O coração de Fernando Menezes
Bom humor para dar e vender era a marca do colega Fernando Menezes!
Por Paulo André Leitão, especial para o Blog de Jamildo, sobre a morte do jornalista Fernando Menezes.
Menezes leva um pedacinho do meu coração, ali onde estão as melhores recordações de minha rica convivência profissional e afetiva com ele. Alegre, doce, solidário, espirituoso, criativo, talentoso, rigorosamente ético: eis o Fernando com que a vida me presenteou.
Dividimos a bancada do telejornal Cotidiano, da TV Tribuna, com Fernando Castilho, Pedro Paulo e Germana Accioly. Era o nosso decano, sempre a me ajudar na tarefa de dirigir a equipe. Quando eu estava brabo, dizia: "Cuide de Mainha, viu?". Referia-se a Germana, ainda estudante e a mais nova dos cinco, como quem adverte: "Só não pode ficar brabo com ela". Eu obedecia, como poderia resistir?
Quase sempre fazia o percurso JC/Tribuna no mesmo táxi com Castilho, que um dia foi confundido pelo motorista com um tal de Dr. Renatinho. Menezes passou a chamá-lo assim, e eu, com receio de chamar Castilho pelo apelido, ao vivo no Cotidiano, me vi obrigado a lhe pedir que deixasse aquilo de lado. Menezes não quis nem saber: "Ele é a cara de Dr. Renatinho, o motorista tá certo". Desisti.
Sempre encontrei nele a firmeza de caráter que considero indispensável ao exercício do jornalismo. Era intransigente com os princípios éticos da nossa profissão, equilibrado na análise política dos fatos, justo ao apontar caminhos para o nosso dia a dia, quando me era exigido refletir e decidir sobre questões relacionadas a colegas da Redação ou aos telejornais da Tribuna, por exemplo. Sereno, apesar de barulhento e expansivo; seguro e nunca arrogante, era generosa bússola para mim.
A vida nos distanciou um pouco e, quando tentei visitá-lo com Aninha Queiroz, amiga comum, Norma, sua esposa, nos recomendou aguardar. Menezes poderia simplesmente não nos reconhecer ou, no extremo oposto, emocionar-se demasiadamente. Prevaleceu a prudência, e nos resignamos porque sabemos o quanto ele gosta da gente.
Aninha privou da amizade dentro da casa dele e Norma. Conversavam até quatro horas da manhã e às 10 Menezes a acordava dizendo: "Você veio aqui pra dormir ou pra conversar?" As conversas pareciam não terminar nunca porque, além de espirituoso, tinha memória prodigiosa. Os livros que escreveu traduzem parte do que guardou.
O coração de Menezes sempre foi bom comigo. Ao saber de sua partida, lembrei-me logo do poema Irene no céu, de Manuel Bandeira:
"Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor.
Imagino Irene entrando no céu:
- Licença, meu branco!
E São Pedro bonachão:
- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença."