ditadura nunca mais!

Tanques, voto impresso e o futuro próximo

Professo acredita que o futuro próximo será conturbado e repleto de crises políticas e institucionais.

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Jamildo Melo

Publicado em 11/08/2021 às 13:26 | Atualizado em 11/08/2021 às 13:35
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Por Rodrigo Augusto Prando, em artigo enviado ao blog

O dia 10 de agosto de 2021 ficará marcado na história da política brasileira por dois fatos relacionados: um "desfile" de blindados das Forças Armadas em Brasília e a votação da PEC do voto impresso na Câmara dos Deputados. À noite, os deputados rejeitaram a proposta do Governo Bolsonaro do "voto impresso e auditável" e, ainda, cabe lembrar que o tema já havia tido parecer contrário na Comissão Especial e mesmo assim foi pautada pelo Presidente da Câmara Arthur Lira.

Sabendo que seria derrotado no plenário, o presidente Jair Bolsonaro criou, novamente, uma ação que lhe rendeu atenção quase integral da mídia nacional e internacional. Um exercício militar da Marinha que ocorre há 30 anos, foi, intencionalmente, desviado para que, num desfile de blindados, o convite para participar do evento fosse entregue a Bolsonaro, este ladeado pelo alto comando das Forças Armadas.

Há quem tenha classificado essa atividade militar bem no dia da votação da PEC do voto impresso como uma infeliz coincidência, mas é óbvia a tentativa de Bolsonaro de demonstrar força e, assim, buscar constranger os demais Poderes da República, o Legislativo e o Judiciário. Se, simbolicamente, a ideia era apresentar força, o entendimento, à luz da Ciência Política, foi justamente o contrário. Os tanques e blindados produziram muito mais fumaça e memes do que medo e intimidação. Imagino o quão irritados ficaram os militares que, conscientes de seu papel constitucional e assentados em valores de orgulho de pertencimento às suas Forças, foram submetidos a um dia inteiro de ridicularizações pelo aparelhamento político de uma instituição de Estado pelo atual Governo.

Bolsonaro - alicerçado sobre seu presidencialismo de confrontação - não recua e sempre está no ataque aos adversários (convertidos em inimigos) e das instituições. Sua cruzada pelo voto impresso e auditável e as incontáveis afirmações de que o sistema é inseguro e, portanto, que as eleições passadas foram fraudadas, nada mais é do que uma conjugação de fake news, pós-verdades e teorias da conspiração. Não há, em si, problema em defender uma tese como a do voto impresso numa democracia, o problema consiste em ameaçar esta mesma democracia e as eleições vindouras se sua vontade não for vitoriosa. Bolsonaro vai, paulatinamente, se encaminhando para uma situação de esvaziamento de poder, visto que terceirizou o governo para o Centrão e a situação da pandemia faz com que sua desaprovação coloque em risco seu único projeto concreto: sua reeleição.

Amainado os ânimos do dia 10, o fulcro da questão é: qual o futuro próximo? Quais são os planos do Governo Bolsonaro para aumentar o ritmo da vacinação, pensar na retomada econômica, na proteção social dos milhares de desempregados, dos que estão com fome e nas ruas? Ou, rapidamente, a narrativa bolsonarista tirará da cartola outro tema que, como o voto impresso e auditável, monopolize a pauta nacional e desvie o foco daquilo que realmente importa. Não tardou e o presidente voltou a afirmar que haverá desconfianças dos resultados de 2022, até porque, segundo sua visão, os 229 favoráveis à proposta e os 218 contrários (para ser aprovada a proposta deveria ter tido, no mínimo, 308 votos) mostram que o parlamento desconfia da lisura do processo eleitoral brasileiro.

Bolsonaro não recua. Seu projeto mais palpável é a reeleição. Até o momento não apresenta um resultado consistente em alguma área para firmar com um legado de seu governo. O futuro próximo será conturbado e repleto de crises políticas e institucionais.

Rodrigo Augusto Prando é Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Cientista Social, Mestre e Doutor em Sociologia pela Unesp.

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