Arco Metropolitano é uma obra considerada “estruturadora” pelo secretário de Planejamento e Gestão de Pernambuco, Marcos Baptista. É uma alça viária entre o Porto de Suape e o Norte, podendo chegar até Paudalho ou Igarassu. Hoje, para fazer esse percurso se enfrenta os congestionamentos da BR-101. O Arco Metropolitano tem um orçamento estimado em R$ 1 bilhão e o governo do Estado deseja que o mesmo seja bancado pela União. Como o projeto não saiu do papel, o Estado planeja construir o miniarco, uma alça de 14,4 km ligando Abreu e Lima a Igarassu com um orçamento estimado em R$ 250 milhões, que deve ser licitado “no próximo governo de Paulo Câmara”, segundo Baptista. A intenção é implantar o miniarco com investimento de uma empresa privada que vai cobrar pedágio dos usuários dessa estrada. 

Mas nem tudo são obras. Considerado o motor do desenvolvimento de Pernambuco, o Porto de Suape está com alguns projetos no mesmo estágio que estava em 2013 por um simples motivo: perdeu a autonomia para licitar empreendimentos dentro da sua área, devido à Lei Federal 12.815 de junho de 2013 que transferiu a realização dessas licitações para órgãos federais. É o caso da futura concessão do Terminal de Contêineres (Tecon 2).

“Em 2018, a licitação para o Tecon 2 retomou a etapa que estava em 2013 com o estudo de viabilidade pronto e a audiência pública realizada. Foi o atraso que a falta de autonomia trouxe a Suape”, diz Marcos Baptista.

E acrescenta: “O que esperamos do próximo presidente é uma visão desenvolvimentista que permita a atração de investimentos privados que ajudem o Estado a se desenvolver. Sem um ambiente econômico, jurídico e institucional equilibrado, não vamos conseguir atrair investimentos privados”.

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