FALSO

É falso que eficácia da CoronaVac seja apenas 0,38% superior ao placebo

Diferentemente do que afirma um tuíte verificado pelo Comprova, a eficácia global alcançada nos testes da fase 3 da CoronaVac significa que 50,38% dos vacinados estão totalmente protegidos da covid-19. Os outros 49,62%, apesar de poderem contrair a doença, também desenvolvem anticorpos, o que pode reduzir a incidência de casos moderados e graves

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JC

Publicado em 20/01/2021 às 16:53
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Conteúdo verificado: Post no Twitter que afirma que a CoronaVac é apenas 0,38% superior ao placebo.

É falso que a CoronaVac, vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan, em São Paulo, em parceria com a chinesa Sinovac, tenha eficácia contra a covid-19 apenas 0,38% superior ao placebo. A eficácia da vacina, na verdade, é 50,38% superior à do placebo – mesmo dado da eficácia geral, divulgada no último dia 12 de janeiro pelo Butantan.

A informação de que a vacina seria apenas 0,38% superior ao placebo consta em um tuíte publicado no último dia 14 de janeiro, sugerindo que não há diferença significativa entre a vacina e o placebo, o que não é verdade.

A eficácia da vacina é calculada levando em conta o quanto de efeito ela provoca a mais do que o placebo, que tem eficácia zero na proteção contra o vírus. Ou seja: se a eficácia geral da CoronaVac foi de 50,38%, significa que ela teve 50,38% mais efeito do que o placebo administrado nos participantes dos testes da fase 3.

No caso da CoronaVac, os testes foram feitos em 9.242 participantes, todos profissionais de saúde que trabalham na linha de frente do combate à covid-19. Destes, 4.653 receberam a vacina e outros 4.599 receberam o placebo. No primeiro grupo, o dos vacinados, 85 pessoas adoeceram, enquanto no segundo grupo, o de placebo, o total foi mais que o dobro – 167.

Além da eficácia global, os testes com a CoronaVac alcançaram outros percentuais secundários de eficácia: 78% para casos leves, em que a pessoa precisa de assistência médica, e nenhum dos que receberam as doses da vacina nos testes da fase 3 apresentou casos moderados a graves em que o paciente precisa de hospitalização e, em alguns casos, de internação em leito de UTI. Isso geraria um índice de 100% de eficácia contra casos graves, mas o próprio Instituto Butantan indicou que, como são poucos casos registrados nesse critério, mais observações precisam ser feitas.

Como verificamos?

Primeiramente, entramos em contato com o Instituto Butantan, para que explicasse como a eficácia da vacina é calculada em relação ao placebo.

Em seguida, ouvimos Luiz Gustavo Almeida, doutor em Microbiologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da USP e diretor do Instituto Questão de Ciência (IQC), Rafael Dhalia, doutor em biologia molecular e especialista em desenvolvimento de vacinas de DNA pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e o biomédico e mestre em microbiologia Mateus Falco, integrante da Rede Análise Covid-19.

Por fim, consultamos reportagens que explicam o que é a eficácia de uma vacina e como ela se aplica à CoronaVac. Também procuramos a autora do tuíte, identificada na rede social como Paula Marisa, mas não obtivemos resposta até a publicação desta checagem.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 20 de janeiro de 2021.

Eficácia da vacina é 50,38% superior à do placebo

É equivocada a afirmação, feita no tuíte verificado, de que a CoronaVac é apenas 0,38% mais eficaz do que o placebo. Especialistas ouvidos pelo Comprova explicam que ela é 50,38% superior ao placebo, que tem eficácia zero em proteger contra a covid-19. Por e-mail, o Instituto Butantan, em São Paulo, nos encaminhou o relatório da pesquisa simplificado, apresentado na coletiva de imprensa que divulgou a eficácia da vacina e reafirmou, por telefone, que a eficácia dela é 50,38%, enquanto o placebo tem efeito zero de proteção contra a covid-19.

De acordo com resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o placebo é uma “formulação sem efeito farmacológico, administrada ao participante do ensaio clínico com a finalidade de mascaramento ou de ser comparador”.

Luiz Gustavo Almeida, doutor em Microbiologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da USP e diretor do Instituto Questão de Ciência (IQC), explica que, nos estudos clínicos para medicamentos ou vacinas, é sempre medido qual o efeito a mais que eles provocam em relação ao verificado sobre o grupo placebo.

No caso da CoronaVac, o placebo tinha uma série de substâncias, mas não o vírus inativado usado na vacina. De uma forma simplificada, pode-se dizer que o placebo não tinha justamente aquilo que era necessário para que o sistema imunológico produzisse anticorpos contra o coronavírus.

Ou seja, mesmo que não seja uma substância totalmente inerte, a eficácia do placebo é zero, porque não tem um princípio ativo capaz de proteger as pessoas do vírus. “A vacina CoronaVac tem 50,38% de eficácia em relação ao placebo, ou seja, o placebo tem 0%, portanto a diferença é de 50,38% e não 0,38%, como comentado”, explica Rafael Dhalia, doutor em biologia molecular e especialista em desenvolvimento de vacinas de DNA pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Por que não é possível dizer que a diferença é de 0,38%?

Para que a eficácia da CoronaVac fosse apenas 0,38% superior à do placebo, seria necessário partir do pressuposto de que cada um dos grupos tem uma eficácia de 50% – e que a vacina teria, após os testes, conseguido ‘avançar’ apenas 0,38% em relação ao placebo, alcançando uma eficácia de 50,38%. Seria como dizer que a proteção seria como um jogo de cara ou coroa.

Isso não faz sentido a partir do momento em que se compreende que o placebo não tem qualquer eficácia em proteger as pessoas contra a covid-19. Se ele tem uma eficácia de 0%, a vacina, obviamente, é 50,38% superior a ele.

Especialistas ouvidos pelo Comprova explicam que, durante os testes, é feito um cálculo de risco de se contrair a doença a partir do número de pessoas que adoeceram no grupo vacina e no grupo placebo, de forma proporcional.

A partir desses resultados é que é calculada a eficácia da vacina, que aponta o quanto ela teve mais sucesso em imunizar as pessoas de seu grupo do que o placebo administrado no outro grupo. A única coisa aleatória nesse processo, explica o biomédico e mestre em microbiologia Mateus Falco, integrante da Rede Análise Covid-19, é a escolha sobre quem vai participar do grupo vacina e quem vai para o grupo placebo.

“Não tem como você comparar dois grupos e falar que você jogou uma moeda para cima para selecionar aquele que se infectou ou não. Você pode jogar uma moeda para cima para saber quem vai ficar em cada grupo [placebo ou vacina], mas não para dizer quem se infectou, isso não existe”, afirma.

O que significa o resultado de eficácia da CoronaVac

No último dia 12 de janeiro, o Instituto Butantan informou que a CoronaVac tinha uma eficácia geral de 50,38%. O Instituto Butantan explica que a taxa geral de eficácia de 50,38% se aplica em pacientes que tenham sintomas muito leves e não dependem de suporte médico.

“O estudo verificou que a menor taxa foi registrada em casos de infecções muito leves, considerados score 2 e verificados em pacientes que receberam placebo. De uma amostragem de 9,2 mil participantes, 85 dos casos muito leves foram de pessoas que receberam vacina, e 167 em voluntários que tomaram placebo” apontam o Instituto e o Governo de São Paulo, em comunicado oficial.

A mesma taxa de eficácia vai aumentando de acordo com o agravamento dos sintomas e do quadro clínico: em pacientes leves – que precisam de ajuda e suporte médico -, a taxa de eficácia foi de 78%. Para os casos moderados e graves, que precisaram de internação, a taxa de eficácia foi de 100% – nenhum dos voluntários que recebeu a vacina desenvolveu quadros moderados a graves da doença, enquanto no grupo placebo, sete pessoas tiveram quadros assim. Como mencionado acima, no entanto, este resultado ainda não tem significância estatística e precisa ser confirmado com mais observações.

“É importante reforçar que essa eficácia diz que 50,38% dos vacinados estão totalmente protegidos em relação à contrair SARS-Cov-2, ou seja pegar a covid-19. Os outros 49,62%, apesar de poderem contrair a doença, também desenvolvem anticorpos. Desses, 78% ficaram protegidos de evoluírem para as formas mais severas e nenhum deles, 100%, foram à óbito”, explica Rafael Dhalia.

Nesta reportagem publicada pelo CORREIO, especialistas explicam que há uma série de variantes que influenciam no resultado da eficácia de uma vacina, inclusive o ambiente em que ela foi testada. A CoronaVac mostrou-se uma vacina segura em ambientes de alto risco, já que foi testada apenas em profissionais de saúde na linha de frente de combate à doença.

Além disso, a eficácia da vacina é utilizada para definir uma estratégia de vacinação: quanto maior a eficácia, menor o número de pessoas que precisará ser vacinada para se alcançar uma imunidade coletiva.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus que tenham grande alcance nas redes sociais. O conteúdo que motivou esta verificação teve, até o fechamento desta reportagem, 4,1 mil compartilhamentos no Twitter e 19 mil no Facebook.

O post que sugere que a vacina é apenas 0,38% superior ao placebo teve mais de 5 mil interações no Twitter em uma semana. Conteúdos como esse são prejudiciais porque ajudam a disseminar a falsa informação de que a vacina não é eficaz ou que não faz diferença tomar ou não o imunizante, enquanto especialistas trabalham para mostrar que a vacinação é a saída para a crise que o mundo vive atualmente com a pandemia.

Falso, para o Comprova é, conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Texto produzido pelo Comprova, coalizão de veículos de imprensa para verificar conteúdo viral nas redes sociais. Investigado por: Correio e Favela em Pauta. Verificado por: O Estado de S. Paulo, Rádio Noroeste, Bereia e Jornal do Commercio.

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