Liberais abstratos. Por Marcio Coimbra

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jamildo

Publicado em 26/05/2021 às 16:14
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Por Marcio Coimbra, em artigo enviado ao blog

O Brasil assiste ao desmonte econômico e sanitário incrédulo com a incapacidade de gestão de um governo que dificilmente conseguirá aprovar qualquer agenda até o final do mandato.

É o fim melancólico de uma oportunidade perdida, de um caminho pela direita responsável, por meio do liberalismo econômico e das reformas que poderiam impulsionar o país para um novo patamar de desenvolvimento.

Fiador de uma política econômica liberal que jamais se concretizou, Paulo Guedes disse esta semana que os liberais são seres abstratos, politicamente inábeis e que somente um "animal político" (sic) como Bolsonaro seria capaz de destravar as resistências diante de uma agenda liberalizante.

Faltou Guedes acertar com os russos, digo, com Bolsonaro, pegando emprestada a inteligente frase de Garrincha na Copa de 1958.

Bolsonaro não é um liberal, tampouco um conservador.

Jamais subscreveu qualquer ideia de Guedes ou concordou com uma linha de Hayek.

Fiel adepto do mais ardoroso nacional desenvolvimentismo imposto pelos militares, segue refém de ideias atrasadas, ultrapassadas e medievais na economia.

O resultado é o que estamos vendo. Um país desajustado, com as finanças desequilibradas enquanto seu governo sugere novas doses de pílulas de ajuda governamental.

"Nós vamos para o ataque. Vai ter Bolsa Família melhorado, BIP [Bônus de Inclusão Produtiva], o BIQ [Bônus de Incentivo à Qualificação], vai ter uma porção de coisa boa para vocês baterem palma", disse Paulo Guedes mirando na reeleição do capitão.

Uma frase que causaria arrepios em Roberto Campos, Milton Friedman ou mesmo no mais jovem liberal discípulo da Escola de Chicago.

A frase marca a conversão de Guedes do liberalismo para o populismo bolsonarista, afinal, o foco é manter o chefe no poder.

Enquanto isso, liberais abstratos vagam pelas ruas do país desolados diante do estelionato eleitoral em que embarcaram em 2018, com receio de que a escolha em 2022 recaia entre o clientelismo lulista e o populismo bolsonarista, ambos de cunho estatista e antiliberais.

Uma escolha impossível de se realizar para quem optou pela razão na economia e hoje recolhe-se incrédulo com receio de ofender o messianismo político que tomou conta do país.

Isto explica que Paulo Guedes talvez esteja certo quando fala que "os liberais sempre foram politicamente inábeis - por isso nunca teve governo liberal no Brasil".

A inabilidade dos liberais deve estar em enxergar o Estado enxuto, o fim da política de compadrio, a meritocracia como elemento fundamental da administração pública, a privatização como caminho virtuoso na economia, a diminuição de impostos como devolução de poder para a sociedade.

Ideias que não rimam com paternalismo, clientelismo, assistencialismo e populismo, vigas estruturais de nossa combalida política brasileira.

Liberais, abstratos ou concretos, não devem deixar de lutar por suas ideias.

Mesmo traídos, usados e rejeitados pelo sistema, são aqueles aos quais todos políticos recorrem quando o barco está afundando.

Quando tudo falhar, é na fonte da razão liberal que os perdulários costumam beber.

Isto não tardará a acontecer, mais uma vez.

Márcio Coimbra é coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal. Presidente da Fundação Liberdade Econômica

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