O Ministério Público Federal (MPF) anunciou nesta terça-feira (5) haver indícios de que o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Carlos Arthur Nuzman, foi o "ponto central de conexão" de um esquema de corrupção internacional para comprar votos para que o Rio fosse escolhido para sediar os Jogos Olímpicos de 2016.
Como parte da investigação "Unfair Play" (Jogo Sujo, em inglês), que começou há nove meses como uma ramificação da megaoperação 'Lava Jato', a Polícia Federal fez operações de busca e apreensão no início da manhã na casa do dirigente, de 75 anos.
Presidente do COB desde 1995 e organizador das primeiras Olimpíadas da América do Sul, Nuzman prestou depoimento na sede da PF, no centro do Rio, vestindo terno, gravata e óculos escuros. Ele não foi detido, mas teve o seu passaporte apreendido, disseram os procuradores.
A operação em sua casa, localizada no Leblon, foi uma das 11 realizadas durante o dia, 10 delas no Brasil e uma na França.
Setenta agentes revistaram a sede do COB e várias empresas no Rio. Em Paris, o Escritório Anticorrupção fez uma operação de busca e apreensão na casa de um intermediário brasileiro, informou uma fonte do Ministério Público Financeiro da França, que investiga desde 2015 suspeitas de corrupção na escolha dos Jogos Rio-2016 e Tóquio-2020.
As investigações brasileiras estimam que o ex-governador do Rio Sérgio Cabral, condenado a mais de 14 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, era o cérebro deste esquema, que supostamente pagou dois milhões de dólares em propinas ao senegalês Papa Massata Diack, filho do ex-presidente da Federação Internacional de Atletismo (IAAF), Lamine Diack.
O empresário Arthur Soares, conhecido como "Rei Arthur", um dos principais contratados do governo de Cabral, teria sido o encarregado de efetuar esse pagamento apenas três dias antes da votação do Comitê Olímpico Internacional (COI) em Copenhague, em outubro de 2009, quando o Rio de Janeiro venceu Chicago, Madri e Tóquio.
As autoridades solicitaram à Interpol a ordem de captura de Soares, que mora em Miami.
Uma antiga associada do empresário, Eliane Pereira Cavalcante, foi detida na operação.
"Todo esse contexto e todos esses elementos reunidos nos levaram à conclusão de que Sérgio Cabral e sua organização criminosa, à qual se integra Arthur Soares, efetivamente compraram o voto para sediar as Olimpíadas no Rio de Janeiro", disse em coletiva a procuradora Fabiana Schneider.
E Nuzman, jogador de vôlei aposentado, "se mostra como elemento central na ligação entre empresários e representantes do COI", assinalou Schneider.
De acordo com o MPF, "Nuzman foi o agente responsável por unir pontas interessadas, fazer os contatos e azeitar as relações para organizar o mecanismo do repasse de propinas de Cabral diretamente a membros africanos do COI, o que foi efetivamente feito por meio de Arthur Soares".
O advogado de Nuzman, Sergio Mazzillo, assegurou que seu cliente não cometeu nenhum crime.
"Não existem fortes indícios de nada, ele (Nuzman) afirma que não atuou de maneira nenhuma irregular, nada foi feito de errado durante a campanha", disse Mazzillo a jornalistas do lado de fora da casa do presidente do COB.
"Corrupção olímpica"
Em Lausanne, na Suíça, um porta-voz do COI parece ter sido pego de surpresa com a notícia.
"O COI teve conhecimento destas circunstâncias pela imprensa e está fazendo todos os esforços para obter toda a informação", disse o porta-voz.
"Está entre os mais altos interesses do COI esclarecer esta questão", acrescentou.
As Olimpíadas do Rio de Janeiro foram associadas a um grande sucesso esportivo e de organização, mas esse legado se viu manchado pela revelação de um grande esquema de corrupção durante os preparativos.
A construção de uma dúzia de estádios para a Copa do Mundo de 2014 e para os Jogos Olímpicos de 2016 estão sob investigação judicial, atingidos pelo escândalo de propinas na Petrobras.
Cabral foi acusado de comandar uma rede que impunha 5% de propinas em todas as obras públicas no Rio, incluindo a de renovação do Maracanã.
Com a dificuldade financeira do Rio, as autoridades "vendiam a ideia de que os Jogos trariam um grande desenvolvimento para cidade e (...) vemos que, na verdade, os Jogos Olímpicos foram usados como um grande trampolim para cometerem atos de corrupção de dimensão olímpica", disse a procuradora Schneider.
A escolha do Rio como sede das Olimpíadas e a do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014 foram conquistas exibidas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, envolvido em várias investigações por corrupção.