Brasil, líder na luta contra o aquecimento global, desistiu de recepcionar a próxima cúpula mundial do clima, COP25, em 2019, ano em que assume o poder Jair Bolsonaro, de extrema direita, que chega com uma equipe crítica das causas ambientais.
"Tendo em vista as atuais restrições fiscais e orçamentárias, que deverão permanecer no futuro próximo, e o processo de transição para a recém-eleita administração, a ser iniciada em 1º de janeiro de 2019, o governo brasileiro viu-se obrigado a retirar sua oferta de sediar a COP25", reunião da ONU sobre a mudança climática, declarou nesta quarta-feira (28) a Chancelaria brasileira em nota.
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"O governo brasileiro conduziu análise minuciosa dos requisitos para ser sede da COP25. A análise enfocou, em particular, as necessidades financeiras associadas à realização do evento", detalhou a nota.
O anúncio foi feito a poucos dias do início da cúpula COP24 em Katowice, na Polônia. A cúpula de 2019 deve ocorrer entre 11 e 22 de novembro.
Chanceler
Bolsonaro terá como chanceler o diplomata Ernesto Araújo, que assegurou que irá cumprir o pedido do presidente de "libertar o Itamaraty" das ideologias, segundo um artigo publicado esta semana no jornal Gazeta do Povo, no qual também fala da existência de um "alarmismo climático".
Nas publicações de seu blog, Araújo, admirador do presidente americano, Donald Trump, também considerou que "ao longo do tempo, a esquerda sequestrou a causa ambiental e a perverteu até chegar ao paroxismo, nos últimos 20 anos, com a ideologia da mudança climática, o climatismo".
Bolsonaro foi alvo de críticas por ter sugerido inicialmente fundir o Ministério da Agricultura com o do Meio Ambiente, embora depois tenha voltado atrás, segundo disse, por sugestão de representantes do agronegócio, para evitar pressões internacionais. Contudo, assegurou que não cederá às pressões das ONGs. Espera-se que nomeie o titular da pasta nos próximos dias.
"É lamentável, mas não surpreendente, que o governo brasileiro volte atrás em sua oferta de ser sede da COP25", reagiu a organização ambientalista Observatório do Clima. "Isso se deve, provavelmente, à oposição do governo eleito, que já declarou guerra ao desenvolvimento sustentável em mais de uma ocasião. Não é a primeira, e nem será a última, notícia ruim de Jair Bolsonaro nessa área".
"Ao ignorar a agenda climática, o governo federal também deixa de proteger a população, afetada por um número crescente de eventos climáticos extremos. Estes, infelizmente, não deixam de acontecer apenas porque alguns duvidam de suas causas", continuou a organização.
O Observatório do Clima também lembrou como a Chancelaria da atual administração do presidente Michel Temer havia realizado, em 5 de outubro, em seu site a candidatura do Brasil como um sinal de "liderança mundial do país em temas de desenvolvimento sustentável, em especial no que se refere à mudança do clima".
Detalhava, também, que seu interesse em ser sede refletia o "consenso da sociedade brasileira sobre a importância e a urgência de ações que contribuam no combate à mudança do clima".
Agora, voltar atrás na decisão, "não é somente uma oportunidade perdida para afirmar que o Brasil é um importante líder em mudança climática. É uma clara demonstração da visão em matéria de políticas ambientais do novo presidente, Jair Bolsonaro, que inclusive disse durante a campanha eleitoral que em seu governo o meio ambiente não é bem-vindo", assinalou Fabiana Alves, porta-voz do Greenpeace no Brasil para Clima e Energia.
Alves acrescentou que, ao não atender a questão climática, o governo brasileiro estaria "virando as costas aos mais pobres, que sentirão primeiro os efeitos de um planeta mais quente e com consequências sérias, como escassez de água e dificuldades na produção de alimentos".