A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Incra reúne-se nesta quarta-feira (10) para votar o relatório final. O documento, de 3.385 páginas pede, entre outros pontos, o indiciamento de 35 indígenas, 15 antropólogos e 16 procuradores da República.
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Prevista inicialmente para terminar em abril de 2016, a comissão foi prorrogada por um ano. As discussões começaram em novembro de 2015. Ao todo, o documento pede o indiciamento de 88 pessoas em cinco estados: Bahia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Também aparecem na lista um ex-presidente da Funai e integrantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e do Centro de Trabalho Indigenista (CTI). A Associação Brasileira de Antropologia (Aba) divulgou nota de repúdio sobre os pedidos de indiciamento de profissionais ligados à defesa dos direitos fundamentais dos povos indígenas e comunidades tradicionais.
O relatório traz, entre as proposições, a “reanálise” da demarcação de terras indígenas e dos procedimentos administrativos em andamento no Ministério da Justiça. Pede ainda a proposição de um projeto de lei para regulamentar o Artigo 231 da Constituição, que trata da demarcação de terras indígenas, e a criação de uma Secretaria Nacional do Índio, que assumiria as atribuições da Funai. Essas duas endereçadas à Presidência da República.
O coordenador da Comissão de Assuntos Indígenas da Aba, antropólogo Hênyo Barretto, considera que o relatório extrapolou as atribuições da CPI ao ser endereçado a outras instituições públicas além da Procuradoria-Geral da República, que teria a função de apurar os eventuais indícios de irregularidades apontados no documento. “É absolutamente não regimental, um desrespeito completo ao Parágrafo 3º do Art. 58 da Constituição Federal. Somente a PGR pode fazer essa apreciação”, contestou.
Relator Nilson Leitão
O relator Nilson Leitão (PSDB-MT) critica em seu texto a atual política de demarcação de terras no país. “Temos absoluta certeza de que o discurso restrito à busca pela terra é proliferado por interesses outros que não a proteção indígena.”
Em outro trecho, o relator critica a atuação de organizações não governamentais (ONGs), antropólogos e do Ministério Público na demarcação das terras indígenas. “Assim o fazem bom base em laudos fraudulentos, em conluio e confusão de interesses com antropólogos e ONGs, muitas vezes, respaldados, juridicamente, por segmentos do Ministério Público Federal e patrocinado por soberanias outras que pretendem a nossa relativizar.”
“[O trabalho tem] uma imparcialidade que pode se considerar de um maior índice possível de alguém que se comportou como magistrado para fazer valer aquilo que fosse a verdade”, disse o presidente da CPI, Alceu Moreira (PMDB-RS) durante a apresentação do relatório no dia 3.
Em entrevista à Agência Brasil, o antropólogo Henyo Barretto afirmou que o objetivo do relatório é tentar criminalizar práticas administrativas rotineiras do trabalho antropológico e procedimentos de reconhecimento de territórios quilombolas e indígenas. “É uma tentativa clara de constrangimento e de cercear o apoio e a eventual participação de profissionais na defesa dos direitos desses povos.”
Barretto critica o fato de antropólogos alvos do pedido de indiciamento não terem sido ouvidos pela comissão.
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) se manifestou em apoio aos membros do Ministério Público Federal citados no relatório final da CPI. Em nota, a ANPR classifica de “sem fundamentos” o parecer do relator que acusa procuradores de prática de condutas ilegais. “O parecer, na realidade, investe contra a atuação institucional do Ministério Público Federal (MPF), que tem lutado em defesa dos direitos dos índios às terras de sua ocupação tradicional”, diz o texto que expressa preocupação em relação ao posicionamento contra antropólogos e instituições que defendem a causa indígena.
“Defender o direito às terras de nossas comunidades indígenas é uma imposição da Constituição e um dever de toda a sociedade brasileira. Desconhecer estes direitos e atacar os que atuam em sua defesa, por outro lado, apenas traz prejuízos à democracia, à lei e à paz”, diz a nota.
PEC 215
A CPI tem como principal alvo denúncias de irregularidades na Fundação Nacional do Índio (Funai) e propõe a criação de um novo órgão para assumir as atribuições da fundação. A CPI foi criada um dia depois da aprovação da PEC 215/2000 em Comissão Especial pela Câmara dos Deputados.
A PEC prevê a transferência de competência exclusiva da Funai para o Congresso Nacional de demarcar terras tradicionais ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas. O texto aguarda a votação no plenário da Câmara.