Em um recuo para tentar viabilizar o chamado 13º para os beneficiários do Bolsa Família, o governo do Estado fez uma mudança nas regras do programa, e as famílias inscritas no programa federal precisarão gastar metade do que estava previsto inicialmente para alcançar o teto de R$ 150 de abono anual, contido na proposta do governador Paulo Câmara (PSB). Pelas novas regras, anunciadas nessa quinta-feira (22), os beneficiários do Bolsa Família receberão de crédito 5% do que consumirem na cesta de produtos básicos definida pelo governo. Isso significa que, para receber os R$ 150 ao final de 12 meses, eles terão que gastar R$ 3 mil – o equivalente a uma despesa média mensal de R$ 250.
A regra anterior do programa, intitulado Nota Fiscal Solidária, previa que os beneficiários receberiam de volta 2,5% do que consumissem ao final de 12 meses. Isso exigia de famílias que vivem abaixo da linha da pobreza que gastassem R$ 6 mil por ano, ou R$ 500 mensais. Pernambuco tem 1,1 milhão de unidades familiares no Bolsa Família. O benefício médio no Estado é de R$ 184,13.
As despesas precisam ser feitas em estabelecimentos que emitam nota fiscal, desconsiderando feiras livres e mercadinhos informais. E os beneficiários precisam registrar o CPF no documento ao fazer a compra. “A mudança foi boa. Traz a coisa um pouco mais para a realidade do beneficiário do Bolsa Família. O que faltou foi o governo reconhecer que a oposição estava certa ao questionar se essas pessoas poderiam consumir mais de R$ 500 por mês. Faz uma semana que o governo só rebate o que nós estamos falando sem raciocinar. Outra coisa que essa mudança evidencia é que a proposta veio para o Legislativo sem ser bem estudada ou maturada”, diz a deputada estadual Priscila Krause (DEM).
Líder da oposição na Assembleia, o deputado Silvio Costa Filho (PRB) ressalta a situação das feiras livres. “Desses um milhão de cadastrados no Bolsa Família, boa parte, principalmente no interior, consome em feiras livres. Esse projeto obriga a pedir a nota fiscal. Isso é uma coisa que, dentro do mundo real, a gente pensa que não vai funcionar”, afirma o deputado.
Para custear o programa, o governo aumentou em 2% a alíquota do ICMS de diversos produtos, entre eles refrigerantes, bebidas alcoólicas, copos e sacolas de plásticos, álcool combustível e até bijuterias. A expectativa de arrecadação é de R$ 172 milhões em um ano.
Segundo o líder do governo, Isaltino Nascimento (PSB), a mudança na proposta atendeu à sugestão dos deputados governistas e de aliados políticos para garantir que o máximo de pessoas pudessem receber o benefício. “Essa medida é inédita no Brasil. Consequentemente, é um projeto que vai ser aprimorado ao longo do tempo. Hoje, tanto nos núcleos familiares que têm crianças quanto nos que só têm adultos, o poder aquisitivo é suficiente para atingir os R$ 500. Como estamos lidando com uma questão cultural de as pessoas pedirem a nota fiscal, essa medida garante o acesso a mais pessoas”, afirmou.
Dificuldade
Na terça-feira (20), o JC foi até a Comunidade do Pilar, no Bairro do Recife, e ouviu de mulheres que recebem o Bolsa Família que não seria possível gastar R$ 500 mensais em produtos da cesta básica, como era defendido pelo governo. Entre essas mulheres, estava Flávia Feliciano, de 38 anos, que votou no governador Paulo Câmara por causa da proposta do décimo terceiro do programa. Ela recebe R$ 266 do Bolsa Família e, para sustentar os cinco filhos, vende água mineral no Marco Zero. A garrafa de água é um dos produtos que terão o imposto elevado em 2% para custear o programa Nota Fiscal Solidária.
Após ouvir mulheres como Flávia, a reportagem questionou ao governo, na quarta (21), como foi definido o valor do consumo médio mensal para viabilizar os R$ 150 prometidos na campanha. A Secretaria da Fazenda (Sefaz) respondeu em nota que o programa é fruto de um levantamento que tem como apoio pesquisas de outras instituições. “Os detalhes do estudo não podem ser abertos por força de sigilo fiscal.”
No mesmo dia, o governo anunciou que incluiria novos itens, como gás de cozinha, xampu e sabonete, na lista do que poderá ser comprado pelos beneficiários do Bolsa Família para somar créditos ao programa. Foi o primeiro ajuste para tentar viabilizar a promessa de campanha.
Na ocasião, a Sefaz divulgou uma tabela que estima o consumo médio mensal de uma família de cinco pessoas em R$ 530,91. A planilha, que já incluiu os novos produtos, previa que as pessoas em situação de vulnerabilidade do Bolsa Família consomem todos os meses dois botijões de gás e comem quatro tipos de queijo (mussarela, prato, coalho e de manteiga) e cinco tipos de carne (tilápia, frango, carne bovina, charque e sardinha em lata).